Título: Justiça ordena que prefeitos ampliem vagas em creches
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 25/04/2007, Brasil, p. A5

Duas recentes decisões judiciais, uma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e outra do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC), deixaram os prefeitos ainda mais preocupados com o crescimento das despesas obrigatórias dos municípios com ensino, potencializado pela criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).

As prefeituras de Santo André (SP) e de Blumenau (SC) receberam ordem para providenciar creche e pré-escola para crianças menores de cinco anos. Movidas pelo Ministério Público, as duas ações envolvem, juntas, 13 crianças. A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) teme que seja o prenúncio de uma enxurrada de processos idênticos por todo o país.

Se a onda se alastrar, "muitos prefeitos acabarão na cadeia", prevê o presidente da entidade, Paulo Ziulkosky, por causa da falta de recursos e estruturas suficientes para cumprir as determinações judiciais Na faixa etária da creche (até 3 anos), diz ele, estimativas oficiais indicam a existência de 12 milhões de crianças. Atualmente, instituições mantidas pelas prefeituras atendem cerca de um milhão

Segundo Ziulkosky, "já é muito difícil" garantir atendimento para o atual contingente diante das restrições fiscais. Mesmo que só uma parcela dos 11 milhões restantes venha a demandar o mesmo serviço, os municípios não terão como atendê-los sem uma redefinição do volume e da partilha de recursos do Fundeb, diz ele.

As ações contra Santo André e Blumenau não decorrem da criação do Fundeb - que, a partir deste ano, substitui o antigo Fundef, fundo de financiamento da educação de características semelhantes, mas que abrangia apenas o ensino fundamental (1ª a 8ª séries). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ambos dos anos 90, já davam base legal para que o MP cobrasse das prefeituras a oferta obrigatória de creche e ensino pré-escolar, admite Ziulkosky.

A criação do Fundeb, no entanto, reforçou a tese do Ministério Público, porque destina recursos também a essas duas etapas, reconhecendo-as como parte da educação básica e não como assistência social, como muitas prefeituras alegavam. De competência prioritária dos Estados, o ensino médio passou a integrar o Fundef.

O problema é que o dinheiro destinado pelo Fundeb ao atendimento de crianças de até cinco anos está longe de cobrir o custo do serviço, explica Ziulkosky. As prefeituras receberão do fundo bem menos do que precisarão gastar por criança. Assim, as obrigações e despesas com o ensino vão crescer mais do que as respectivas fontes de financiamento. Quanto mais crianças as prefeituras forem obrigadas a atender, maior será o rombo, alerta a CNM.

A confederação encomendou à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, há dois anos, uma pesquisa sobre o custo médio, por criança, das creches municipais e solidárias, que recebem recursos públicos. Hoje esse valor está em torno de R$ 250 por mês, podendo chegar a R$ 400 naquelas com infra-estrutura menos precária.

O repasse do Fundeb para as creches vai variar conforme o Estado. Na melhor das hipóteses, o fundo pagará, por criança, menos de R$ 140 mensais, segundo estimativa fornecida pelo Ministério de Educação à CNM. Em Estados mais pobres, o valor por criança deve ficar abaixo de R$ 70 mensais.

Os municípios contribuem compulsoriamente para a formação do Fundeb, ao qual é vinculada parte de suas receitas. Ou seja, os repasses do fundo são, pelo menos em parte, dinheiro das próprias prefeituras e não arrecadação adicional, esclarece a CNM.

Um dos motivos do baixo valor repassado pelo Fundeb para a manutenção de creches, explica a confederação, é o peso orçamentário atribuído a essa etapa na distribuição dos recursos do fundo. Na regulamentação do Fundeb o governo federal atribuiu a ela peso 0,8, enquanto que o ensino médio ficou com peso 1,2, recebendo, assim, mais recursos por estudante. A CNM pede a mudança desse critério.

A regulamentação deu mais peso ao ensino médio, de competência prioritária dos Estados, porque são os governos estaduais a principal fonte de receita do Fundeb. Enquanto as prefeituras entrarão com R$ 14,5 bilhões, os Estados devem contribuir com R$ 30,5 bilhões para o fundo em 2007. A contribuição do governo federal, por sua vez, será de apenas R$ 2 bilhões, devendo subir para para R$ 4 bilhões por ano até 2009.

Na opinião da CNM, independentemente de quem contribui mais, a partilha do Fundeb deveria considerar as obrigações de cada esfera da federação com o ensino e o seu custo. Com a inclusão de creche e pré-escola, a carga maior de obrigações passou a recair sobre os municípios.