Título: Usinas terão prioridade em plano de contingenciamento no uso do gás
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 11/04/2007, Brasil, p. A2

As usinas termelétricas terão prioridade no abastecimento de gás natural, em caso de escassez para atender toda a demanda nacional da matéria-prima, conforme o plano de contingência que está sendo elaborado pelo Ministério de Minas e Energia. Indústrias com possibilidade de adaptar suas máquinas a outras fontes energéticas e veículos convertidos a gás (GNV), que podem ser reabastecidos por gasolina ou álcool, ficarão para trás na fila.

Essa definição de prioridades é necessária para o caso de futuras crises no fornecimento de gás, mas tem o potencial de criar contenciosos com vários setores empresariais. Segmentos inteiros, como as indústrias de vidro, investiram pesado no início da década para converter seus fornos a gás natural. Agora, temem não ter acesso ao combustível, embora o ministro Silas Rondeau garanta que todos os contratos serão honrados. O problema, segundo especialistas, é que a Petrobras assumiu nos contratos compromissos maiores do que sua capacidade de atendê-los.

"Ficarão priorizados aqueles em que não há alternativa (de geração de energia)", disse o ministro. Ele participou ontem de uma audiência pública na comissão especial da Câmara dos Deputados para analisar um marco regulatório para a exploração, produção e comercialização do gás.

A comissão "juntará" os três projetos de lei em andamento: um do Executivo, outro do ex-senador Rodolpho Tourinho, já aprovado no Senado, e um terceiro projeto apresentado na Câmara. Rondeau quer uma lei em que o governo tenha poderes para, além do plano emergencial em fase de conclusão, definir uma lista de clientes preferenciais no abastecimento de gás.

A intenção do ministro é dotar a Agência Nacional de Petróleo (ANP) desses poderes, a serem delegados pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), a principal instância do governo para o setor. "A lei dará mais força para a ANP atuar em momentos de crise ou de prenúncios de crise", argumentou.

O plano de contingência ganhou atenção depois que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) constatou, no fim de 2006, a inexistência de gás suficiente para abastecer todas as usinas térmicas, caso haja necessidade de acioná-las para suprir energia ao país. Isso levou à retirada de cerca de 3 mil megawatts (MW) do cálculo de energia disponível no sistema interligado nacional, expondo que as chances de um novo apagão são maiores do que se pensava.

O ministério negocia com a Petrobras uma forma de garantir o retorno dessas termelétricas ao cálculo do sistema. Para tanto, a Aneel exige um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) em que a estatal demonstre como vai assegurar o fornecimento de gás às usinas - o que só pode ocorrer mediante a antecipação dos projetos de exploração da matéria-prima nas bacias brasileiras.

Rondeau sinalizou que o GNV pode subir em Estados que vendem o produto a preços considerados excessivamente baixos, principalmente às suas frotas de táxis. É o caso do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Segundo ele, o quilômetro rodado com gasolina chega a custar o dobro do gás veicular. Na Europa, disse o ministro, o aproveitamento do gás é somente 20% maior, em um sinal de que a vantagem em relação à gasolina pode estar exagerada no Brasil. Para ele, um aproveitamento de 50% parece mais razoável. "A equação de preço do gás tem que se adequar à realidade do mercado", observou Rondeau, acrescentando que a política de incentivo e uso do GNV é uma atribuição não do ministério, mas de cada Estado.

Rondeau avaliou ainda que o governo "provavelmente" não terá como fazer o leilão de Santo Antônio, a primeira das duas usinas hidrelétricas previstas no rio Madeira, em Rondônia, no mês de julho. Ele esperava a emissão de licença prévia do Ibama até meados de março. Como não saiu, fica prejudicado o cronograma de licitá-la até o fim de julho. O novo adiamento pode comprometer a entrada em operação das usinas do Madeira a partir de 2011, quando especialistas advertem para o risco de déficit no sistema elétrico.