Título: PMDB muda estatuto para reconduzir Temer à presidência
Autor: Costa , Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2013, Política, p. A11

O PMDB deve mudar seu estatuto, na convenção marcada para 2 de março convocada eleger a nova direção partidária. Trata-se de uma mudança sob medida para permitir que o vice-presidente da República, Michel Temer, possa reassumir a presidência do partido, do qual está licenciado. O estatuto proíbe que integrantes da Executiva Nacional acumulem suas funções com cargos nos governo. O senador Valdir Raupp (RO), primeiro vice presidente da sigla, exerce interinamente a direção do partido.

Temer será reeleito sob pressão das bancadas do PMDB, sobretudo dos deputados. Em uma conversa no início da semana, o novo líder na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), fez um relato ao vice-presidente sobre o clima de insatisfação com o governo, com o próprio Temer e com Raupp, considerado um parlamentar inexpressivo e sem representatividade para negociar os interesses do PMDB com a presidente da República e os presidentes dos outros partidos.

A eleição de 2014 e os cargos no governo estão no fundo da insatisfação do PMDB que, a rigor, não é nova, estava reprimida em função da eleição do deputado Henrique Eduardo Alves para presidente da Câmara. O que os pemedebistas agora temem é que a situação se repita em função da manutenção de Michel Temer na chapa da presidente Dilma Rousseff. A expectativa do PMDB era que Temer defendesse os interesses da sigla no governo. Ocorreu o contrário: o vice-presidente passou a defender os interesses do governo no partido.

Nas palavras de um integrante da cúpula do PMDB, "a ampulheta virou, o prazo acabou, a eleição está chegando e o PMDB com ministérios fracos para fazer políticas públicas". O partido já teve Saúde, Integração Nacional e Comunicações, no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Hoje tem a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) e está esvaziado nos ministérios de Minas e Energia e no Turismo. Na Agricultura, o único de seus ministérios com poder de fogo eleitoral, na avaliação dos pemedebistas, o ministro Mendes Ribeiro tem problemas de saúde e a Pasta está sendo efetivamente tocada pelo secretário-executivo. O quinto ministério do PMDB é o da Previdência Social.

"Para continuar assim, é melhor entregar os cargos", disse Eduardo Cunha a Michel Temer na conversa que tiveram no início da semana. O líder da bancada também advertiu o vice-presidente que o resultado da insatisfação dos deputados pode, a qualquer momento, se materializar no painel da Câmara - onde são computados os votos nos projetos.

O partido perdeu cargos ainda na Petrobras e Furnas. O PT tem 17 ministérios contra os cinco do partido, o que é desproporcional, na ótica pemedebista, pois as bancadas dos dois partidos são de tamanho parecido. O PP, que não integrou a chapa de aliança de Dilma, por isso não entrou com seu tempo de televisão no programa eleitoral da presidente, tem o Ministério das Cidades, que em termos eleitorais vale por pelo menos três dos ministérios do PMDB, segundo dirigentes.

A presença do PMDB no painel da Câmara, votando a favor de projetos de interesse do governo, já foi mais rarefeita em 2012. Na realidade, de acordo com um estudo feito pela empresa de consultoria Arko Advice na votação de 137 projetos de interesse do Palácio do Planalto, em 2011 e 2012 o índice de fidelidade do PMDB ao governo caiu de 65,06% para 50,30%, respectivamente. A situação tende a piorar.

Além disso, o PMDB é assediado pelo PT em pelo menos sete Estados importantes para o partido: Rio de Janeiro, onde o senador Lindberg Farias (PT) ameaça desafiar o vice-governador Luiz Fernando Pezão, candidato do governador Sergio Cabral à sucessão, e Minas Gerais, onde a seção local já namora com a candidatura de Aécio Neves a presidente. Em Santa Catarina o partido está dividido em relação ao PT e no Paraná a banda majoritária ficou com o governador Beto Richa, que é do PSDB de Aécio Neves. O PT é o principal adversário ainda na Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul.

Em São Paulo, segundo os pemedebistas, o ministro Aloizio Mercadante (Educação) mantém estreita marcação sobre o deputado Gabriel Chalita, eventual candidato do PMDB ao governo do Estado, numa composição que teria o aval do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O PMDB atribui também a Mercadante o bombardeio para que Chalita não assuma o Ministério da Ciência e Tecnologia com um argumento preconceituoso: não é possível misturar fé (Chalita é católico) e Ciência. O PMDB conta com Chalita para puxar votos e eleger uma boa bancada federal em São Paulo, que já foi o núcleo de poder mais importante da sigla, e em 2010 elegeu apenas um deputado.

Nesse caldo de cultura, nas últimas semanas germinou a ideia de lançamento de um candidato a presidente do PMDB capaz de ter um diálogo mais afirmativo com o governo. O ex-ministro Geddel Vieira Lima chegou a ser procurado por um grupo de deputados que apoiou a eleição de Eduardo Cunha para líder, mas recusou, não só por ser amigo de Michel, como também por não já não haver tempo para viabilizar uma candidatura.

Outra opção dos descontentes era o ex-ministro dos Transportes Eliseu Padilha. Com a dificuldade do tempo, os deputados passaram a discutir a mudança do primeiro-vice Valdir Raupp, atual presidente em exercício.

Os diversos grupos do PMDB consideram que Raupp não tem representatividade suficiente para sentar com o governo e os presidentes dos demais partidos para negociar ministérios e alianças estaduais para 2014, sobretudo nos casos mais delicados como os sete já citados, onde há conflitos entre PMDB e PT. Muito menos para negociar os palanques regionais para a reeleição de Dilma Rousseff. O mais provável, hoje, é que o PMDB faça a aliança nacional e deixe as seções estaduais livres para decidir. Há uma ideia de a convenção aprovar o lançamento de candidaturas próprias em todos os Estados.

Nas conversas entre os dirigentes, desde governadores aos ministros, passando pelos líderes partidários e os presidentes da Câmara e do Senado, chegou-se a conclusão que a troca de Raupp seria abrir um conflito desnecessário com a bancada do Senado - divisão que durante muito tempo enfraqueceu o PMDB nas negociações com o governo.

Dessas conversas saiu a solução da volta de Temer, após sua reeleição na convenção de 2 de março. Nem que para isso fosse preciso mudar o estatuto. Mas será um Michel Temer pressionado a falar mais grosso com o governo do qual faz parte, sob o risco, segundo os deputados, de ficar falando sozinho. O recado foi dado ao vice. O que as bancadas não sabem é se foram ouvidas. Não é por outro motivo que o governo voltou a fazer sondagens sobre a entrega de mais um ministério ao PMDB. Se o Ministério dos Transportes sair para Minas Gerais, é provável que o painel volte a registrar índices mais generosos de votos a favor de Dilma.