Título: Slim reforça ações filantrópicas para deixar seu legado
Autor: Smith, Geri
Fonte: Valor Econômico, 13/03/2007, Empresas, p. B2

O que você faz quando é o empresário mais poderoso do México e um pára-raios de críticas? Você doa muito mais do seu dinheiro. É o que Carlos Slim Helú pretende fazer - neste ano e provavelmente pelo resto de sua vida. O bilionário, que atua nos setores de telecomunicações, varejo e industrial, certamente pode se dar a esse luxo. Sua fortuna pessoal, estimada em US$ 54 bilhões, cresceu cerca de 66% nos últimos anos graças ao desempenho de suas companhias na bolsa de valores mexicana. Isso significa que Slim, de 67 anos, pode ser atualmente o segundo homem mais rico do mundo, perdendo apenas para Bill Gates.

Assim como qualquer industrial poderoso que se aproxima de seu crepúsculo, Slim quer deixar um legado duradouro. Seguindo os exemplos de Gates e Warren Buffett, o magnata mexicano acredita que a filantropia é a única maneira de fazer a diferença, não só no México como em toda a América Latina.

Nos últimos dez anos, a obra de caridade mais conhecida de Slim foi feita por meio da Fundação Telmex, de sua companhia de telecomunicações, cujos fundos de US$ 1,2 bilhão fazem da Telmex a maior doadora empresarial da América Latina.

Mas Slim está ampliando as atividades da instituição de caridade de sua família, a Fundação Carso, depois de mais que dobrar o tamanho de seus recursos no ano passado, para US$ 2,5 bilhões. "Eu não estou só doando dinheiro. Estou canalizando recursos para tentar resolver problemas [de saúde e educação] da maneira mais rápida possível", disse à "BusiwessWeek" em uma entrevista no escritório de sua mansão na Cidade do México, cheia de livros antigos e "memorabilia" de baseball.

Mesmo assim, Slim possui bons motivos, além de ser um coração mole, para abrir as tampas da filantropia. Tal gesto poderá diminuir as pressões do novo presidente mexicano, Felipe Calderón, que está lançando uma campanha para controlar algumas das companhias mais poderosas que dominam os setores das telecomunicações, cimento, cerveja, tortilhas e outras indústrias mexicanas, num esforço para alimentar a concorrência e o crescimento.

O império de Slim, que responde por quase metade do valor da bolsa mexicana, de US$ 366 bilhões, é um alvo óbvio. A Telmex, que é controlada em 49% por Slim e sua família, tem 90% das linhas telefônicas existentes no México e cobra uma das tarifas mais altas do mundo, segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Concorrentes como a espanhola Telefónica Móviles queixam-se de que a gigante da telefonia sem fio de Slim, a América Móvil, usa seu poder para manter 72% dos clientes de telefones sem fio do México.

O ministro da Economia, Eduardo Sojo, diz que o governo pretende olhar com mais rigidez para vários setores que precisam de mais competição, incluindo o de telecomunicações. "Um país como o México, com uma distribuição de renda tão injusta, precisa de regras mais rígidas que promovam uma maior competição", observa ele.

Os críticos de Slim afirmam que sua caridade tem motivação política. "Há um consenso público cada vez maior de que as tentativas de Slim de bloquear a concorrência estão afetando a economia mexicana", diz Denise Dresser, uma professora de ciências políticas do Instituto Tecnológico Autônomo do México, da Cidade do México. "Ele quer acabar com essas críticas."

Mas nem todo mundo olha para a iniciativa de Slim de maneira crítica. Há quem acredite que seus esforços na caridade poderão inspirar outras famílias ricas da América Latina, onde a filantropia em grande escala não é comum. No México, por exemplo, não há imposto sobre heranças, de modo que o incentivo a doações é muito menor que nos Estados Unidos. "É muito bom que a Fundação Carso e outras estejam crescendo no México, porque precisamos encorajar as doações de caridade", diz Jorge V. Villalobos, presidente do Centro Mexicano para a Filantropia.

Depois de anos maquinando - a partir de um escritório sem janelas no porão - o crescimento de suas companhias, Slim insiste em que quer dedicar quase todas as suas energias à filantropia daqui para a frente. Ele transferiu o controle operacional pleno de seu império para os três filhos - Carlos, com 40 anos; Marco Antonio, de 38 anos; e Patrick, com 37 anos. Nas próximas semanas, Slim pretende anunciar a criação de três novas instituições de caridade que irão se concentrar nas áreas de saúde, recreação e educação no México, onde cerca de metade da população vive com menos de US$ 2 por dia.

Os novos grupos, que serão administrados pela Fundação Carso, vão financiar de vacinas para crianças e pesquisas sobre o câncer ao treinamento de professores. Programas serão criados para melhorar os serviços médicos nas áreas rurais e encorajar atividades esportivas comunitárias.

A fundação planeja iniciativas parecidas nos 14 países da América Latina onde as companhias de telecomunicações de Slim operam. "Estamos empenhados nisso", diz Slim. "Nos certificaremos de que recursos suficientes estejam disponíveis para tudo o que precisar ser feito."

Em seus dez anos de história, a Fundação Telmex já liderou programas inovadores para as famílias pobres do México. Ela doou 95 mil bicicletas para crianças pobres que levam duas horas a pé para chegar às escolas que freqüentam, além de 70 mil pares de óculos para crianças em idade escolar. Ela pagou as despesas de mais de 200 mil cirurgias para mexicanos de baixa renda e as fianças de mais de 50 mil réus primários em pequenos crimes, cometidos em grande parte por necessidade financeira. A Fundação Telmex também já forneceu bolsas de estudo para mais de 150 mil estudantes universitários.

Até agora, a Fundação Carso, criada há 20 anos, manteve um perfil reservado. Ela ajuda sem alarde hospitais e um centro de transplante de fígado - a esposa de Slim, Soumaya, morreu de uma doença no fígado em 1999. A entidade tem um arquivo valioso de documentos e livros históricos mexicanos avaliado em US$ 300 milhões, além de um museu para o qual Slim doou sua coleção de arte, avaliada em US$ 100 milhões.

Agora, com mais recursos e três novas instituições, a fundação deverá ter um impacto maior. Recentemente ela começou a trocar os móveis de mil escolas públicas de todas as regiões do país e pretende ajudar o governo a distribuir laptops de baixo custo por meio do programa "One Laptop per Child" do Media Lab, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). A fundação vai ajudar centenas de milhares de professores a comprar seus próprios PCs e subsidiar suas conexões à internet.

Até mesmo esse programa poderá provocar controvérsias, uma vez que a Telmex vai vender os computadores via financiamentos mensais e fornecer serviços da internet pagos em parte pela Carso. Isso está levando a críticas de que a caridade de Slim tem como objetivo beneficiar suas próprias empresas. "Eu não ligo para o que as pessoas dizem", responde. "O importante é que o maior número possível de pessoas possam se conectar à internet e assim serem mais produtivas." Não há dúvidas de que ele também espera que o governo esteja prestando atenção nisso.