Título: Reforma do Judiciário e a fusão dos tribunais de SP
Autor: Fabiana Regina Sivier
Fonte: Valor Econômico, 10/01/2005, Legislação & Tributos, p. E2

A Emenda Constitucional nº 45, que versa sobre a primeira fase da reforma do Judiciário, determina em seu artigo 4º a extinção dos tribunais de alçada, passando seus membros a integrar os quadros dos respectivos tribunais de Justiça. O parágrafo único do mesmo artigo outorga o prazo de 180 dias para que os tribunais de Justiça cumpram a determinação, dispondo sobre a competência dos novos integrantes e remetendo projeto de lei ao Poder Legislativo sobre a alteração da organização e divisão judiciária. Apesar do prazo, o órgão especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) apressou-se em editar já no dia seguinte à promulgação da emenda constitucional a Resolução nº 194/2004, através da qual, dentre outras disposições, determinou-se a absorção dos 206 juízes integrantes dos três tribunais de alçada existentes no Estado (Primeiro e Segundo Tribunal de Alçada Civil e Tribunal de Alçada Criminal) no cargo de desembargadores, acrescendo o quadro do TJSP, de 132 desembargadores; a criação de novas câmaras de direito público (são agora 17) e de Direito Privado (são agora 36), bem como de direito criminal (são agora 14) para a acomodação dos novos integrantes e das competências antes delegadas aos tribunais de alçada; a decisão de que apenas após a realização de concurso interno para promoção ou remoção dos atuais desembargadores, deixando vagos cargos anteriores em determinadas câmaras, é que poderão os novos integrantes (ex-juízes dos alçadas) escolherem em que câmaras irão atuar, de acordo com o critério de antigüidade; e a decisão de que os desembargadores que integrarão o órgão especial do tribunal (os 25 mais antigos) não integrarão nenhuma das câmaras, atuando exclusivamente naquele colegiado. Em razão de diversas peculiaridades do Poder Judiciário no Estado de São Paulo, a medida de fusão dos tribunais assusta muito, tanto aos juízes, como aos advogados, até diante da expectativa de como as modificações se passarão e de como o tribunal passará a funcionar. A confusão é maior em razão do enorme movimento judiciário paulista, o qual, segundo dados do Relatório Anual de Gestão do Tribunal de Justiça de São Paulo e do Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário (BNDPJ), respondia por 49 % do movimento nacional na Justiça comum, pelo critério de feitos entrados (distribuídos) durante o ano de 2003. Com a integração das competências e dos membros dos três tribunais de alçada, São Paulo terá um "super" tribunal, com pelo menos 338 desembargadores, respondendo por toda a atividade recursal do Estado. As expectativas se agravam com as dificuldades decorrentes da falta de informatização de toda a Justiça de segunda instância paulista, não se tendo notícias atualizadas e disponíveis sobre como e quando os processos serão redistribuídos e encaminhados aos novos julgadores responsáveis. Com as promoções e a integração de novos juízes aos quadros do TJSP, alterando-se ainda as competências das câmaras, haverá intenso trânsito de processos entre os julgadores, desaparecendo eventual prevenção que antes existisse. Os advogados estão, portanto, desinformados e ansiosos. Também parecem estar ansiosos os próprios juízes dos tribunais de alçada extintos (como relatado pelo juiz presidente do Tribunal de Alçada Criminal, Eduardo Pereira Santos, em entrevista na imprensa), já que não sabem em quais câmaras passarão a atuar. Além disso, os juízes possuem apenas um assistente cada, pouco para que possam dar conta da herança provável de 1.500 processos cada um, considerando-se a determinação também constante da Emenda Constitucional nº 45 para que a distribuição de processos se dê de forma imediata. Preocupa, ainda, a necessidade de observância dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000), já que a integração dos juízes dos tribunais de alçada no cargo de desembargadores do TJSP acarretará, inevitavelmente, a correção salarial dos mesmos, sobrecarregando ainda mais o já pesado orçamento do Poder Judiciário. Basta lembrar que nos anos anteriores, o TJSP ficou dentro do limite de 6% da receita corrente líquida do Estado para gastos com pessoal, mas a margem é pequena (5,76% em 2002 e 5,13% em 2003, sendo que os números de 2004 ainda não estão disponíveis). Assim, tendo em vista a enormidade do movimento judiciário no Estado de São Paulo, pelo menos à primeira vista, a fusão dos tribunais parece assustadora, principalmente quando a descentralização parece ser a tendência atual da boa administração, já que é claramente mais fácil gerir células menores. Uma única instituição, que será verdadeiramente gigantesca, não será fácil de administrar, tanto em termos de pessoal, estabelecimentos e custos, como, principalmente, em termos de qualidade e rapidez na prestação do elevado serviço público a que se destina, que é a prestação de tutela jurisdicional.