Título: Acordo setorial na OMC divide indústria
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 09/03/2007, Brasil, p. A4

A indústria brasileira está dividida sobre a possibilidade de selar acordos setoriais nas negociações da Organização Mundial de Comércio (OMC). Setores exportadores, como madeira ou pedras preciosas, vêem uma chance de abrir os mercados mundiais para seus produtos. Já setores que agregam mais valor e temem a concorrência externa não querem nem ouvir falar do assunto. Essa divergência pode dificultar que os países membros da OMC cheguem a um acordo.

Os acordos setoriais serão um dos temas das conversas da representante comercial dos Estados Unidos, Susan Schwab, que chegou ontem à noite ao Brasil. Ela se encontra hoje à tarde com empresários e com o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, amanhã. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Associação Nacional dos Manufaturados (NAM) estão negociando uma lista de setores para zerar ou reduzir significativamente as tarifas na OMC.

Um dos motivos que atrai os setores exportadores para os acordos setoriais é deixar de depender da boa-vontade americana para incluir seus produtos no Sistema Geral de Preferências (SGP). Muitos desses setores conseguem vender seus produtos no mercado dos EUA sem pagar tarifa, porque se beneficiam dessa concessão unilateral do governo americano.

É o caso da madeira processada. "Temos muito interesse nos acordos setoriais", diz Luiz Carlos Reis de Toledo Barros, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada (Abimci). Em 2004, o setor extrapolou os limites impostos pelo SGP para a exportação de compensado de pinos e perdeu o benefício, passando a pagar tarifa de 8% no mercado americano. "Isso está prejudicando muito o setor", diz o empresário.

As exportações brasileiras de compensado de pino, insumo para a construção civil, aumentaram muito, porque acompanharam o ritmo do boom imobiliário dos Estados Unidos. No pico, os americanos chegaram a construir 2,2 milhões de residências novas por ano. Graças a esse fenômeno, os EUA se tornaram o principal destino das exportações brasileiras de madeira processada, respondendo por 50% das vendas deste produto no exterior.

No setor de pedras preciosas, o principal interesse dos empresários é deixar de pagar tarifa para a importação de gemas, insumo das jóias. "O Brasil produz muita pedra preciosa, mas não todas", diz Écio Morais, diretor-executivo do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos (IBGM). Ele explica que a tarifa de importação, que está em 18%, encarece a exportação das jóias.

O setor, no entanto, não tem interesse de liberalizar totalmente o mercado de jóias, produto de maior valor agregado que também paga 18% de tarifa de importação. As jóias brasileiras gozam os benefícios do SGP americano e conseguiram renová-los por dois anos. Em quatro anos, as exportações brasileiras de jóias dobraram e atingiram US$ 110 milhões em 2006.

Nos setores citados acima, o Brasil é altamente competitivo e praticamente não importa nada. Já nos segmentos de maior valor agregado e com importações expressivas em que a abertura mais interessaria a parceiros como Estados Unidos e União Européia, as resistências em relação a acordos setoriais são muito fortes.

"Nem pensar em conversar sobre acordo setorial", diz Mário Branco, gerente de comércio exterior da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). Ele diz que os cortes gerais que a Rodada Doha pode provocar já serão profundos o bastante para prejudicar as indústrias do setor no Brasil.

Caso prevaleça a posição brasileira de fórmula Suíça 30 para cortar as tarifas - o que é pouco provável, pois os países ricos vão pedir mais - a tarifa consolidada do setor elétrico e eletrônico cairia de 35% para 17%. "Essa concessão já é muito, pois o real está valorizado e a concorrência chinesa é muito forte", diz Branco.

Os fabricantes brasileiros de máquinas também são contra os acordos setoriais. "Esse tipo de negociação é para setores altamente competitivos. Infelizmente, não é o caso da indústria de máquinas e equipamentos", diz Suely Agostinho, diretora de estratégia e negociações internacionais da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).

Ela afirma que o setor perdeu competitividade recentemente com a valorização do real e o aumento do custo dos insumos como o aço. Além disso, os fabricantes de máquinas e equipamentos estão divididos em diversos subsetores com realidades bastante diferentes. "É muito difícil chegar a um parâmetro que satisfaça a todos", diz Suely.

A executiva não acredita que a negociação de acordos setoriais vá prosperar, porque os europeus estão muito reticentes. A União Européia dificilmente conseguirá chegar a um consenso sobre uma lista de setores com todos os países membros do blocos. "Essa discussão é uma perda de energia", diz Suely.