Título: Uma pitada global
Autor: Ribeiro, Alex e Pavini, Angelo
Fonte: Valor Econômico, 13/04/2007, EU & Investimentos, p. D1

Os bancos já estão se preparando para criar fundos com aplicação no exterior, seguindo a nova regulamentação do setor divulgada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) na Instrução 450, de 30 de março. A expectativa ainda é com relação à regulamentação da parte cambial do processo que, esperam executivos do mercado, deve sair em breve. Segundo fontes do Banco Central (BC), será necessário uma resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) para permitir expressamente que fundos de investimento apliquem lá fora 10% de sua carteira ou, no caso dos multimercados, até 20%.

A área técnica do BC está trabalhando em uma proposta que será submetido ao CMN, mas não há uma previsão de quanto tempo isso pode demorar. E, depois, essa proposta terá de ser aprovado pela diretoria do BC, que o submeterá ao CMN. O conselho se reúne no próximo dia 25, mas não há garantia de que a proposta estará pronta já para esta reunião. A boa notícia é que, na avaliação preliminar do BC, bastaria a resolução do CMN para liberar as operações, sem necessidade de uma circular do Banco Central.

Enquanto isso, Banco do Brasil, HSBC, ABN Amro e BBM azeitam suas estruturas para começar a oferecer logo as novas carteiras. Um dos mais adiantados no processo é o HSBC. O banco já vinha analisando a aplicação no exterior antes mesmo da divulgação da nova instrução por conta da expectativa de que a proposta, que estava em audiência pública, fosse aprovada. A instituição pretende usar sua forte presença internacional para criar carteiras com 10% a 20% no exterior.

"Batemos o martelo sobre o que vamos fazer: lançar três fundos multimercados com até 20% lá fora, cada um com características diferentes", diz Pedro Bastos, diretor-geral do HSBC Investments. Segundo ele, como as taxas de juros no Brasil continuam as mais altas do mundo, o "tempero" para os fundos será dado por aplicações em renda variável lá fora. "Saindo a regulamentação, podemos lançar os fundos em uma semana", acredita Bastos. A carteira deverá estar acessível a clientes do varejo de alta renda (Premiê) e do private do HSBC, com aplicações iniciais entre R$ 10 mil e R$ 20 mil, dependendo do fundo. "Mas vão ser carteiras muito semelhantes às que já temos em nossas prateleiras e, apesar da aplicação lá fora, o cliente vai entender o conceito", diz.

Uma das vantagens do HSBC é que a aplicação no exterior será feita em fundos da própria instituição. "Vamos oferecer ao cliente daqui os mesmos fundos que o cliente na Europa ou nos Estados Unidos está comprando, não haverá dúvidas sobre a experiência do gestor", diz Bastos. O HSBC tem desde fundos voltados para mercados emergentes, regionais até em mercados desenvolvidos. "E essas carteiras que lançaremos devem ser as primeiras de uma série".

O ABN Amro Real é outro que está se movimentando para ter fundos que aplicam parte dos recursos no exterior. Segundo Luciane Ribeiro, diretora executiva da ABN Amro Asset Management, como banco global, o ABN já tem a estrutura pronta para a negociação dos papéis lá fora. "O banco já está debruçado sobre o assunto", diz. "Temos fundos offshore com estratégias bem definidas e isso ajuda na hora de oferecer as carteiras por aqui", avalia.

Uma das estratégias dos bancos brasileiros será usar a estrutura de fundos offshore para a parcela internacional dos fundos locais, explica o ex-BC e sócio da Mauá Investimentos Luiz Fernando Figueiredo. "Muitos gestores independentes têm forte presença lá fora, como a Hedging-Griffo, a Gávea e a JGP, e isso facilitará essas aplicações internacionais", diz. Figueiredo lembra que hoje as operações de câmbio para aplicação no exterior já estão regulamentadas para pessoas físicas e empresas, mas para fundos ainda são restritas aos antigos Fiex, que praticamente só compram papéis do governo. "Seria o caso de estender o registro das operações de câmbio do Fiex para os demais fundos", diz. Segundo ele, a Mauá já tem fundos offshore aplicando em papéis brasileiros e da América Latina e vai aguardar a regulamentação para estudar carteiras com aplicações no exterior usando essa experiência. "É um processo muito bom, estamos internacionalizando a indústria de fundos brasileira", diz.

Outro ex-BC que está animado com a aplicação no exterior é Beny Parnes, do Banco BBM. A proposta seria aplicar no exterior primeiro em ações e juros. "Câmbio e moedas seriam para uma fase mais adiante", afirma Parnes.

No Banco do Brasil, a proposta é usar a experiência obtida com a gestão de fundos offshore dos últimos cinco anos, afirma Alberto Monteiro de Queiroz, presidente da BB DTVM. Apesar de se preparar, Queiroz acredita que a aplicação no exterior ainda pode demorar um pouco para se tornar atrativa. "O retorno no Brasil ainda é alto, mas com a tendência de queda dos juros locais, a aplicação lá fora começará a ficar interessante."

No Unibanco, a expectativa é de que os fundos que aplicarão no exterior serão limitados aos clientes do private bank e, talvez, para o varejo de alta renda Uniclass, explica Ronaldo Patah, superintendente de renda variável da Unibanco Asset Management (UAM). "Mas estamos muito no começo dos estudos", diz.

Um passo mais adiante será a constituição de fundos com 100% de aplicações no exterior. Essas carteiras estarão disponíveis, porém, apenas para os clientes apelidados de "superqualificados", que tenham mais de R$ 1 milhão para aplicar em um fundo. A regulamentação foi colocada em audiência pública pela CVM no mesmo dia da divulgação da 450, e depende também de mudanças cambiais e na legislação que regula a compra de papéis brasileiros no exterior, considerada uma nacionalização de dívida externa.

(Colaborou Luciana Monteiro)