Título: 'Computação verde' começa a ganhar força
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 06/03/2007, Empresas, p. B2

As pessoas, os lugares e tudo o mais que existe dentro do Second Life - um próspero mundo virtual on-line com milhões de residentes -, podem ser imaginários -, mas o consumo de eletricidade dos computadores que mantém essa ilusão é bem real. Nicholas Carr, escritor e autor de um blog especializado em economia recentemente calculou que, como resultado de suas atividades no plano virtual, cada um dos cerca de 15 mil residentes que, em média, ficam conectados ao mesmo tempo no site, consome quase a mesma eletricidade que a média de uma pessoa no Brasil na vida real. Os habitantes do Second Life "não têm corpos, mas deixam pegadas", concluiu Carr.

É apenas um exemplo da crescente preocupação com o consumo de energia e o impacto ambiental dos computadores e, em particular, das salas repletas de aparelhos de grande capacidade usados pelas empresas, conhecidas como centros de dados. Um estudo do Lawrence Berkeley National Laboratory, divulgado no mês passado, revelou que o consumo de energia dos centros de dados dobrou entre 2000 e 2005. Atualmente, isso representa 1,2% do consumo de eletricidade nos Estados Unidos, embora outros cálculos apontem um número ainda maior, de 4%.

As empresas atualmente gastam até 10% de seus orçamentos de tecnologia em energia, segundo Rakesh Kumar, da consultoria Gartner, sendo que apenas metade disso é usada pelo computador em si; grande parte do consumo é para o resfriamento. Outra consultoria, o IDC, estima que o consumo de energia é atualmente uma das cinco maiores preocupações dos administradores de sistemas de computação.

O consumo de energia aumenta em função da ascensão da internet, é claro, mas também pela forma como os computadores, historicamente, vêm sendo projetados: para maximizar o desempenho a qualquer custo. Entre 1996 e 2006, o número de servidores - computadores que distribuem os recursos em uma rede - em funcionamento aumentou de 6 milhões para 28 milhões, segundo Jed Scaramella, do IDC. O consumo médio de cada um cresceu de 150 para 400 watts.

A situação, no entanto, começa a mudar e a indústria da computação foi tomada pelo entusiasmo com a "computação verde". A Dell, uma das maiores fabricantes mundiais de computadores pessoais, recentemente lançou um sistema que permite a seus clientes plantar árvores para compensar as emissões tóxicas resultantes do consumo de seus computadores. A DigiPlex, uma empresa escandinava que administra centros de dados, sustenta que armazenar servidores em suas instalações em Oslo é mais "verde" do que em qualquer outro lugar na Europa, já que a Noruega gera 99% de sua eletricidade em hidrelétricas.

Nesta semana, algumas das principais empresas do setor, como AMD, Dell, Hewlett-Packard, IBM, Intel, Microsoft e Sun, lançaram o consórcio "Grade Verde", dedicado a reduzir o consumo dos centros de dados.

Três soluções em particular poderiam ajudar. A primeira é o processador "multinuclear", no qual o desempenho é aperfeiçoado por meio de vários dispositivos de processamento (núcleos) em cada chip, o que é muito mais eficiente em termos de energia. AMD, Intel e Sun agora informam o "desempenho por watt" de seus chips (por exemplo, o trabalho feito com cada unidade de energia), em vez de simplesmente enfatizar o desempenho bruto. Os chips de núcleo duplo são algo comum atualmente e os de núcleo quádruplo começam a disseminar-se. A mudança de dois para quatro núcleos nos últimos 18 meses melhorou o desempenho por watt em 4,5 vezes, segundo Stephen Smith, da Intel. O consumo médio por servidor poderia estabilizar-se nos próximos anos, destaca Scaramella.

A segunda solução seria usar fontes de energia mais eficientes. Atualmente, os centros de dados realizam várias conversões entre corrente alternada e corrente contínua, o que desperdiça energia e gera calor, aumentando a necessidade de resfriamento. Seria muito mais eficiente alimentar os servidores diretamente de uma fonte central de corrente contínua. O centro de dados Data393, de Denver, no Colorado, tentou essa técnica e diz poder reduzir o consumo em quase 20%. O problema é que não há um padrão único para fontes de energia de corrente contínua, portanto tais economias não podem ser facilmente alcançadas em um centro de dados repleto de equipamentos de diferentes vendedores. O desenvolvimento de um novo padrão de fornecimento de energia é um dos objetivos do novo consórcio.

A terceira solução é o uso mais cuidadoso dos sistemas de resfriamento. A HP, por exemplo, desenvolveu um sistema chamado de Dynamic Smart Colling (resfriamento dinâmico inteligente), que conecta os sensores de temperatura instalados nos servidores ao ar-condicionado, de forma que o ar resfriado seja direcionado a cada servidor em particular quando necessário. Tais sistemas podem reduzir os custos com resfriamento entre 25% e 40%, segundo Paul Perez, da HP. Mais uma vez, no entanto, são necessários padrões para assegurar que os diferentes sensores e sistemas de resfriamento possam "comunicar-se" entre si.

Tudo isso, levará tempo. "Até agora, é tudo conversa", diz Kumar. Os custos com energia continuarão a subir e rivalizarão com os gastos anuais nos próprios aparelhos até 2010, prevê Scaramella. À medida que os administradores fiquem mais desconfortáveis com os custos de energia, ficarão mais interessados em substituir os velhos servidores por novos, com chips de vários núcleos; instalar fontes de energia mais eficientes; e adotar sistemas de resfriamento mais avançados - em outras palavras, em comprar montes de novos equipamentos. Para os vendedores, as contas de eletricidade cada vez mais caras representam uma grande oportunidade.