Título: Os ingredientes da pizza
Autor: Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 12/12/2010, Politica, p. 6

Com o Conselho de Ética implodido e o cargo de corregedor vago, são praticamente nulas as chances de Gim ser investigado pelos pares

Ivan Iunes

Ainda que algum partido apresente pedido de investigação formal contra o senador Gim Argello (PTB-DF) por destinar recursos do orçamento a entidades de fachada, o caso dificilmente será analisado pelo Senado, por um motivo: não há, atualmente, quem possa apurar as denúncias. O Conselho de Ética, responsável pelos desvios de conduta de parlamentares, está praticamente dissolvido desde agosto de 2009. Já o cargo de corregedor da Casa permanece vago desde a morte do senador Romeu Tuma (PTB-SP).

Acusado de enviar emendas individuais do Orçamento de 2010 no valor de R$ 1,4 milhão para três entidades fantasmas, Gim foi alvo de diversos pedidos informais de investigação pelo Senado. Embora mais de um senador tenha pedido apuração do caso, nenhum parlamentar ou partido apresentou até o momento um pedido formal de abertura de inquérito. Pior: mesmo se o fizesse, não haveria instância direta para apurar as denúncias.

Todos os órgãos responsáveis por analisar a conduta de parlamentares estão sem titular definido e esvaziados. ¿Caberia ao presidente nomear um novo corregedor, mas a uma semana do recesso isso é improvável. Agora, o caso ganhou tal dimensão que as investigações vão além do Legislativo. Existem indícios de que o esquema é maior. Há envolvimento de outros parlamentares, não apenas na questão do Turismo, mas com ONGs e o Ministério do Esporte¿, diz o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).

Responsável por analisar e decidir a abertura de processos contra senadores, o Conselho de Ética está inoperante desde agosto de 2008. Em protesto pela absolvição do presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), pelo colegiado, DEM e PSDB decidiram se retirar. Na prática, isso significou a dissolução do conselho, já que ele não conta com número mínimo de integrantes para tomada de decisões. Pior, mesmo se tivesse quorum, o colegiado enfrentaria uma situação inusitada para investigar o senador pelo Distrito Federal, pois está sem presidente definido e o vice é exatamente Gim Argello.

Corregedoria Se o conselho não tem condições de investigar Gim, a Corregedoria está acéfala. O posto está vago desde a morte do senador Romeu Tuma, no mês passado. Para apurar as denúncias, um partido ou político precisaria apresentar formalmente um pedido de abertura de processo ou requerimento pedindo explicações. Em situações normais, o documento seria encaminhado pelo presidente até o Conselho de Ética, que designaria um relator para o caso. Só que com a proximidade do recesso legislativo, a questão só seria abordada no ano que vem.

Seria, não fosse outro fato importante que tomará o Senado a partir de fevereiro: a eleição da Mesa Diretora. ¿Estamos numa situação complicada. O conselho não tem presidente, o corregedor faleceu. E complica mais ainda por conta do processo de nova composição da Mesa, o que traz interesses. Cada parlamentar é um voto. Fica muito complicado tomar atitude contra qualquer senador nesse período¿, admite o senador Cristovam Buarque (PDT-DF).

Arquivamento em massa O Conselho de Ética arquivou 11 processos contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), em agosto de 2009, em uma sessão conturbada. A decisão provocou a retirada do colegiado de partidos da oposição, como DEM e PSDB. Resultou, ainda, numa cisão no PT. O líder do partido na Casa, Aloizio Mercadante (PT-SP), chegou a anunciar a renúncia do posto por conta do episódio. Outro parlamentar, Flávio Arns (PT-PR), se retirou do partido e assinou com o PSDB em protesto pela absolvição de Sarney.

ENTENDA O CASO Suspeitas em série

O senador Gim Argello pode ter investigação aberta no Senado Federal por conta de denúncias de que teria apresentado emendas no valor de R$ 1,4 milhão para ONGs fantasmas ¿ no total, as entidades receberam R$ 3 milhões em repasses. Os recursos foram destinados dos orçamentos da União de 2009 e 2010, segundo reportagem do jornal O Estado de S.Paulo. Além do Orçamento federal, Gim também utilizou a verba indenizatória, que serviria para custear despesas do mandato, para contratar entidades de fachadas, conforme denúncia do Correio feita na semana passada.

As irregularidades custaram a Gim o cargo de relator do Orçamento de 2011, que acabou ficando com Serys Shlessarenko (PT-MT) depois de passagem relâmpago pelas mãos de Ideli Salvati (PT-SC). Além disso, o senador também foi retirado pelo partidos das negociações com o comando da transição de governo. O PTB reivindica um ministério e cargos no segundo escalão.

Agora, essas articulações têm sido tocadas pelo deputado federal Jovair Arantes (PTB-GO). No dia em que renunciou à relatoria do Orçamento, Gim teve uma investigação aberta pelo Supremo Tribunal Federal em processo de autoria do Ministério Público por crimes previstos na lei de licitações. (II)