Título: Ausência de regra clara faz STF definir caso a caso
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 07/05/2007, Brasil, p. A4

A onda de greves no setor público irritou o governo e levou o Supremo Tribunal Federal (STF) a tomar uma decisão audaciosa, modificando a sua própria jurisprudência no sentido de restringir as paralisações.

Os ministros consideraram como "abusivas" as recentes mobilizações grevistas no setor público e decidiram que, na falta de regulamentação do Congresso, caberá ao próprio tribunal definir as regras que serão aplicadas a cada caso concreto de greve no funcionalismo. E essas regras serão aplicadas tendo como base a lei de greve utilizada para o setor privado - a Lei 7.783 que restringe as paralisações a procedimentos específicos, como a realização de assembléias, e estabelece a não interrupção dos serviços considerados essenciais.

O governo está utilizando a decisão do STF como diretriz para o projeto de lei que será enviado ao Congresso regulamentando a greve no serviço público. Daí, as medidas criando ritos para as greves (realização de assembléias e "aviso prévio" às autoridades) e impedindo a interrupção dos serviços (com a contratação de temporários).

A decisão do STF foi tomada no julgamento de dois mandados de injunção em que sindicatos do Espírito Santo e do Pará pediram a regulamentação do direito de greve. O mandado de injunção é uma ação proposta para exigir a regulamentação imediata de norma prevista na Constituição. Como o Congresso está desde 1988 para votar o assunto e não chegou a nenhuma conclusão, os sindicatos pediram ao Supremo para indicar qual lei deve ser aplicada.

O STF tradicionalmente entendia que os servidores públicos não podem fazer greves e que seu ponto deveria ser cortado. Mas as categorias conseguiam liminares em outras instâncias da Justiça e, com base nessas decisões, partiam para negociar com o governo. Agora, o Supremo deu um passo adiante para evitar este tipo de situação. Pela decisão de 12 de abril, basta que os prejudicados com a greve recorram ao tribunal que ele irá determinar a aplicação da Lei 7.783 para regulamentar o movimento grevista. Com isso, o governo ganhou um forte aliado para negociar com os grevistas.

O STF também alterou o seu entendimento ao julgar mandados de injunção. Historicamente, o tribunal sempre notificava o Congresso para que este regulamentasse assuntos pendentes de legislação. Mas, no caso das greves dos servidores, os ministros se mostraram tão indignados que disseram que eles mesmos irão indicar a lei a ser aplicada para cada caso concreto.

A decisão foi tomada sob o impacto da paralisação dos controladores de vôo e gerou críticas ácidas dos ministros. O vice-presidente do STF, ministro Gilmar Mendes declarou que as greves no setor público se realizam "sem qualquer controle jurídico, dando ensejo a negociações heterodoxas". "A questão está submetida a um tipo de lei da selva", concluiu.