Título: Analistas alertam para inflação mais disseminada
Autor: Saraiva, Alessandra; Serodio, Guilherme
Fonte: Valor Econômico, 06/02/2013, Brasil, p. A3
Commodities agropecuárias em queda no atacado levaram ao enfraquecimento da inflação apurada pelo Índice Geral de Preços - Disponibilidade (IGP-DI). O indicador, usado no reajuste anual de contratos de serviços e de dívidas dos Estados e municípios com a União, desacelerou de 0,66% para 0,31% de dezembro para janeiro. Mas o recuo não foi comemorado por analistas, que alertam para o avanço mais espalhado de preços, no atacado e no varejo, em janeiro. Na prática, os movimentos de deflação e de desaceleração de preços estão concentrados nas matérias-primas agropecuárias atacadistas, principalmente soja. Somente esse item, produto agropecuário de maior peso na inflação do atacado, mostrou queda de 14,23%, de janeiro - ante recuo menos intenso, de 1,69%, em dezembro. Em 12 meses, o IGP-DI acumula alta de 8,11%.
"A desaceleração de preços tem a ver com o comportamento mais favorável das matérias-primas agrícolas", confirmou o coordenador de análises econômicas da Fundação Getulio Vargas (FGV) e responsável pelo cálculo do indicador, Salomão Quadros. Segundo ele, é "questão de tempo" até esses recuos de preços serem repassados para o varejo. Ou seja, o economista projeta alimentos mais baratos para o consumidor em fevereiro, derivados dos agropecuários já em queda no atacado.
Para a economista da Rosenberg & Associados, Priscila Godoy, não é saudável ancorar o recuo do indicador como um todo somente em um único ou em poucos segmentos, principalmente os associados às commodities. "Se o item que está segurando o avanço da inflação, tanto no atacado quanto no índice geral é aquele mais volátil, aquele que pode mudar de trajetória a qualquer momento, eu não vejo o recuo no IGP-DI causado por queda nos agropecuários atacadistas como uma boa notícia. Porque, quando esses preços voltarem a subir, de forma súbita, o indicador pode ir para 0,60%, tranquilamente", alertou.
Outro aspecto a ser destacado no IGP-DI de janeiro foi o comportamento dos produtos industriais no atacado, na avaliação de Fábio Romão, economista da LCA Consultores. A inflação industrial do atacado, que não oscila com facilidade, saltou de 0,53% para 0,67% de dezembro para janeiro. Reajustes nos preços de derivados de petróleo e álcool, de produtos químicos, e de fumo, em uma economia com sinais de reaquecimento (o que fortalece demanda), levaram ao resultado, avaliou o economista. Tendo em vista esses fatores, a expectativa, segundo Romão, é de inflação industrial mais elevada no atacado em 2013, dentro dos Índices Gerais de Preços (IGPs). No ano passado, os preços industriais subiram 5,5%. "Para 2013 os preços industriais devem subir 7,8%", acrescentou.
Para Romão, a inflação industrial em alta vai continuar no curto prazo, e deve ajudar a manter os IGPs em torno de 0,30% em fevereiro. Segundo ele, os IGPs devem ficar em torno desse nível, mesmo com novas deflações no setor agropecuário do atacado, com a esperada menor pressão nos preços do varejo, originada de repasses de agrícolas mais baratos no atacado, e com a queda na tarifa de energia. A projeção é semelhante à do banco ABC Brasil, que espera taxa entre 0,20% e 0,30% para o IGP-DI deste mês.
Se no curto prazo, porém, a expectativa é de inflação menos intensa no varejo, o IGP-DI de janeiro mostrou sinais de persistência inflacionária junto ao consumidor, que pode continuar em horizonte de longo prazo. Na margem, a inflação varejista no IGP-DI, apurada pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC-DI), saltou de 0,66% para 1,01%, impulsionada por concentração de reajustes nos preços de educação, normalmente realizados nesta época do ano, e alimentos sazonalmente mais caros. Mas a pior notícia ficou com o núcleo da inflação do IPC-DI, que exclui as mais expressivas altas e quedas percebidas ao consumidor. Usado para mensurar tendências na inflação, o núcleo se acelerou de 0,47% em dezembro para 0,58% em janeiro, a maior taxa em 13 meses.
O dado chamou atenção do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. "Temos hoje aceleração inflacionária em curso e o Banco Central está acomodado, com um IPCA [Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo] rodando a 6% ao ano" disse, referindo-se ao indicador do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), usado para definir a meta de inflação. "Antigamente, isso suscitaria no Banco Central a intenção clara de começar a agir. Hoje, não há nada nesse sentido. Por isso, há o risco desse novo patamar de inflação se consolidar, e complicar ainda mais a reputação do banco", avaliou, referindo-se indiretamente ao fato de que não há sinais de que o BC possa elevar a taxa básica de juros - o que seria um retorno à costumeira estratégia do banco de combate inflacionário.