Título: STF condena João Paulo a regime fechado e reduz pena de Jefferson
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Fonte: Valor Econômico, 29/11/2012, Política, p. A17

O Supremo Tribunal Federal (STF) terminou ontem a definição das penas dos 25 réus e o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu ficou com a maior punição entre os políticos. O STF também definiu que o deputado e ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) deverá cumprir 9 anos e 4 meses de prisão, em regime fechado, pelos crimes de peculato, corrupção e lavagem de dinheiro, além de pagar multa de R$ 370 mil. A Corte concedeu, ontem, ainda, redução de pena para o presidente do PTB Roberto Jefferson pelo fato de ele ter denunciado o esquema do mensalão e condenou-o a 7 anos e 14 dias de prisão, além do pagamento de uma multa de aproximadamente R$ 720,8 mil, por corrupção e lavagem de dinheiro.

Jefferson vai cumprir pena em regime semiaberto pelo qual pode passar o dia fora da cadeia, mas terá que dormir na prisão pelo tempo mínimo equivalente a um sexto da pena (1 ano, 2 meses e 3 dias). Se o STF não tivesse reduzido a pena do presidente do PTB, ele teria sido condenado a 10 anos, 6 meses e 10 dias. Essa punição seria próxima a que foi imposta a Dirceu - 10 anos e 10 meses de prisão - e o seu cumprimento se daria em regime fechado (sem sair da cadeia).

A definição da pena de Jefferson foi tomada após divergência entre o presidente do STF e relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, e o revisor e vice da Corte, ministro Ricardo Lewandowski.

O revisor, que reduziu a pena de vários réus, não aceitou fazê-lo para Jefferson sob a alegação de que o delator do mensalão não colaborou em nada com as investigações. "A colaboração desse réu foi zero", disse Lewandowski. "Ele não confessou o crime e jamais divulgou informações relevantes ao processo. De denúncia espontânea, aqui não tem nada", continuou o revisor. Lewandowski afirmou ainda que Jefferson sequer cunhou o termo "mensalão", atribuindo o feito ao deputado Mirto Teixeira (PDT-RJ), em entrevista ao "Jornal do Brasil", em 2004. "Jefferson negou peremptoriamente ao juiz os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro e jamais teve o intuito de delatar nada nem ninguém", concluiu o revisor.

Já Barbosa afirmou que a Ação Penal nº 470 não existiria sem Jefferson, pois foi ele quem denunciou o esquema de pagamento de mesada para parlamentares, em entrevista à "Folha de S.Paulo", em junho de 2005. "Ao revelar um esquema de pagamento de mesada no Congresso tornou-se possível verificar a compra de bancadas e de apoio político", disse o relator. "A principal contribuição de Jefferson foi a de trazer a público o nome do maior articulador do grupo criminoso, o publicitário Marcos Valério. Ao anunciar o nome do distribuidor do dinheiro, Jefferson também trouxe à luz um personagem importantíssimo, o então tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Ele também anunciou o nome dos parlamentares que firmaram acordos com Dirceu e com (o então presidente do PT) José Genoino em troca do apoio de seus partidos aos projetos de interesse do governo na Câmara", continuou Barbosa. O relator enfatizou ainda que Jefferson recebeu R$ 4 milhões das agências de Valério de um total de R$ 20 milhões que foram acertados com o PT. Pelo acordo, o PTB votaria a favor dos projetos de lei de interesse do governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Câmara e apoiaria o PT nas eleições municipais de 2004 em diversas capitais.

A maioria dos ministros concordou com Barbosa. "Jefferson acabou prestando um grande serviço a essa pátria no que escancarou as mazelas existentes", disse o ministro Marco Aurélio Mello, referindo-se ao esquema do mensalão. Para ele, sem a denúncia inicial do presidente do PTB "não teriam surgido os parâmetros da prática criminosa".

Após a decisão, o advogado Luiz Francisco Corrêa Barbosa, que defende Jefferson, afirmou que vai continuar buscando a absolvição de seu cliente. Ele alegou que a Constituição garante a inviolabilidade criminal dos parlamentares por suas manifestações. "Se essa preliminar for reconhecida, não tem crime nenhum", sustentou o advogado. "Eu persigo a absolvição."

No caso de João Paulo, a pena foi aumentada pelo fato de ele ter presidido a Câmara. "O réu conduzia a mesa diretora de uma das casas do Poder Legislativo e auxiliou diretamente na transferência de recursos para as agências de Valério", resumiu Barbosa.

A definição das penas de João Paulo gerou um impasse no STF, após o advogado Alberto Zacharias Toron alegar que, dada a aposentadoria do ministro Carlos Ayres Britto, restaram 5 cinco ministros para decidir a punição por lavagem de dinheiro, o que seria número minoritário na Corte, composta por 11 integrantes. Com receio de a questão levar à anulação da pena a João Paulo, Barbosa se negou a colocá-la em votação, o que gerou protestos de Marco Aurélio e Lewandowski.

"É desejável que essa questão seja decidida pelo plenário", advertiu o revisor. "A minha experiência é que as cortes trabalham sob regime parlamentarista e não presidencialista", continuou Lewandowski. "Vossa excelência está se insurgindo contra a figura do presidente", rebateu Barbosa. "Pelo contrário. Eu tenho o maior respeito por vossa excelência", respondeu o revisor. O impasse foi resolvido por Celso de Mello, que pediu que a votação fosse feita pelo plenário e foi atendido por Barbosa, após esse último ser informado de que a sua posição seria vencedora e que a pena a João Paulo seria mantida, o que acabou ocorrendo.

O STF também definiu a pena do ex-tesoureiro do PTB Emerson Palmieri em 4 anos e multa de R$ 247 mil. Ele foi beneficiado com redução de suas punições pelo fato de ter confessado a participação em reuniões com Delúbio e Genoino para fechar o empréstimo de R$ 20 milhões ao PTB e de assumir que foi a Portugal com Valério, sob o aval de Dirceu, para tentar obter dinheiro de uma empresa interessada na compra da Telemig. Segundo Barbosa, a contribuição de Palmieri "revelou o contexto probatório que veio a comprovar a culpabilidade de Dirceu". Ao fim, Palmieri foi condenado a punições alternativas: pagamento de 150 salários-mínimos e proibição de assumir qualquer cargo público.

O STF ainda vai fazer uma calibragem final das penas para corrigir eventuais incongruências. Ontem, Barbosa qualificou como o "absurdo dos absurdos" a pena ao deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), de 7 anos e 10 meses, o que permite que ele cumpra no regime semiaberto. Essa calibragem será feita na próxima sessão, na quarta-feira, quando a Corte também vai discutir a perda de mandato dos deputados que foram condenados no mensalão.

O presidente da Câmara, Marco Maia, afirmou que vai pedir dois pareceres sobre as prerrogativas da Câmara em relação aos deputados acusados no julgamento do mensalão. Ele disse que não está em jogo somente a retenção do passaporte diplomático, mas também a perda de mandato dos que foram condenados. Informou que vai pedir pareceres à Advocacia-Geral da União e a um constitucionalista de renome e independente do Poder Público: "Vejo por bem não tomar a decisão só pelo parecer da Câmara. Considero necessária outra opinião para tomar uma decisão mais segura."