Título: Ibama faz mais exigências para liberar Madeira
Autor: Zanatta, Mauro
Fonte: Valor Econômico, 04/05/2007, Brasil, p. A3

O consórcio formado pela estatal Furnas Centrais Elétricas e a construtora Odebrecht para estudar a construção de um complexo hidrelétrico de 6,5 mil megawatts no rio Madeira, em Rondônia, terá que responder a pelo menos 40 questões específicas sobre os prognósticos dos efeitos e impactos que os sedimentos fluviais podem causar nas usinas de Jirau e de Santo Antonio, além de suas implicações ao meio ambiente.

O consórcio também precisará esclarecer outras 24 perguntas sobre a chamada ictiofauna (peixes) presente na bacia hidrográfica do Madeira e mais seis questões acerca de eventuais impactos que a obra poderia provocar, na reativação do mercúrio usado em antigos garimpos, sobre os peixes e a saúde de moradores da região.

Em três memorandos enviados ontem ao consórcio, e obtidos pelo Valor, os técnicos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) exigem a contratação de "especialistas de notório saber, com conhecimento e experiência comprovadas" nos assuntos e temas levantados. As informações adicionais servirão para "complementar" o processo de licenciamento feito pela autarquia. As novas questões atendem a uma determinação da direção do Ibama para a realização de uma nova rodada de perguntas ao consórcio.

Contrariada com a tentativa dos técnicos de "zerar o jogo" do complexo licenciamento, a direção do Ibama rechaçou as conclusões de um parecer de 221 páginas assinado por oito biólogos, engenheiros e ecólogos. Eles haviam recomendado, ao mesmo tempo, a "reelaboração" dos estudos de impacto ambiental e a realização de um "novo" estudo "mais abrangente" - no Brasil e em "territórios transfonteiriços" -, inclusive com a convocação de "novas audiências públicas", além das quatro já realizadas ao longo do processo.

Para responder às novas indagações dos técnicos da Diretoria de Licenciamento Ambiental do Ibama sobre os sedimentos do Madeira e seus afluentes, por exemplo, o perito do consórcio precisará atender a aspectos físicos, biológicos e sócio-econômicos para esclarecer os impactos à montante (antes) e à jusante (depois) da área de influência das usinas, os reservatórios e as alternativas tecnológicas e locacionais.

Será preciso também elucidar questões como as "erosões das margens" dos rios, a "dinâmica do uso dos solos" na bacia dos rios Beni, Madre de Dios e Abunã e os efeitos da alteração da cobertura vegetal, e a "tendência e a capacidade limite" da região em receber e exportar sedimentos. O profissional terá, ainda, que estudar a "abrangência da inundação" gerada pelos reservatórios das usinas e a influência do assoreamento do rio sobre o remanso provocado pelas barragens.

No caso dos peixes, o perito precisa ser especializado na ictiofauna do rio Madeira e seus afluentes para responder sobre os mecanismos de garantia para a subida dos bagres rio acima pela usina. "A preocupação com a imprevisibilidade dos impactos sobre a ictiofauna é salientada devido a sua grande riqueza e à necessidade de entendimento da representatividade dessas espécies em termos locais, regional e global", afirmam os técnicos. "De acordo com o EIA, transpor populações adultas para garantir eventos reprodutivos à montante dos empreendimentos não garante o sucesso na descida de ovos, larvas, jovens e adultos para repovoar (e garantir a variabilidade genética) as áreas a jusante do eixo Solimões-Amazonas".

Para garantir respostas às questões sobre a reativação do mercúrio pela ação das usinas nos remansos e no fundo do rio, o Ibama sugere que o consórcio terá que contratar estudos de "hidrobiogeoquímica" do metal nas águas do rio Madeira e afluentes, "especialmente" para elaborar "prognósticos e medidas de prevenção e gestão do processo de metilação".

"O EIA enfatiza que os fenômenos de transformação química e a biodisponibilidade do mercúrio já ocorrem na bacia do Rio Madeira. Por ser um poluente conservativo, não se pode ignorar as centenas de toneladas lançadas no passado, que podem estar 'adormecidas' em depósitos difusos na calha do rio Madeira e afluentes, além do incremento atual", diz o questionário.