Título: Deputado mais rico recicla lixo do gabinete em sua empresa
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 05/03/2007, Política, p. A12

O mais rico dos 513 deputados federais desta legislatura - segundo os bens declarados pelos parlamentares à Justiça Eleitoral -, o empresário Camilo Cola (PMDB-ES), 83 anos, determinou aos funcionários do seu gabinete que não joguem fora o papel que for utilizado no dia-a-dia. Se for possível, Cola pretende reciclar em suas empresas o "lixo" do gabinete. "Vou fazer tudo para levar o que for inservível", diz.

Com um patrimônio pessoal declarado à Justiça Eleitoral de R$ 259 milhões, Cola considera bem-vindo o salário mensal de R$ 12,8 mil de deputado. "Vai somar. Costumo dizer que não gasto, só invisto", diz. Para Cola, essa remuneração nem se trata de salário. "Chamo de retribuição para uma pessoa que tem muita responsabilidade e vai fazer o trabalho bem feito", afirma.

Prestes a completar 84 anos de idade, esse filho de imigrantes italianos que já foi lavador de carros, mecânico, lutou na Segunda Guerra Mundial como soldado da Força Expedicionária Brasileira (FEB) e construiu a maior empresa de transporte rodoviário de passageiros do Brasil, a Itapemirim, está vivendo sua primeira experiência parlamentar com entusiasmo e cautela de um calouro.

Pouco mais de um mês depois de tomar posse, Cola não faltou a nenhuma sessão da Câmara dos Deputados. "E nem pretendo faltar", afirma. Ironicamente, a primeira notícia sobre seu mandato registra uma ausência. Foi na eleição para presidente da Câmara, em 1º de fevereiro, quando um mal-estar passageiro (crise de labirintite) o impediu de votar no segundo turno.

Para tentar se "enturmar" no novo ambiente, Cola procura aproximar-se dos colegas, apresentando-se e puxando conversa no plenário e pelos corredores da Câmara. Há poucos dias, abordou o também novato Clodovil Hernandes (PTC-SP).

Conservador e católico fervoroso (tem até uma comenda do Vaticano por ter coordenado a construção de uma casa para um bispo de Cachoeiro do Itapemirim, sua cidade), Cola elogiou o discurso que Clodovil fez em sua estréia e disse que gostaria de ter a mesma tranqüilidade do colega quando chegar sua vez.

Clodovil mostrou surpresa com o gesto do colega. "O que mais me chocou nesses primeiros dias como parlamentar foi a falta de afeto. O gesto do senhor contraria minha impressão inicial. Foi um gesto de afeto", disse. Ao Valor, Camilo Cola elogiou o estilista. "Me impressionou bem", afirmou. Ele aguarda ser sorteado para discursar.

O empresário, o segundo deputado mais velho da atual legislatura - perdendo apenas para Alberto Silva (PMDB-PI), 88 -, faz planos para 2010: "vou disputar uma vaga de senador". Na Câmara, atua para que os parlamentares do Espírito Santo não apresentem emendas individuais ao Orçamento da União, mas apenas de bancada. E está interessado em contribuir para a aprovação de reformas trabalhista e fiscal.

"Precisamos de uma reforma trabalhista, uma legislação mais aberta, que permita ao trabalhador ter mais liberdade para negociar. Na qual o capital esteja muito mais flexível para negociar com a força de trabalho", argumenta. Em relação ao sistema tributário, Cola defende o IVA (Imposto sobre Valor Agregado). "Hoje, todos procuram estar sonegando tudo que podem. Com o IVA, não tem como sonegar", diz.

Cola ainda não apresentou projeto de lei. Quer um levantamento das propostas já em tramitação nas áreas de seu interesse, para evitar repetição. "Tem muita coisa em andamento. Não vou inventar a roda", afirma.

O capixaba diz ter sido convencido pelo senador José Sarney (PMDB-AP) a disputar a Câmara. Sarney teria alegado que uma pessoa com sua representatividade ajudaria a melhorar a imagem do Congresso, desgastado por envolvimento de parlamentares em casos de corrupção. Cola concorda com a necessidade de levar ao Congresso a visão empresarial. "Defendo que os empresários venham para somar. E não ficar aqui tratando de ser despachante de luxo", diz.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também estimulou o empresário a se eleger, segundo ele, em contato que tiveram quando Cola era presidente da Confederação Nacional dos Transportes Terrestres (CNTT).

Embora integre a base governista, Cola critica o excesso de medidas provisórias. "A MP dá poderes exagerados ao presidente. É muito confortável para ele", diz. Fica espantado com o volume de recursos dos quais o presidente dispõe previamente, submetendo à aprovação dos deputados, que, muitas vezes, desconhecem o que estão apreciando. "São bilhões de reais aplicados sem a vigilância necessária", disse.

Cola faz questão de estudar previamente todas as MPs da pauta. Como ex-soldado, ele compara as MPs a "bombas de ação retardada, que caem e você não sabe as consequências".

Hoje, Cola se diz "liderado" por Sarney e participa da campanha para eleger o ex-ministro Nelson Jobim presidente do seu partido. Candidato preferido do Palácio do Planalto, Jobim disputa com o deputado Michel Temer (SP). A eleição será domingo, dia 11, em convenção nacional.

Camilo Cola é fundador de um império hoje composto por 26 empresas, em 12 diferentes atividades e têm um faturamento de R$ 1 bilhão. Cumprindo exigência legal para ser deputado, entregou o comando para administradores profissionais - com quem admite conversar diariamente, de Brasília. Cola diz que dorme bem (se deita às 22h e acorda às 5h) e faz exercício diariamente (alongamento, com personal trainer). "Invisto em mim", afirma, bem-humorado, o pré-candidato ao Senado.