Título: Brasil rejeita criação de fundo para a África
Autor: Exman, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 22/02/2013, Brasil, p. A4

A presidente Dilma Rousseff participa hoje da terceira reunião de cúpula América do Sul-África (ASA), em Malabo, Guiné Equatorial, com o objetivo de fortalecer a coordenação política e as parcerias comerciais entre os países das duas regiões. A missão de Dilma, entretanto, ocorre num momento em que os países sul-americanos, excluindo o próprio Brasil e a Venezuela, demonstram pouco interesse em estreitar suas relações com a África. Os africanos, por sua vez, reafirmam o interesse em garantir um maior poder de fogo institucional e financeiro à ASA. Mesmo assim, coube ontem ao chanceler Antonio Patriota reduzir as expectativas dos governos africanos.

Em seu discurso na abertura da reunião ministerial do encontro, Patriota destacou que o Brasil se oferece para contribuir com o desenvolvimento sustentável da África. Mas verbalizou a discordância do governo brasileiro com o pleito africano pela criação de um fundo financeiro pelos países do grupo.

"Como governo, temos limitações financeiras, razão pela qual nos interessa explorar fontes de financiamento novas. Desenvolvemos projetos de cooperação em arranjos trilaterais, com financiamento de terceiros países", discursou o ministro das Relações Exteriores. "Estou convencido de que devemos investir nossos tempo e esforços na elaboração de bons projetos que possam ser executados por estruturas de cooperação já existentes. Para bons projetos não faltarão recursos. Parece-me um caminho muito mais promissor do que o da criação de novas e complexas estruturas."

Patriota lembrou que ambas as regiões buscam erradicar a pobreza, aumentar a segurança pública, elevar a competitividade de suas economias e distribuir renda. "Num mundo em que as relações de poder entre o mundo desenvolvido e o em desenvolvimento vêm sofrendo transformações importantes, América do Sul e África despontam como regiões de renovado dinamismo e perspectivas promissoras de desenvolvimento", destacou o ministro.

De fato, o comércio entre o Brasil e a África tem crescido nos últimos anos, desde que o governo Luiz Inácio Lula da Silva decidiu diversificar os parceiros comerciais do país. Entre 2003 e 2012, as exportações brasileiras para a África cresceram de US$ 2,9 bilhões para US$ 12,2 bilhões. Já as importações brasileiras do continente africano subiram de US$ 3,3 bilhões para US$ 14,3 bilhões.

"A África assume a condição de principal região fornecedora de petróleo do Brasil, e o destaque eu daria para adubos e fertilizantes. O contínuo aumento da safra agrícola no Brasil demanda volumes crescentes de insumos para manter a produtividade elevada. A África tem se posicionado inclusive como um mercado alternativo dos fornecedores tradicionais desses insumos agrícolas, que é a Europa Oriental", explicou ao Valor antes da cúpula a secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Tatiana Prazeres.

Diversos países da região, que ainda enfrentam sérios gargalos de infraestrutura, têm obtido volumosas quantias de dinheiro com a exploração de petróleo e outros recursos naturais. Por isso, na avaliação do governo brasileiro, há oportunidades para todos os setores produtivos nacionais, desde os exportadores de alimentos até para as indústrias de produtos de maior valor agregado.

A própria Guiné Equatorial é um exemplo. Impulsionado pela exploração de petróleo, o país conta com modernas rodovias e luxuosos palacianos. Em Malabo, por exemplo, a primeira-dama do presidente Teodoro Obiang Nguema Mbasogo conta com os serviços de churrasqueiros contratados diretamente do Brasil, num contraste às péssimas condições de vida de grande parte da população.

O presidente da Guiné Equatorial está no poder desde 1979. Mas, quando perguntadas se isso não causa um desconforto ao governo, autoridades brasileiras dizem que foi a União Africana quem definiu a sede da cúpula e reafirmam o discurso da presidente Dilma Rousseff segundo o qual todos os países precisam avançar nas questões relacionadas aos direitos humanos - inclusive o Brasil.

Ontem, o chefe da Divisão de Infraestrutura do Banco de Desenvolvimento Africano, Ralph Olayé, informou que a instituição se prepara para realizar um "roadshow" no Brasil a fim de apresentar as oportunidades de investimento em infraestrutura no continente. A iniciativa está prevista para ocorrer no fim deste ano ou no início de 2014, e levará ao empresariado brasileiro um cardápio de obras que demandarão investimentos de US$ 360 bilhões até 2040.