Título: BC fraqueja e mantém juros
Autor: Cristino, Vânia ; Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 09/12/2010, Economia, p. 16

Mesmo com a escalada da inflação, Copom deixa a taxa Selic em 10,75%, apostando no aperto do crédito para conter o consumo

O Banco Central (BC) fraquejou. Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) presidida por Henrique Meirelles, tendo ao lado o presidente indicado, Alexandre Tombini, a instituição decidiu manter, por unanimidade, os juros básicos da economia (Selic) em 10,75% ao ano, apesar da escalada da inflação ¿ 0,83% em novembro ¿ e da forte deterioração das expectativas do mercado. Mesmo estando preparada para o possível aperto monetário, a presidente eleita, Dilma Rousseff, comemorou a decisão do BC, que não poupou palavras em seu comunicado oficial para justificar que a Selic não subiu agora, ainda que os preços estejam em disparada, mas aumentará em breve, muito provavelmente em janeiro. Economistas ouvidos pelo Correio afirmaram que não há mais justificativa técnica para a permanência da taxa no nível atual.

Recorrendo a um contorcionismo verbal sem precedentes para explicar a decisão, o BC alegou que precisa esperar os resultados do arrocho no crédito para então dar novos passos na política monetária. Na nota, ressaltou que ¿introduziu recentemente medidas macroprudenciais e que será necessário tempo adicional para melhor aferir os efeitos dessas iniciativas sobre as condições monetárias¿. Assim, o Copom entendeu ¿não ser oportuno reavaliar a estratégia de política monetária nessa reunião¿. Fechando o texto, o banco garantiu que vai acompanhar a evolução do cenário para definir os próximos passos. Com a manutenção da Selic, o Brasil continuou com os maiores juros reais do mundo, de 4,8% ao ano, seguido pela África do Sul (2%) e Austrália (1,9%).

A razão para o Copom não mexer na Selic foi muito mais política, mostrando resistência em dar o braço a torcer, do que técnica. ¿Não é padrão do Banco Central mudar a sua posição de forma tão drástica¿, disse o economista Maurício Molan, do Banco Santander. Segundo ele, o BC vinha ressaltando que havia um quadro benigno para a inflação. Portanto, alterar a postura de uma hora para a outra seria admitir que errou em outubro, quando a ata foi enfática em classificar o cenário externo como desinflacionário e a escalada dos preços de alimentos como esperada e passageira. ¿O aumento virá em janeiro¿, assegurou.

Para Molan, a ata da reunião, que será divulgada na próxima semana, será dura e sinalizará para o mercado a nova visão do BC. ¿A inflação veio muito acima do esperado e isso contamina o futuro. Daí, exige uma atuação forte da política monetária¿, explicou. O Santander acredita que a Selic subirá 2,25 pontos em 2011, com a taxa chegando a 13%.

Sem escapatória O economista-chefe do BES Investimento, Jankiel Santos, não ficou surpreso com a manutenção da Selic. ¿Uma piora da inflação no fim do ano já era esperada e o BC ganhou tempo com as medidas restritivas ao crédito e o aumento dos depósitos compulsórios, medida que retirará R$ 61 bilhões do mercado¿, avaliou. Em janeiro, no entanto, não haverá escapatória. O BC terá que subir os juros para acomodar as expectativas e trazer a inflação para o centro da meta no ano que vem, de 4,5%. A aposta do BES é de três ou quatro altas sucessivas da taxa em 0,5 ponto.

Já o economista-chefe da Prosper Corretora, Eduardo Velho, acredita que a ata vai preparar o mercado para o tamanho da alta que virá a partir de janeiro. ¿Tecnicamente, eles deveriam ter aumentado agora, mas optaram por não mudar de posição repentinamente¿, observou. Ele também estima em três ou quatro subidas de 0,5 ponto em 2011. ¿Com as medidas anunciadas nos últimos dias, o BC deixou claro que vai utilizar outros instrumentos para evitar uma puxada forte nos juros.¿

Segundo o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, a manutenção da taxa na última reunião do ano foi razoável. Na sua avaliação, o governo deu sinais claros de que a política fiscal será mais apertada em 2011 e o crédito, restrito. Ele disse que o mercado se tranquilizou com a indicação de Tombini para o BC e sua expectativa é de que a Selic suba 1,5 ponto nas três primeiras reuniões do Copom do ano, começando a cair a partir de outubro ou novembro.

Álibi e críticas Nos cálculos de Jancson Constantin, economista do HSBC, as resoluções que determinaram a restrição creditícia têm impacto equivalente a um aperto entre 0,50 e 1 ponto na Selic. Isso dá um álibi para o BC não elevar os juros agora. Mas, ainda que a redução dos empréstimos e financiamentos tenha força para segurar o consumo, a avaliação de especialistas é de que o atual cenário, com escalada dos índices gerais de preços e a consequente cascata de reajustes pesados em vários contratos em 2011, justificaria um aumento. ¿Os dados permanecerão ruins até março¿, avaliou. ¿A inflação está disseminada. Por isso, esperamos que ao menos em janeiro haja uma elevação na Selic¿, acrescentou.

¿Vamos esperar que, agora, o governo agora cumpra a parte dele e corte gastos no início do ano para o setor produtivo não ter de pagar a fatura de mais altas na Selic¿, ponderou Roque Pellizzaro, presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL). Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI, Robson Andrade, a manutenção da Selic foi acertada, devido ao arrocho no crédito já imposto pelo BC. Mas, também, a seu ver, o governo precisa reduzir despesas, para que os juros possam cair, corrigindo as distorções no câmbio, que tanto têm prejudicado a produção nacional.