Título: Banco vai assessorar Varig em novo plano
Autor: Vanessa Adachi e Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 10/01/2005, Empresas & Tecnologia, p. B3

Uma solução conduzida pela própria Varig, com a participação de assessores financeiros e consultores, começa a ganhar força dentro do governo depois que não prosperaram planos como a liquidação extrajudicial e a estatização temporária. A consultoria Trevisan já vinha desenvolvendo estudos, primeiro a pedido do Ministério da Fazenda e, mais recentemente, para a própria companhia aérea. Agora, entrará em cena um banco, que está em vias de ser contratado para conduzir, entre outras coisas, a renegociação com credores. Segundo o Valor apurou, esse papel deve ser desempenhado pelo Unibanco. Na quinta-feira, o vice-presidente de atacado do Unibanco, João Dionísio, participou do encontro em Brasília que reuniu o presidente da Varig, Carlos Luiz Martins, o ministro da Defesa e vice-presidente, José Alencar e a Trevisan. Procurado, o Unibanco não se manifestou. Itaú e Bradesco também teriam sido alternativas estudadas, segundo fontes de Brasília. O Bradesco disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que desconhece o assunto. O Itaú não fez comentários. A presença de um banco, na leitura de fontes do setor e do governo, ajudará a dar mais credibilidade ao processo, que vem de intenso desgaste, após tantos planos fracassados nos últimos três anos. A participação do Unibanco na busca de solução para a Varig não é inédita. Até 2002, o banco era um dos seus principais credores e, por isso, assumiu a função de líder de um comitê informal de credores. Arnim Lore estava na presidência da companhia. O executivo saiu em novembro daquele ano quando seu plano de recuperação encontrou oposição da Fundação Rubem Berta, controladora da Varig. Apesar do fracasso do acordo com o comitê de bancos, o Unibanco conseguiu receber seus créditos à frente de outros credores, o que os deixou descontentes e desagradou setores da companhia. Reestruturação de dívida com credores, transformação de créditos em ações, fusão com a TAM, liquidação extrajudicial, estatização, sem mencionar as propostas mais descabidas. De tudo já se tentou nos últimos três anos para fechar o rombo da Varig, mas sempre as saídas esbarraram em obstáculos que se provaram intransponíveis. Com tal histórico, não é exagero supor que o plano da vez tem boas chances de não vingar. "Os astros nunca se alinham, cada área do governo quer uma coisa e não há articulação. Quando há, é a Fundação Rubem Berta que dificulta", diz um alto executivo do setor. "Hoje, o governo não tem um norte na questão Varig", diz um outro executivo. De tudo que se pensou, a saída que esteve mais próxima de ser implementada nos últimos tempos foi a liquidação extrajudicial, que separaria a parte boa da ruim da companhia, entregando ao setor privado a primeira. Defesa e Casa Civil defendiam a solução e a Fazenda não se opunha porque não previa a injeção de dinheiro público. Mas, segundo fontes do governo e do setor, ela foi aposentada. Por duas ocasiões a liquidação quase ocorreu. Na primeira vez, chegou a haver uma data: entre 10 e 12 de novembro. Não aconteceu por causa da substituição de José Viegas por Alencar na Defesa. A segunda vez foi na semana de 12 a 18 de dezembro. Alencar chamou os presidentes da TAM, Marco Antonio Bologna, e da Gol, Constantino de Oliveira Jr. para uma reunião. Questionou se as companhias assumiriam a parte boa da Varig e ouviu uma negativa. Daí por diante, a liquidação não era mais viável. O presidente da Infraero, Carlos Wilson, não foi avisado e declarou que a intervenção ocorreria até o fim daquela semana. Embora tenham interesse em ficar com as rotas da Varig e acelerar seu crescimento, TAM e Gol não quiseram assumir um risco que não podiam calcular. "O governo não apresentou às duas empresas uma proposta acabada, foi sempre algo genérico", afirma uma fonte. Uma equação para a crise financeira da Varig não é tarefa trivial. Seu patrimônio líquido está negativo em quase R$ 7 bilhões. Metade da sua dívida é com o governo. Cerca de R$ 3 bilhões da dívida com a União, em impostos e INSS, foram repactuados em 2003 para ser pagos em 15 anos. Fora isso, BR Distribuidora, Banco do Brasil e Infraero têm créditos a receber. A companhia tem R$ 2,3 bilhões em dívidas de leasing de aeronaves. Só nesse ano vencem R$ 650 milhões do total. Igual quantia vence em 2006. Boeing e a General Electric são os principais credores. O presidente mundial da GE, Jeff Immelt, estará hoje em Brasília e marcou um encontro com Alencar para tratar do caso Varig. Muitos acreditam que a solução passa por um encontro de contas com o governo, que promoveria uma primeira limpa no balanço da Varig e abriria possibilidade para renegociação de outras dívidas. A Varig ganhou no Superior Tribunal de Justiça o direito a uma indenização de R$ 2,2 bilhões contra a União. O mérito foi julgado, mas cabem recursos que protelariam o pagamento. O governo não quer fazer o encontro de contas com a Fundação no controle e a Advocacia Geral da União resiste à idéia de abrir mão de recorrer. Mesmo que toda a dívida, com o setor público e o privado, seja equacionada, ainda seria necessária uma capitalização. Nos últimos meses, os problemas têm sido amenizados pelos efeitos da alta temporada. Mas a expectativa no governo e no setor é que a situação se agrave em fevereiro. Em dezembro, a empresa pagou R$ 19 milhões dos R$ 150 milhões que deve à Infraero, na tentativa, frustrada, de evitar a abertura de um processo judicial. Para tanto, a Varig precisou depositar apenas R$ 1 mil do 13º salário dos seus funcionários e parcelou o restante até o dia 20. "Solução para a Varig até existe, mas não sem traumas. A questão é quem vai sofrer: o governo, os funcionários ou os credores", diz um executivo do setor.