Título: Greve de servidor pode ter contratação de temporários
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 07/05/2007, Brasil, p. A4

O governo quer estipular procedimentos rígidos para as greves e, com isso, evitar a onda de paralisações que atingiu o setor público nos últimos meses. No projeto de lei que será enviado ao Congresso Nacional para regulamentar as greves de servidores, existem quatro medidas que o governo entende como necessárias para inibir futuras interrupções no serviço público. E o projeto considera que todo o serviço público é essencial, não fazendo distinção entre eles.

A primeira é a garantia de manutenção dos serviços. O projeto deve fixar um quórum pré-determinado de servidores que deverão permanecer na ativa sempre que houver uma mobilização grevista. Com isso, o governo quer evitar interrupções, como a dos controladores de vôo - responsáveis por sucessivos atrasos e cancelamentos de vôos - e que levaram a um desgaste na imagem do governo.

A segunda medida estabelece a necessidade de as autoridades serem avisadas com antecedência dos movimentos grevistas. O objetivo deste "aviso-prévio" é formalizar um canal de comunicação entre os grevistas e a autoridade pública responsável hierarquicamente pelo comando dos serviços. O "aviso-prévio" da greve será informado pela categoria diretamente ao superior hierárquico. Por exemplo, se os servidores do Banco Central resolverem entrar em greve - como estão, desde a semana passada -, terão de avisar, antes, ao presidente da instituição. Com essa medida, o governo entende que conseguirá reduzir a politização dos movimentos. Será aberto um canal institucional de comunicação, o que facilitará as negociações, explicou um assessor do presidente Lula, envolvido na redação do projeto.

A terceira medida é a realização de assembléia para formalizar a convocação de greve no setor público. Com a obrigatoriedade de realização de assembléia, o governo pretende criar um rito burocrático para a formalização das greves, como acontece no setor privado. O projeto deverá estabelecer um quórum mínimo para a realização das assembléias. Caso não sejam realizadas, a greve será considerada ilegal.

E a quarta medida do projeto é a previsão de contratação temporária de servidores para suprir a falta dos grevistas. A justificativa desta medida é a necessidade de garantir a manutenção de serviços à população. O projeto estabelece que todo serviço público é essencial e não pode ser interrompido. Por isso, além de prever que um mínimo de servidores deve continuar trabalhando - mesmo com a realização de greve em sua categoria -, o governo quer estabelecer a possibilidade de contratação temporária para garantir que não haverá, em nenhuma hipótese, a interrupção dos serviços à população.

Aos servidores, o governo deverá garantir, no projeto de lei, a livre adesão às greves. Neste sentido, o projeto irá estabelecer que o Estado não pode constranger os servidores a não aderir às paralisações, seja por meio de cartazes, ofícios ou outros meios capazes de desencorajar os grevistas. O problema das greves dos servidores públicos militares não será colocado no projeto, pois os assessores do presidente Lula entendem que a Constituição veda o direito de greve para essa categoria.

Outras questões, como o corte do ponto dos servidores (tirar os salários pelos dias não trabalhados) ainda estão em debate dentro do governo. Por enquanto, discutiu-se apenas as linhas gerais do projeto e foram definidas essas quatro diretrizes sobre como o governo pretende regulamentar o direito de greve no serviço público.

O governo discute ainda formalizar o Ministério Público como mediador de conflitos. Assim, sempre que um órgão federal entrar em greve, o Ministério Público Federal seria convocado para acompanhar as negociações. Se for um órgão ligado a um dos 27 estados, ou ao Distrito Federal, o MP local seria chamado para figurar como mediador. A participação do MP também seria uma forma de criar um rito para as greves, evitando a excessiva politização destes movimentos junto ao governo.

As centrais sindicais pediram ao presidente Lula para incluir a possibilidade de acordo coletivo nas greves do setor público. O presidente vive um momento de aproximação com as centrais e respondeu positivamente quanto a essa possibilidade. Mas, assessores do Palácio do Planalto o aconselharam a transferir os acordos coletivos para o Judiciário. Com isso, as negociações com o serviço público sairiam "do colo" do presidente, explicou um assessor.

A possibilidade de acordo coletivo também aumentaria a politização dos movimentos grevistas no setor público. O presidente poderia ser chamado pessoalmente a negociar. Este motivo levou assessores de Lula a proporem como solução a assinatura destes acordos na Justiça. Assim, o Judiciário - e não o governo - seria o árbitro junto aos grevistas.

Essa questão do acordo coletivo ainda está em discussão dentro do governo. Mas, o objetivo geral do projeto já foi definido: criar uma regulamentação às greves no serviço público, estabelecendo ritos para as paralisações e formas de negociações. Neste sentido, o projeto vai na linha do que decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), em 12 de abril passado. Os ministros do STF mandaram aplicar no setor público as mesmas regras para as greves no setor privado. Essas regras, previstas na Lei nº 7.783, de 1989, restringem as paralisações a ritos formais.

A lei do setor privado prevê a realização de assembléia e regulamenta as formas de negociação. A lei permite ainda a contratação de funcionários para suprir a atividade dos grevistas. E ressalta que os grevistas deverão se organizar para manter a prestação dos serviços de modo a não causar "danos irreparáveis" às empresas.

A lei do setor privado destaca ainda que as greves não podem afetar o "atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade". O parágrafo único do artigo 11 define o que são "necessidades inadiáveis da comunidade": "aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população".

Na lista das atividades essenciais aparecem os seguintes serviços: controle de tráfego aéreo, tratamento e abastecimento de água, produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis, assistência médica e hospitalar, distribuição e comercialização de alimentos e medicamentos, funerários, transporte coletivo, captação e tratamento de esgoto e lixo, telecomunicações, compensação bancária, guarda, uso e controle de substâncias radioativas e processamento de dados ligados a serviços essenciais.