Título: União pode vender créditos para BNDES
Autor: Bitencourt, Rafael; Rittner, Daniel; Simão, Edna
Fonte: Valor Econômico, 25/01/2013, Brasil, p. A3

No fim do ano passado, o governo deixou aberto espaço para bancar a redução da tarifa de energia elétrica por meio das manobras contábeis feitas para alcançar a meta de superávit primário do setor público. Para garantir o corte nos moldes que foram anunciados pela presidente Dilma Rousseff, o Tesouro terá que fazer aporte de R$ 8,4 bilhões na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) neste ano, maior do que os R$ 3,3 bilhões estimados inicialmente.

Na Medida Provisória nº 600, publicada em 28 de dezembro do ano passado, o governo autorizou operações pouco convencionais para garantir o cumprimento da meta de superávit primário. Entre outras medidas, a União ficou "autorizada a ceder onerosamente ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e suas controladas, direitos de crédito detidos pelo Tesouro Nacional contra a Itaipu Binacional ". O pagamento por essa cessão pode ser feito por meio de títulos da dívida federal ou ações de sociedades anônimas, e a União ficou autorizada a destinar todo ou parte desses recursos para a Conta de Desenvolvimento Energético.

Na prática, isso significa que o governo pode antecipar o recebimento do saldo devedor de Itaipu com a União, estimado em cerca de US$ 15 bilhões, por meio do banco de fomento, e destinar esse dinheiro para garantir a redução da tarifa de energia.

Parte desses direitos já foi vendida pela União para o banco. Na virada do ano, o BNDESPar, empresa de participações do BNDES, cedeu uma carteira de ações de aproximadamente R$ 6 bilhões ao Tesouro Nacional em troca do fluxo de recebíveis garantidos pela dívida que Itaipu tem com a União.

Se de fato essa operação for adotada pelo governo para subsidiar a queda da tarifa de energia, o governo vai criar uma receita primária que só seria obtida no futuro para compensar a despesa que terá com programas sociais agora, por exemplo, afirma Mansueto Almeida, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O efeito para o resultado primário será nulo, o que na opinião de Almeida não é ilegal, mas faz parte da "contabilidade criativa" que o governo tem adotado nos últimos anos.

Essa não foi a primeira vez que o governo usou dessa manobra. Em Medida Provisória publicada no dia 30 de dezembro de 2009, o Tesouro transferiu ao BNDES o direito de receber R$ 3,5 bilhões em dividendos devidos pela Eletrobras à União e assim conseguiu avançar no cumprimento de sua meta de superávit primário de 2009.