Título: Ayres Britto defende decisão do STF sobre mensalão em San José
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 06/02/2013, Política, p. A10

Ex-ministro Ayres Britto: "O STF reconheceu no julgamento da Ação Penal 470 que há um modo de fazer política que é desqualificador da coisa pública"

O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto, defendeu a decisão tomada no julgamento do mensalão em debate na Corte Interamericana de Direitos Humanos, em San José, na Costa Rica.

"O STF reconheceu no julgamento da Ação Penal 470 que há um modo de fazer política que é desqualificador da coisa pública", afirmou o ex-ministro durante seminário no Instituto Interamericano de Direitos Humanos, entidade que fica a duas quadras da Corte. Segundo o ex-ministro, esse "modo desqualificador", quando realizado sob o argumento de que seria necessário para garantir a governabilidade, "resvala para o arbítrio". "A governabilidade tem que se dar nos marcos da Constituição", completou Ayres Britto no evento que tem o objetivo de aproximar o Brasil da Corte internacional.

A declaração é importante porque advogados de alguns dos 25 réus que foram condenados no julgamento do mensalão manifestaram a intenção de recorrer à Corte para que seja revista a decisão do STF. Eles pretendem alegar que houve prejuízo ao direito de defesa e que os réus teriam direito ao duplo grau de jurisdição - princípio pelo qual uma decisão tomada por um tribunal deve ser analisada novamente por outro.

Representantes do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP) já procuraram advogados que atuam perante a Corte, em San José, para recorrer. O recurso, no entanto, teria que ser proposto inicialmente perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em Washington. Apenas se a Comissão entender que o caso é passível de ser julgado é que ele seria remetido para a Corte, em San José.

Para Britto, o direito de defesa dos réus foi amplamente respeitado pelo STF. Ele lembrou que os advogados tiveram duas semanas para defender os seus clientes em sustentações orais perante o STF. Quanto ao duplo grau de jurisdição, o ex-ministro recordou que é a Constituição brasileira que determina que a existência do foro privilegiado pelo qual deputados federais só podem ser julgados pelo STF.

Britto citou o mensalão em meio a vários julgamentos em que houve, segundo ele, amplo respeito aos direitos humanos no Supremo. "Os direitos humanos têm fluido no Brasil e começaram a pautar as decisões dos tribunais a partir da Suprema Corte", afirmou. Ele lembrou a decisão que autorizou a realização de pesquisas com células-tronco, o fim da Lei de Imprensa, a permissão para mulheres fazerem abortos nos casos de fetos anencéfalos (com má formação do cérebro), as decisões favoráveis à demarcação de terras indígenas e a que declarou válida a Lei da Ficha Limpa.

Britto presidiu o STF durante a maior parte do julgamento do mensalão. Ele se aposentou em novembro ao completar 70 anos.