Título: Facção criminosa cobra US$ 2 mil para liberar integrante
Autor: Di Cunto, Raphael
Fonte: Valor Econômico, 22/02/2013, Especial, p. A14

"Através da nossa união o crime terá maior força em SC, sempre criando boas oportunidades para nossos irmãos", diz o estatuto do Primeiro Grupo Catarinense (PGC), facção que surgiu há quase dez anos na Penitenciária de São Pedro de Alcântara, cidade a 35 quilômetros de Florianópolis, mas que só ganhou repercussão na mídia agora, ao dar a ordem para os atentados a ônibus e postos policiais de dentro dos presídios.

Por muito tempo os órgãos oficiais de Santa Catarina resistiram em admitir a existência da facção. Em determinados momentos, até ignoraram ou subestimaram o grupo, o que ajudou a fortalecer a organização. Líderes do grupo costumavam causar problemas para serem transferidos de prisão, com o objetivo de formar novas células em outros presídios - alguns chegaram a passar por 20 unidades antes que medidas fossem tomadas para isolá-los.

Hoje, os órgãos de inteligência do Estado atribuem ao traficante Nelson de Lima, o "70", a fundação do PGC. Depois de cumprir pena em uma penitenciária de segurança máxima, Lima foi transferido para São Pedro de Alcântara e, em 3 de março de 2003, fundou o "Grupo", em resposta às tentativas do paulista Primeiro Comando da Capital (PCC) de "batizar" detentos em Santa Catarina.

No início, os líderes do grupo eram, além de Lima, "Chico Medalha" e "Sagin", que não participam mais do grupo, seja porque morreram ou porque brigaram com líderes em ascensão do grupo e foram jurados de morte.

Apesar da rivalidade com o PCC, estudiosos da organização acreditam que, em algum momento, as facções tenham atuado em conjunto e trocado informações. O estatuto do PGC tem claras inspirações no grupo paulista, como as palavras de ordem: liberdade, respeito, paz, lealdade, humildade, justiça e união.

Primeiro a tratar do tema em um livro ("A Teia do Crime Organizado", da Editora Conceito, publicado em 2011), o capitão da Polícia Militar José Schelavin descobriu, com relatos de um ex-detento que deixou o grupo, o minucioso conjunto de regras que regem a organização. O PGC oferece a contratação de advogados para os detentos com condenações pequenas e que não tem dinheiro.

Durante o período da prisão, esses detentos têm que pagar um valor mensal - como maços de cigarros ou ajudar na entrada de celulares, por exemplo. Ao ser libertado, o ex-presidiário terá que participar de operações criminosas indicadas pela facção, como assassinatos, roubos ou tráfico. Os que não quiserem têm que, no mínimo, pagar uma quantia mensal à organização, ou ficam jurados de morte. Para sair do grupo, relata Schelavin, o ex-detento tem que pagar US$ 2 mil.

Para Schelavin, é difícil falar do tamanho da facção, mas 20% ou mais dos presos na região Oeste de Santa Catarina estão ligados ao PGC. "Muito se dizem filiados para receber algum benefício e fazem trabalhos menores, como colaborar para a entrada de um telefone no presídio, trazer cigarros, mas não têm ligação real", afirma.

O promotor Alexandre Graziotin, do Ministério Público de Santa Catarina, também diz que o Estado ainda não tem condições de precisar o tamanho da facção, mas que, em tese, dois terços dos detentos (de um total de 17 mil) estão ligados a alguma organização dentro dos presídios com forma de sobrevivência. E destas, em Santa Catarina o PGC é o maior.