Título: Recursos da poupança duram até 2015
Autor: Marques, Felipe
Fonte: Valor Econômico, 24/01/2013, Finanças, p. C9

Nem todo atraso é uma notícia ruim. Que o digam os bancos que atuam no crédito imobiliário. O surpreendente fôlego de crescimento da poupança, que teve captação líquida recorde no ano passado, adiou o prazo para o fim dos recursos da caderneta disponíveis para lastrear operações de crédito imobiliário. Previstos para acabar entre 2013 e 2014, os recursos da poupança devem durar até meados de 2015, com alguns analistas prevendo que sigam até 2016.

Enquanto o saldo de recursos da poupança cresceu 18% em 2012, registrando R$ 389 bilhões, o saldo de operações de crédito imobiliário no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), que usam a poupança como lastro, subiu 26,8% no acumulado de 12 meses encerrado em novembro, para R$ 238,9 bilhões, segundo dados do Banco Central (BC). Em 2011, o ritmo de crescimento do estoque da poupança era de 10%.

"Esperamos que os recursos da poupança durem até meados de 2015", afirma Octávio de Lazari Junior, presidente da Associação Brasileira de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), que previa que os recursos acabassem pouco mais de um ano antes. "Em 2011, tivemos uma captação baixa na poupança, que não se repetiu em 2012, apesar da mudança na regra", diz.

Em 2012, a captação líquida da poupança encerrou o ano em R$ 37,3 bilhões, volume recorde e quatro vezes o valor registrado em 2011. Se a poupança supreendeu para cima, o crédito imobiliário desapontou. Os desembolsos de financiamento imobiliário com recursos da poupança avançaram meros 3,6% no ano, somando R$ 82,8 bilhões. Esse crescimento foi de 65% entre 2009 e 2010 e 42% entre 2010 e 2011.

Teotonio Rezende, diretor-executivo de habitação da Caixa Econômica Federal, diz que até 2015 a poupança deve ser suficiente para manter a velocidade de crescimento do crédito imobiliário. Porém, ele destaca que esse tipo de projeção nunca é muito exato. "É uma questão que segue na ordem do dia, mas que não é uma espada no pescoço."

"Pelo cenário de 2010, já haveria escassez neste ano, mas esse não era um desempenho sustentável", diz Bruno Gama, diretor geral da Credipronto, joint-venture entre Itaú Unibanco e a imobiliária Lopes. "Nos próximos dois a três anos, os recursos da poupança serão suficientes. A escassez deixou de ser um problema de curto prazo."

Em uma apresentação no ano passado, o Santander projetou como provável que os recursos da caderneta durassem até maio de 2016. No exercício, o banco assumiu um crescimento anual de 10% no saldo da poupança e de 20% no saldo de operações de crédito imobiliário com lastro na caderneta. Na mesma ocasião, executivos afirmaram que a liberação de parcela da poupança que o BC obriga os bancos a recolher como depósito compulsório (20%) ajudaria a aliviar a pressão de escassez da caderneta.

O atraso na escassez de recursos da poupança é uma boa notícia pelo tempo extra que dá para a consolidação de outros instrumentos de funding para crédito imobiliário, como a Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e o Certificado de Recebível Imobiliário (CRI). "Se houvesse escassez neste ano, os demais instrumentos de captação ainda não estariam prontos para assumir o espaço da poupança", afirma Gama, da Credipronto.

Também dá mais tempo para a criação da Letra de Financiamento Imobiliário (LFI), uma espécie de CDB imobiliário, a versão brasileira do "covered bond". Como conta com dupla garantia, a do banco emissor e dos créditos imobiliários, é visto como um instrumento mais seguro de aplicação. A expectativa da Abecip é que a LFI seja regulamentada até o fim deste ano.

A associação divulgou ontem sua projeção para o crescimento dos desembolsos de crédito imobiliário com recursos da poupança em 2013, de 15% no ano, somando R$ 95,2 bilhões. Para chegar nessa meta, será preciso que os desembolsos de financiamento à construção avancem entre 10% e 12%. Em 2012, essa linha caiu 20%. Já o crédito para aquisição deve ter crescimento semelhante ao do ano passado, avançando cerca de 20%.

"A vantagem do "covered bond" é que permite prazos maiores, entre cinco e oito anos", afirma Rezende, da Caixa. "O lado ruim da folga dos recursos da poupança é que não se dá a celeridade necessária para criação desse instrumento."