Título: Estados recorrem a bancos para pagar União
Autor: Watanabe , Marta
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2013, Brasil, p. A3

Enquanto o Congresso discute projeto do governo federal, que prevê a troca do indexador da dívida dos Estados com a União, alguns governos estaduais estão adotando uma solução alternativa para esses débitos. Mato Grosso e Santa Catarina obtiveram crédito em instituições financeiras para pagar parte da dívida e Rondônia publica hoje edital para começar a buscar empréstimos com o mesmo fim. Mato Grosso já pediu autorização ao Tesouro Nacional para abater nova fatia da dívida com a União.

Além do dinheiro mais barato, a troca da dívida com a União pelo empréstimo com o setor privado muitas vezes permite um período de carência para amortização, o que dá vantagem adicional para a operação. Com juros menores, uma parte menor da receita corrente líquida fica comprometida com pagamento da dívida.

Os Estados irão usar a folga financeira para investimentos. Com a operação de financiamento, Mato Grosso economizará R$ 600 milhões nos primeiros três anos. Santa Catarina deve deixar de desembolsar R$ 530 milhões no primeiro ano e Rondônia esperar uma vantagem de R$ 180 milhões.

O governo de Rondônia publica hoje edital para buscar financiamento de R$ 1,7 bilhão, destinado a pagar parte da dívida com a União, que soma atualmente R$ 2,1 bilhões. A ideia, segundo o governador Confúcio Moura (PMDB), é trocar as taxas altas pagas à União - IGP-DI mais 6% - por condições melhores. "Hoje, temos desembolso mensal médio de R$ 17 milhões com os juros à União. Se pudermos reduzir isso em R$ 10 milhões a R$ 12 milhões, teremos mais recursos para investimentos."

O governador estima que o prazo de carência para amortização do principal, que costuma ser oferecido em empréstimos por instituições financeiras privadas, também deverá contribuir para dar maior fôlego aos investimentos assim que o empréstimo for liberado. A expectativa é conseguir prazo de carência de dois anos para o início da amortização.

Contabilizando o efeito da carência e da esperada redução de juros, Moura calcula que, nos primeiros 12 meses após a liberação dos recursos, o governo rondonense deixará de desembolsar perto de R$ 184 milhões. A folga financeira será aplicada principalmente em projetos de saúde.

Mato Grosso foi o primeiro Estado a obter financiamento destinado ao pagamento de parte da dívida com a União. Em setembro o governo mato-grossense obteve financiamento de US$ 478,96 milhões no Bank of America. Vivaldo Lopes, atual secretário-adjunto da Fazenda e coordenador da reestruturação da dívida no Estado, diz que o valor foi destinado a pagar integralmente o resíduo da dívida. O resíduo é o acúmulo dos valores que ultrapassaram o teto de comprometimento de desembolso para o pagamento da dívida. No caso de Mato Grosso, o teto é de 15% da receita corrente líquida.

Com o pagamento do resíduo, o desembolso do Estado caiu de 15% para 9% da receita corrente. Além disso, a parcela residual, que antes gerava custo de juros de IGP-DI mais 6% - total de cerca de 14% no ano passado -, agora custa 4,5% mensais, além da variação cambial. "A carência de 24 meses para amortização também gera melhor fluxo de caixa", diz Lopes.

Essas vantagens devem propiciar ao Estado, diz o secretário-adjunto, economia de R$ 600 milhões nos três primeiros anos. Os recursos serão aplicados em investimentos em transportes, programas sociais e habitação.

O governo mato-grossense pretende ampliar a troca da dívida com a União por financiamento privado. Segundo Lopes, o Estado tem R$ 4,3 bilhões em dívidas e pretende abater cerca de R$ 2 bilhões com recursos de novo crédito externo, dessa vez do Credit Suisse. A negociação com o banco já foi feita e o Estado aguarda autorização da Secretaria do Tesouro Nacional. "Acreditamos que até março já tenhamos retorno."

O trâmite para esses financiamentos aos Estados é pedir a aprovação do Tesouro e depois a autorização do Senado. O procedimento é necessário, porque a União entra como garantidora das operações.

O pedido de autorização para o financiamento do banco suíço foi encaminhado ao Tesouro por Mato Grosso em janeiro, quando já tramitava no Congresso o projeto de lei pelo qual o governo federal pode trocar o indexador da dívida dos Estados com a União. O projeto estabelece juros de 4% ao ano, mais a variação da inflação medida pelo IPCA, em vez de IGP-DI mais 6% a 9%. O teto seria a Selic.

"Como o assunto foi proposto como projeto de lei, deve demorar a ser resolvido. Se sair antes, iremos avaliar quais as condições são mais vantajosas para o Estado", diz Lopes. Ele sinaliza, porém, que há ainda preocupação em relação à evolução da Selic. "Hoje, está em 7,25%, mas pode chegar a 9% ou até 12%", diz.

O governo catarinense prefere esperar a discussão em torno do projeto de lei antes de tomar iniciativa de uma segunda operação de crédito, para remover mais um pedaço da dívida com a União. Em dezembro do ano passado, o Estado de Santa Catarina foi autorizado pelo Senado a pegar empréstimo de US$ 726,5 milhões - também com o Bank of America - destinados a quitar o resíduo da dívida do Estado com a União. Em vez de IGP-DI mais 6% para a União sobre esse valor, o Estado passou a pagar ao banco 4% de juros mais variação cambial.

"O Estado antes desembolsava 13% da receita corrente líquida com a dívida. Com a operação, o comprometimento caiu para 7,8%", diz Nelson Serpa, secretário da Casa Civil, que, no ano passado, coordenou a negociação com o Bank of America. A diminuição da fatia comprometida, somada à carência de 24 meses para amortização e à redução dos juros, deve gerar em 2013 uma redução de desembolso de R$ 530 milhões.

O valor, segundo Serpa, deve ser usado como contrapartida do Estado para financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES), em investimentos de infraestrutura, educação e defesa civil, entre outros.

Com a quitação do resíduo, a dívida catarinense, diz Serpa, fica próxima a R$ 7,3 bilhões. A ideia, ao menos inicial, porém, não é buscar novo financiamento para quitar parte desse débito. O secretário considera que a proposta do governo federal para trocar o indexador da dívida pode ser interessante para o Estado, embora demande algumas mudanças. Santa Catarina ainda estuda o assunto, diz Serpa, mas ele acredita a redução do comprometimento da dívida em relação à receita corrente líquida será proposta.