Título: Salário sobe o dobro no país
Autor: Cristino, Vânia; Bonfanti, Cristiane
Fonte: Correio Braziliense, 16/12/2010, Economia, p. 20

Enquanto a crise reduziu à metade a correção dos rendimentos no mundo, no Brasil não houve alteração no ritmo dos vencimentos A crise econômica internacional reduziu à metade o crescimento dos salários em todo o mundo nos últimos dois anos. Em 2007, antes do abalo provocado pelo estouro da bolha imobiliária dos Estados Unidos, o ritmo de reajuste das remunerações aumentava a 2,8% acima da inflação. Em 2008, o índice caiu para 1,5% e, no ano passado, ficou em 1,6%. Enquanto isso, no Brasil, o movimento de alta nos rendimentos dos trabalhadores manteve-se expressivo, com taxa média de 3,4% em 2008 e de 3,3% em 2009, o dobro da média verificada nos outros países. ¿Os efeitos da crise foram muito breves no Brasil. Além disso, o país contou com uma política de elevação do salário mínimo que ajudou bastante¿, afirmou a especialista em emprego da Organização Internacional do Trabalho (OIT) Janine Berg.

Os dados constam do Relatório Mundial sobre Salários, divulgado ontem pela OIT. A pesquisa analisou dados de 115 países e avaliou a situação de 94% de um total de 1,4 bilhão de assalariados no mundo. Quando a China é excluída do levantamento, o declínio do aumento real em todas as economias estudadas fica ainda mais visível. De 2,2% em 2007 para 0,7% em 2009. ¿Na China, os dados estatísticos oficiais só cobrem as unidades urbanas vinculadas ao Estado. Temos informações de que o crescimento do salário nas empresas privadas não foi tão positivo¿, explicou Janine. Na pesquisa, a OIT constatou que as taxas de crescimento salarial, além de desacelerarem em praticamente todos os países, foram negativas em mais de um quarto deles em 2008 e em um quinto da mostra em 2009.

Janine destacou que, apesar dos dados negativos, 50% dos países estão ajustando os salários mínimos. Em alguns casos, a medida é parte dos processos regulares de revisão dos valores. Em outros, o objetivo é proteger o poder aquisitivo dos trabalhadores vulneráveis. ¿Isso representa uma mudança em relação a crises anteriores, nos quais o congelamento dos vencimentos era a norma, e contribui para a saída da recessão¿, observou.

Nos países desenvolvidos, o relatório revela que, depois do crescimento de cerca de 0,8% ao ano antes da crise, os salários reais caíram 0,5% em 2008 e voltaram a crescer 0,6% em 2009. Para a América Latina e o Caribe, as estimativas são de que o crescimento salarial real diminuiu de 3,3% em 2007 para 1,9% em 2008, voltando a subir um pouco em 2009, para 2,2%.

Segundo dados da OIT, no Brasil, 21,5% dos 15,3 milhões de trabalhadores assalariados das seis regiões metropolitanas são considerados de baixa renda. Na prática, isso significa que eles ganham menos de R$ 465 por mês. Por trás desses dados, está uma realidade perversa, na qual as minorias étnicas e sociais ainda são excluídas do mercado. ¿Esse grupo de baixa renda é representado, principalmente, por mulheres, negros, jovens e pessoas com baixo nível de escolaridade¿, pontuou Janine.

Outro problema revelado pelo estudo é que existe pouca mobilidade entre os empregados que ganham menos de R$ 465. No período de 2002 a 2009, 44,2% mantiveram sua situação de empregado de baixa renda, 18,3% caíram no desemprego ou saíram do mercado de trabalho e 37,5% passaram a obter salários mais favoráveis. ¿O que assusta é o número dos que saíram do mercado. Na China, esse índice chega a 5,9%. Na Holanda e na Inglaterra, a 14% e 15%, respectivamente¿, ressaltou a especialista da OIT.

QUALIDADE O diretor-geral da Organizacão Internacional do Trabalho (OIT) exortou os países a criarem empregos de qualidade como requisito fundamental para fazer frente à recuperação econômica ¿ ainda incerta para a América Latina e o Caribe, assim como para o resto do mundo. ¿A qualidade do trabalho define a qualidade de uma sociedade¿, disse Juan Somavia, na 17ª Reunião Regional Americana da OIT.

Desigualdade aumenta em 17 nações

A crise econômica mundial aprofundou a diferença entre os trabalhadores com baixas remunerações e os que estão no topo da pirâmide salarial. Essta é apenas uma das conclusões a que se pode chegar tendo por base o Informe Mundial sobre Salários, divulgado ontem pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). De um total de 30 países pesquisados ¿ entre eles o Brasil ¿, 17 apresentaram aumento da distância entre os 10% dos empregados que ganham menos e os 10% que ganham mais.

Na lista dos países que sofreram com o aumento da desigualdade salarial estão a Bélgica, o Canadá, o Reino Unido e os Estados Unidos, além da Austrália, Noruega, Suíça e Dinamarca. Na América Latina, ficaram na mesma situação a Argentina e o Uruguai. O Brasil, juntamente com a Venezuela, Equador, México, Paraguai, Panamá, Costa Rica , Peru e Portugal seguiram na direção contrária. Nessas nações, não houve aumento da desigualdade salarial. A OIT define como salários baixos os recebidos por trabalhadores cuja remuneração, por hora, é inferior a dois terços da média salarial de todos os empregos.

Outro dado divulgado ontem pela OIT revelou que a América Latina está bem na foto. Pelo menos se a comparação for feita com os Estados Unidos e a Europa em termos de emprego. A região sofreu menos com a crise e, depois de uma depressão entre o segundo semestre de 2008 e o primeiro semestre de 2009, passou a apresentar sinais concretos de recuperação, com crescimento econômico e queda na taxa de desemprego. Os desafios para o futuro, no entanto, com menor crescimento , preocupam OIT, que realiza no Chile a 17ª Reunião Regional Americana sobre o tema. ¿ A situação é de incerteza no futuro¿, reconheceu o diretor-geral da OIT, Juan Somavia.

Pelos dados da Organização, o crescimento na América Latina e Caribe deve ficar em torno de 6% neste ano, caindo para algo em torno de 4% em 2011. Somavia lembrou que a retração econômica em 2009 resultou em aumento do desemprego. No ano passado, a taxa de desocupação no continente chegou a 8,6%, baixando para 7,9%no primeiro semestre de 2010. Para o segundo semestre do ano, a OIT espera que a taxa de desemprego caia ainda mais, regressando aos patamares pré-crise, em torno de 7,3%. (VC)