Título: Por unanimidade, STF autoriza CPI na Câmara
Autor: Basile, Juliano e Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 26/04/2007, Política, p. A10

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou, ontem, a abertura da CPI do Apagão Aéreo na Câmara. A decisão foi unânime e levou em consideração o direito de a minoria parlamentar abrir investigações no Congresso. Será a primeira CPI do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A presidente do STF, ministra Ellen Gracie, irá comunicar formalmente ao presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, a decisão. A partir da notificação, Chinaglia terá de publicar um ato regimental de instalação da CPI, e solicitar aos líderes partidários que indiquem representantes. Eles terão 48 horas para fazê-lo. Se não indicarem os integrantes da CPI, a essa providência terá de ser feita pelo presidente da Câmara. "Na democracia, decisão do STF não se questiona, se cumpre. E a Câmara dos Deputados saberá apurar os fatos com competência", afirmou o ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia..

A oposição comemorou a decisão do STF e procurou adotar um discurso de que a CPI será investigativa e não servirá de panfleto político. "Nós queremos investigar, fazer o diagnóstico de todo o setor aéreo, inclusive o setor privado, que está concentrado. Essa é uma concentração num duopólio, que é o pior dos cenários para o cidadão. Nós defendemos a abertura do setor aéreo ao capital estrangeiro", disse o presidente do Democratas, Rodrigo Maia (RJ). "O Brasil nunca será uma Venezuela porque há um STF determinado a garantir o direito do cidadão de contestar o governo", disse o líder do partido, Onix Lorenzoni (RS).

Já se fala em possíveis negociações para que a oposição tenha direito a um dos cargos diretivos do órgão a ser criado. O governo tem maioria na Câmara e, pela regra da proporcionalidade, os cargos de presidente e relator caberiam a PMDB e PT. "Se o governo quiser nos abafar vai virar guerra. Nada impede que negociemos. Se o governo quiser espaço na Mesa (direção) da CPI do Senado, pode abrir mão de um cargo na CPI da Câmara", argumentou Lorenzoni. "O diálogo e a negociação sempre são possíveis", diz Luiz Sérgio. O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, deverá se reunir com os líderes na manhã de hoje para discutir os trâmites para a instalação da comissão de inquérito.

No julgamento, os ministros consideraram inconstitucional a deliberação do plenário da Câmara que, em 21 de março passado, acolheu recurso proposto pelo PT contra o funcionamento da CPI. Os ministros do Supremo passaram três horas discutindo o assunto e procuraram enfatizar o direito de a minoria fazer investigações na Câmara. O PT alegou que o pedido de abertura das investigações tinha problemas formais, como a ausência de fato determinado a ser apurado e de prazo certo para a CPI funcionar. A oposição recorreu formalmente ao STF contra a decisão do plenário.

Ontem, ao julgar o mandado de segurança da oposição, os ministros foram claros ao considerar que os requisitos para a CPI foram atendidos. O relator do processo, ministro Celso de Mello, disse que o requerimento da oposição citou "com extrema clareza o trágico evento da aviação civil brasileira, em que perderam a vida 154 pessoas". Para ele, a CPI deverá apurar este fato e a crise na aviação civil surgida logo após o acidente, ocorrido em setembro do ano passado, com sucessivos atrasos nos vôos.

O relator ressaltou que a CPI "é instrumento básico da minoria" e os grupos majoritários não podem, segundo ele, "sufocar a minoria". "A maioria não precisa de CPI. Para efeitos de instalação de CPI os grupos minoritários não precisam da vontade da maioria", disse Mello. "A maioria não pode frustrar o direito de investigar, que corresponde ao direito de oposição. Isso faz parte do postulado democrático", completou o relator.

Os demais ministros elogiaram o voto de Mello. "Não é possível, seja por votação direta do requerimento (do PT), seja mediante essa via mais indireta, entregar à maioria o que é no nosso sistema, desde 1934, a prerrogativa absoluta da minoria", afirmou Sepúlveda Pertence. "Não cabe criar, quer no campo da realidade, quer no campo da ficção, incidente para esvaziar o próprio instituto consagrado institucionalmente", disse Marco Aurélio Mello, sobre o instituo da minoria. Ao final da sessão, parlamentares da oposição aplaudiram o resultado e foram advertidos por Ellen Gracie: "A Casa não permite manifestações".

O deputado Antonio Carlos Pannunzio (PSDB-SP), um dos autores da ação no STF, ao final do julgamento defendeu a necessidade da abertura imediata das investigações. "A partir de agora, quem tem que se preocupar com essa história de duas CPIs é o governo", disse.

O mesmo princípio, do direito de a minoria abrir investigação, baseou acórdão publicado ontem pelo Tribunal de Justiça de São Paulo obrigando a Assembléia Legislativa a instalar a CPI da Nossa Caixa. A informação é do portal de notícias G1. O presidente da Assembléia Legislativa, Vaz de Lima, disse que recorreria, primeiramente ao próprio tribunal, para reverter uma eventual decisão pela abertura da CPI.

A decisão do tribunal foi uma resposta ao mandado de segurança impetrado pelo PT. O banco foi acusado de beneficiar deputados estaduais da base aliada ao então governador Geraldo Alckmin (PSDB). Embora tivesse o número mínimo de assinaturas necessárias, o PT não conseguiu a criação da CPI e por isso apelou ao TJ. (Colaborou Paulo de Tarso Lyra)