Título: O Copom precisa reduzir os juros com mais rapidez
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Fonte: Valor Econômico, 08/05/2007, Opinião, p. A10

O Banco Central intensificou drasticamente as compras de dólares nos mercados à vista e futuros na semana passada. Em três dias, gastou US$ 5,83 bilhões e intervenções dessa magnitude podem tornar-se corriqueiras à medida que o Brasil se aproxima cada vez mais de atingir o grau de investimento. Há uma enxurrada de dólares fluindo por todos os mercados, o que é previsível e tende a persistir enquanto a economia brasileira continuar exibindo boa performance e a economia mundial continuar a exibir uma abundante liquidez.

Em princípio um "bom problema", o ingresso acelerado de dólares coloca a política monetária diante da necessidade de adaptações, se o país quiser sair do imobilismo e da desvalorização contínua do dólar abaixo do patamar de US$ 2 - para onde já teria ido sem as maciças intervenções. Pelo que é possível prever hoje, o fluxo contínuo de divisas não tem um caráter de curto prazo - para isso, a situação da economia mundial, sem grandes turbulências à vista, é vital - e, portanto, exigiria alguma correção de rumos para impedir um contínuo declínio do dólar.

O BC já começou a movimentar mais peças no tabuleiro, trazendo de volta os swaps reversos e convocando leilões sem avisos prévios. Entretanto, se alguma imprevisibilidade foi introduzida no dia-a-dia, não há nenhuma surpresa ao longo do tempo. Dados os sinais de que os juros poderão continuar se movendo para baixo a conta-gotas, o bom estado da economia e do balanço de pagamentos, é um jogo relativamente tranqüilo fazer apostas no aprofundamento da valorização. É o que tem ocorrido, como mostra o crescimento das posições vendidas dos investidores nos mercados futuros. O BC garante as compras, com o atrativo óbvio do maior juro real do mundo.

Os juros precisam cair com mais força, mais rapidamente, não tanto para defender um piso para o dólar - o que o BC não está fazendo - , mas porque a inflação está domada e as expectativas são de que fique bem abaixo da meta para este e para o próximo ano. O reconhecimento de que as importações ajudaram a suplementar a demanda interna em ascensão, feita na última ata do Copom, vai na direção correta e permite decisões menos conservadoras na política monetária.

Esta certamente não será uma saída definitiva para a valorização cambial. Muito provavelmente a taxa de câmbio não irá subir significativamente, mas um dos motivos para o mergulho do dólar deixará de existir, sem que os outros objetivos da política monetária parem de ser perseguidos. Sem derrubar o diferencial de juros que permite lucrativas arbitragens, todos os demais expedientes de atuação para minorar a valorização são caros e menos eficientes. Ao comprar dólares no mercado futuro, o BC começou a elevar a parcela da dívida pública atrelada à taxa Selic, ao custo que se conhece. A esterilização da enxurrada de dólares também é remunerada por juros polpudos, enquanto que as reservas internacionais recebem a rentabilidade baixa da qual os investidores tentam fugir. Ao mesmo tempo, cresce também a parcela da dívida pública em mãos de investidores externos, atrás de rentabilidade garantida e praticamente à prova de calotes.

No que compete ao BC, estancar a valorização depende de um corte maior dos juros na próxima reunião do Copom. A sinalização do viés de baixa auxiliaria na tarefa de demonstrar a convicção do BC de que é possível, sem abalar em nada o sistema de metas de inflação, apressar a redução da taxa básica de juros. Um corte maior que os 0,5 ponto percentual seria factível, mas seria uma guinada inimaginável (e improvável) na atuação ortodoxa da diretoria do BC.

Outros instrumentos poderiam ajudar o BC a combater a valorização cambial. Uma redução gradual e geral dos tributos talvez tivesse mais efeitos sobre a competitividade e os empregos em toda a economia e, por tabela, nos setores que mais sofrem a concorrência dos importados baratos. Para isso seria preciso que os gastos públicos parassem de crescer em termos reais e que o governo compensasse a redução de impostos melhorando a gestão de recursos. O crescimento da economia permite a redução da carga tributária sem grande pancada nas receitas do Estado, e viria em boa hora.