Título: O campo minado de Cardozo
Autor: Kleber, Leandro
Fonte: Correio Braziliense, 12/12/2010, Politica, p. 3

Administrar um sistema prisional inflado, indicar os cargos estratégicos da PF e monitorar com eficiência as fronteiras serão os primeiros desafios do ministro da Justiça

Presídio de segurança máxima de Catanduvas, no Paraná: um dos quatro com esse perfil no Brasil Assim que assumir o Ministério da Justiça em 1º de janeiro, José Eduardo Cardozo (PT-SP), indicado pela presidente eleita, Dilma Rousseff, terá um grande desafio pela frente: administrar o sistema prisional brasileiro, que hoje apresenta um deficit de 190 mil vagas e sofre com recursos contingenciados; lidar com pressões por aumento salarial entre os profissionais de segurança pública, e indicar pessoas para cargos estratégicos em órgãos como a Polícia Federal (PF). Cardozo terá em mãos um orçamento de R$ 11 bilhões, o maior já registrado na pasta nos últimos nove anos.

A composição do ministério deverá ser feita com a presidente eleita, principalmente a nomeação do diretor-geral da PF, órgão considerado estratégico. Hoje, três nomes são especulados. O do diretor de Combate ao Crime Organizado da PF, Roberto Troncon; o do superintendente da instituição no Rio Grande do Sul, Ildo Gasparetto; e o do ex-superintendente de São Paulo Geraldo José Araújo, atual secretário de Segurança Pública do Pará.

O secretário nacional de Justiça, cargo que deu dor de cabeça ao governo no primeiro semestre de 2010, assim que sugiram denúncias de que Romeu Tuma Júnior, então ocupante da cadeira, era ligado ao mafioso chinês Paulo Li, também deverá ser indicado por Cardozo.

Na semana passada, ele se encontrou com o ex-ministro e futuro governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro no Centro Cultural Banco do Brasil, sede do governo de transição. A visita serviu para Cardozo ouvir dicas e sugestões, já que durante a gestão de Genro foi criado o Programa

Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), elogiado por especialistas. Com seus recursos, estimados em R$ 2,1 bilhões para 2011, o governo federal promete construir, nos próximos quatro anos, 2.883 postos de polícia comunitária, com serviços de monitoramento e ronda, e criar Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em 44 municípios.

Controle Entre os planos de Dilma e de sua equipe de transição ¿ da qual Cardozo é um dos coordenadores ¿ para o setor ainda estão dar continuidade à reforma do sistema penitenciário, com a construção da 5ª penitenciária federal, em Brasília, e o investimento em estabelecimentos penais estaduais. Além disso, o novo governo pretende criar o programa de proteção das fronteiras, com bases da PF nos 11 estados limítrofes com outros países. A ideia é ter duas aeronaves não tripuladas guiadas por controle remoto em seis bases.

Na avaliação do companheiro de partido Domingos Dutra (MA), um dos principais desafios de Cardozo será na área de segurança pública. ¿É claro que o sistema prisional tem peso. Hoje, além do orçamento reduzido, o pouco que se tem não é plenamente utilizado por causa do contingenciamento, da falta de projetos apresentados pelos estados ou até mesmo por projetos mal elaborados¿, afirma. ¿Se o Estado cumprisse a Constituição, fazendo valer o direito de o preso trabalhar e estudar, a sociedade ganharia muito. A cada três dias trabalhando e estudando, o presidiário ganha um dia a menos de detenção. Isso diminuiria os custos aos cofres públicos e daria maior chance de os detentos não voltarem a cometer crimes¿, avalia.

FUNPEN CONGELADO

Criado em 1994 para financiar e apoiar as atividades de modernização e aprimoramento do sistema penitenciário brasileiro, o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) é a principal política do governo federal no setor. Apesar de sua importância, parte do orçamento costuma ficar ¿congelado¿ na chamada reserva de contingência, fundo usado pelo governo para ajudar a cumprir as metas de superavit primário.

Em 2011, primeiro ano de Cardozo no ministério, serão destinados R$ 269 milhões ao Funpen. Porém, R$ 144 milhões (54% do total) estarão ¿congelados¿. O mesmo bloqueio ocorreu nos últimos anos. ¿Trabalhamos para descontingenciar o saldo do Funpen. Cerca de R$ 178 milhões do total serão usados na geração de novas vagas. A medida de suplementação está no Congresso esperando aprovação¿, diz o diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Airton Michels.

Para ele, o governo tem enfrentado a questão prisional com seriedade, mas há um caminho a percorrer. ¿Enquanto a população brasileira cresceu cerca de 20%, a carcerária subiu quase 300%. Em 1995, eram 140 mil presos. Neste ano, vamos encerrar com 500 mil¿, diz.

Michels afirma que o Brasil foi o país que mais prendeu no mundo, em termos proporcionais ao tamanho da população, nos últimos 10 anos.

Ascensão eleitoral O futuro ministro ganhou a confiança de Dilma Rousseff durante a campanha presidencial. Ele desistiu de se candidatar à reeleição à Câmara para se dedicar à campanha da petista. Como participou das negociações para formar a aliança de apoio à petista, tornou-se um dos coordenadores da equipe de transição da presidente eleita.