Título: Analistas prevêem fim do dissenso
Autor: Guimarães, Luiz Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 06/03/2007, Finanças, p. C1

Depois de duas reuniões seguidas sem que os oito membros do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central tivessem obtido uma unanimidade em sua decisão monetária, desta vez, no encontro que começa hoje e termina amanhã, os analistas acreditam no consenso em favor de mais uma queda de 0,25 ponto percentual. Deve reinar no Copom a mesma uniformidade de pensamento que prevalece no mercado. Todos os 18 analistas consultados pelo Valor prevêem que o corte do juro básico será mantido em 0,25 ponto, sem viés e sem divergência.

Na reunião anterior, de janeiro, o placar foi de 5 a 3 pela baixa de 0,25 ponto, sendo que os três dissidentes votaram pelo 0,50 ponto. E no encontro de novembro, o mesmo placar de 5 a 3 decidiu por 0,50 ponto. Poderia haver nova dissidência agora em março se não tivesse eclodido externamente um forte movimento de correção de preços de ativos sujeitos a risco.

De acordo com o economista-chefe da Sul América Investimentos, Newton Rosa, sem as turbulências internacionais, o placar, tanto no mercado quanto no Copom, seria de novo apertado. Embora prevaleça o entendimento de que a tormenta externa é passageira, pois não está ligada aos fundamentos da economia mundial, a prudência recomenda ao Copom reiterar o ritmo mais comedido. "A economia brasileira está mais blindada contra os efeitos das turbulências, não há uma reação brutal da taxa de câmbio a elas, tanto que o BC se dá ao luxo de continuar comprando dólar, mas a parcimônia sempre está presente nas reuniões do Copom", diz Rosa.

O BC não pode tomar uma decisão com base no "tudo indica" e, por isso, será conservador. Na opinião dos analistas, tudo indica que o distúrbio instalado nos vários mercados pelo desmonte das operações excessivamente alavancados (cuja origem é um empréstimo bancário) não irá provocar uma depreciação cambial de caráter permanente. A meta central de inflação de 4,5% para este ano e o próximo estaria sob ataque se o câmbio invertesse a rota atual e passasse a se depreciar. Os analistas não esperam nem desvalorização mais duradouro nem um surto de queda do real capaz de elevar o preço do dólar para R$ 2,40 como aconteceu na crise de maio do ano passado, motivada pelas dúvidas sobre o fim do aperto monetário americano.

Mas da mesma forma como o Copom não pode agir baseado no "tudo indica", suas decisões monetários não resultam de perguntas iniciadas com um "e se". E se as correções de preço atuais vierem a afetar o lado real da economia mundial, reduzindo o crescimento dos EUA e da China? E se for instalada uma megaaversão ao risco capaz de desencadear uma fuga em massa dos ativos de emergentes? E se, na hipótese de uma disparada do dólar, a economia nacional voltar a enfrentar um descontrole inflacionário similar ao do começo do governo Lula? Se prevalecesse o "e se", o Copom pararia de cortar o juro imediatamente.

"Seria um tiro no próprio pé", avalia o economista-chefe da Grau Gestão de Ativos, Pedro Paulo B. da Silveira, para quem a decisão de manter o juro básico em 13% provocaria uma desarticulação ainda maior nos mercados do que o desarranjo já instaurado pelas turbulências externas. Ou seja, a estabilidade da taxa agregaria mais volatilidade quando as atuações monetárias e cambiais do BC visam justamente o contrário.

Para Roberto Padovani, estrategista de investimentos sênior para a América Latina do Banco WestLB, uma parada técnica neste momento não seria justificada pelos riscos inflacionários. "Mesmo com as incertezas presentes na economia mundial, o prêmio de risco e a taxa de câmbio operam com relativa estabilidade", diz Padovani. Da mesma forma, as importações continuam relativizando o forte crescimento observado na demanda doméstica. Pelos canais de atividade e câmbio, portanto, as expectativas de inflação continuam ancoradas e apontam para taxas abaixo da meta definida para 2007 e 2008.

De acordo com o economista, mesmo que não tivessem surgido as tempestades de março e mesmo que as condições econômicas permitissem um corte de 0,50 ponto percentual, a decisão de janeiro restringe de modo importante o conjunto de possibilidades para o Copom que começa hoje. O BC não pode nem antecipar a melhora no cenário externo, por meio do retorno da baixa de 0,50 ponto, nem a sua piora, através da manutenção da taxa.

Tecnicamente, mesmo sem recorrer às incertezas vindas de fora, não será complicado ao Copom justificar a preservação do ritmo de 0,25 ponto. O economista-sênior do Santander, Maurício Molan, lembra que os indicadores de atividade econômica corroboram os argumentos apresentados na última ata para amparar a desaceleração na velocidade de queda do juro básico. Os dados de crescimento do PIB reforçam a visão do BC. "O PIB tem crescido num ritmo anualizado de mais de 3,5% há alguns trimestres. Este ritmo é superior à maioria das estimativas do PIB potencial, o que sugere o fechamento (ou, na melhor das hipóteses, a manutenção) do hiato do produto. A aceleração da produção industrial e a utilização de capacidade (estável, pelo dado da Fiesp, e crescendo, pelo dado da CNI) confirmam a afirmação", diz o economista.