Título: Tesouro faz teste em pista deixada por Banco Central
Autor: Pinto , Lucinda
Fonte: Valor Econômico, 13/02/2013, Finanças, p. C2

O nervosismo que tomou conta do mercado de juros semana passada pode seguir no horizonte. Profissionais dizem que os preços ao longo dos vencimentos de contratos futuros de juros (a curva a termo) ainda seguirão distorcidos, podendo inclusive limitar ou impedir a venda de títulos públicos federais prefixados, nos próximos leilões.

Amanhã, o cronograma de leilões semanais prevê a oferta Letras do Tesouro Nacional (LTN) com vencimentos em 2013, 2015 e 2016 e também Notas do Tesouro Nacional (NTN-F) para 2019 e 2023. Os volumes ofertados serão definidos na manhã do leilão, a partir da consulta de demanda junto ao mercado.

Essa operação será um termômetro da disposição do mercado para voltar a aplicar em juros nos níveis atuais. Na quinta-feira passada, a volatilidade levou o Tesouro a recusar todas as propostas para 3,5 milhões de LTN de três vencimentos. Desde novembro de 2007, o Tesouro não deixava de vender um lote inteiro de papéis - decidiu tomar essa atitude agora não por causa da alta das taxas, mas pela volatilidade.

"O mercado está muito sensível porque não está posicionado a favor de um aperto monetário", afirma Francisco Levy, estrategista do UBS Wealth Management.

A incerteza provocada pela combinação de inflação em 12 meses superior a 6% - ante uma meta do BC de 4,5% - e uma sinalização da autoridade monetária de que quer manter a Selic estável em 7,25% acabou contaminando os negócios de juros. Na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), as taxas projetadas para janeiro de 2014 subiram de 7,26% dia 1º de fevereiro para 7,42% sexta-feira passada, dia 8.

É que diminui entre os agentes a crença de que o BC tem poder para segurar a inflação com instrumentos alternativos à elevação de juros. O economista-chefe do J.Safra, Carlos Kawall, aponta que as medidas macroprudenciais que miraram o crédito em 2010 não fazem sentido neste ano porque a demanda por financiamentos está bem abaixo dos picos anteriores e até estagnada. O real mais apreciado também parece carta fora do baralho, por causa das demandas da indústria, e a política fiscal é expansionista. "Nesse contexto, o risco seria mesmo de elevar juros", afirma, apontando sinais de recuperação da indústria como espaço para o BC ampliar o foco na inflação em detrimento da preocupação com a atividade.

Esse ambiente já impõe alguma cautela por parte do Tesouro desde o início do ano. Da oferta total de 25,3 milhões de títulos prefixados (LTN e NTN-F) nos cinco leilões de janeiro, foram vendidos 19,699 milhões de papéis. Na semana retrasada, das 3 milhões de LTN ofertadas, a venda foi de 2,38 milhões, enquanto 880 mil NTN-Fs foram absorvidas de um lote de 1,050 milhão.

Ao indicar que está preocupado com o rumo da inflação, o presidente do BC, Alexandre Tombini, teria colocado em xeque a convicção de que o aperto monetário não viria. Mesmo insistindo que a mensagem da ata, de estabilidade de juros por tempo suficiente prolongado, ainda vale, o mercado começa a considerar que está correndo riscos. "O BC está agindo de forma parecida com outros bancos centrais, ao tentar conduzir o mercado com o discurso", diz Levy, do UBS Wealth Management.

"O mercado está viciado em achar que o governo não vai usar juros", diz um experiente analista, para quem todo ajuste visto até aqui está longe de indicar apostas firmes em aperto monetário.