Título: Lula espera entendimento entre ministros
Autor: Costa, Raymundo e Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 27/04/2007, Brasil, p. A8

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalia que os discursos dos ministros Silas Rondeau (Minas e Energia) e Marina Silva (Meio Ambiente) estão radicalizados, com enfoques exagerados, mas aposta que os dois podem convergir a curto prazo. Para Lula, o impasse criado em torno do licenciamento ambiental do complexo hidrelétrico do rio Madeira reflete bem a mudança de cultura que ele gostaria de ver em órgãos como o Ibama - sair do "não pode fazer" para o "como pode ser feito".

A coincidência entre a reestruturação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e o impasse com o Ministério das Minas e Energia amplificou a crise. As mudanças no Ibama já eram previstas e o presidente, mesmo com a radicalização do discurso dos dois ministros, em nenhum momento mencionou a possibilidade de afastar Marina. Limitava-se a dizer que resolveria o problema, sempre que era questionado sobre o impasse no setor.

Na visão do Palácio do Planalto a questão ambiental tem que responder ao desenvolvimento. O presidente não se contenta com pareceres como o do Ibama em relação ao complexo hidrelétrico do rio Madeira, que nem sequer especula sobre como resolver a questão do impacto ambiental da obra ou acena com prazos para um parecer conclusivo, definitivo.

Na realidade, tanto o parecer do Ibama quanto o de Sultan Ali, a maior autoridade em sedimentologia, contratado pelo Ministério das Minas e Energia, não são conclusivos em relação ao impacto sobre o meio ambiente das obras do complexo. Ali considera que a tecnologia a ser empregada produzirá um impacto menor em relação à sedimentação (o lago será menor), mas não é definitivo em relação ao impacto sobre espécies como os grandes bagres. Nem o Ibama.

O problema é que o Ibama se refugiou numa expectativa vaga, de esperar a "estação úmida", o que pode significar seis meses ou um ano. E o governo tem pressa numa definição, até para que possa pensar em alternativas: os investimentos previstos são de longo prazo, o que requer decisões rápidas. Rondeau fez um discurso acima do tom, ao dizer que só espera até maio, na avaliação do Palácio Planalto. Marina sentiu-se desautorizada e teria reagido também com enfoque exagerado.

A relação tensa entre Lula e Marina, está longe de acabar por não se tratar de uma divergência política. É uma questão de fundo, conceitual. Lula incomoda-se com Marina porque pretende acelerar o desenvolvimento econômico e vê nas burocracias ambientais um empecilho para que isso aconteça com maior rapidez. Mas entende o drama de sua ministra, que abraça-se aos próprios princípios e história política para agir da maneira como age.

Lula também não quer o desenvolvimento a qualquer preço, quer preservar o meio ambiente. Por isso, na visão de pessoas próximas ao presidente Lula, a questão é de difícil resolução. Desde o final do ano passado, quando Lula começou a avisar que pretendia "destravar o país", Marina começou a confrontar-se com a chefe da Casa Civil, ministra Dilma Rousseff. Dilma, hoje, é a grande condutora administrativa do governo e a responsável principal pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Os embates das duas em torno da morosidade na concessão de licenças ambientais irritou o presidente a tal ponto que muitos davam como certa a saída de Marina do governo.

O ano virou e a ministra acabou permanecendo. Lula preferiu não comprar uma briga com ambientalistas e sabe que Marina é um ícone nacional e internacional. Tirá-la do governo para colocar qualquer outro nome em seu lugar passaria uma imagem ruim para os investidores - uma imagem de um país que não tinha compromisso com o meio ambiente. Isso antes da divulgação do relatório da ONU sobre as mudanças climáticas. Agora, o cenário complica-se ainda mais.

Do outro lado da linha de batalha, encontram-se Dilma e o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau. Rondeau colocou mais uma vez a faca no pescoço dos ambientalistas ao dar um prazo até maio para que se resolva o impasse em relação às usinas do Rio Madeira, Jirau e Santo Antonio. O MME e o consórcio Furnas-Odebrecht garantem que não existe risco ao meio ambiente, mas o Ibama vem retardando a concessão da licença ambiental.

Lula defende os empreendimentos no Madeira e muitos dentro do governo vêem o projeto como a melhor alternativa ambiental. "O governo sabe que a alternativa ao Rio Madeira é Angra III. Ou queimar carvão, poluindo o meio ambiente", admitiu um assessor palaciano. Segundo ele, é visível o desconforto de Marina com o impasse. "A gente percebe, nos olhos dela, o esforço entre não se transformar em uma trava para o desenvolvimento do país e a necessidade de permanecer fiel aos seus princípios", confirmou um petista próximo do presidente.