Título: Governo apela a mais armas contra inflação de alimentos
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 26/02/2013, Opinião, p. A18

O governo está disposto a combater a inflação dos alimentos, que vem subindo 10% ao ano, em média, nos últimos cinco anos, e não dá sinal de trégua, na esteira da valorização das commodities e de problemas climáticos.

O IPCA-15, prévia da inflação oficial, ficou em 0,68% em fevereiro e acumula 6,18% em 12 meses. A queda do preço da energia elétrica, que despencou 13,45% com a redução de impostos patrocinada pelo governo, contribuiu para diminuir a inflação, mas teve seu impacto parcialmente neutralizado pela elevação de 1,74% dos alimentos. As altas foram disseminadas, com destaque para tubérculos, legumes, aves, ovos; farinha e massas.

Várias alternativas estão sendo cogitadas pelo governo para conter os preços dos alimentos. Todas elas envolvem certa dose de interferência na economia.

Uma delas é a desoneração da cesta básica de alimentos. A própria presidente Dilma Rousseff prometeu desonerar a cesta básica, em visita que fez ao Paraná, no início do mês. A promessa envolve a retirada do PIS e da Cofins que incidem sobre a cesta, que inclui carne, leite, feijão, arroz, farinha, batata, tomate, pão, café, banana, óleo e manteiga, além do açúcar, também tributado pelo IPI.

De acordo com cálculos feitos por consultorias, a desoneração da cesta básica pode reduzir a inflação em até 0,4 ponto. Se os Estados colaborarem e fizerem o mesmo com o ICMS, cuja alíquota sobre alimentos varia de 7% a 10%, a inflação cairá mais.

Para a desoneração da cesta básica ir adiante, porém, é preciso que o Congresso aprove o orçamento deste ano, o que ainda não ocorreu apesar de estarmos na última semana de fevereiro. O projeto significará para o governo abrir mão de cerca de R$ 10 bilhões e, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, isso deve ser compensado pelo aumento de outra receita, que o governo espera obter com concessões de serviços públicos e dividendos de estatais.

Em outra vertente, o governo planeja influenciar os preços dos alimentos com o uso de estoques. Com o objetivo de definir as condições para aquisição e liberação de estoques públicos de alimentos, o governo criou recentemente, por decreto, o Conselho Interministerial de Estoques Públicos de Alimentos (Ciep). O conselho deverá definir os produtos e as quantidades que deverão constar nos estoques estratégicos do governo assim como as condições de aquisição e liberação.

Várias dessas tarefas eram, até agora, de responsabilidade da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), cuja atuação, no entanto, teria desagradado ao governo. No início do mês, o governo queria vender estoques públicos de grãos para conter a inflação dos alimentos, mas descobriu que não havia produto suficiente para levar adiante a estratégia, apesar das safras recordes brasileiras. Além disso, a Conab só pode adquirir produtos no mercado quando as cotações estão mais baixas do que as fixadas pela Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM). Para aquisições acima desse valor, é necessária autorização por Medida Provisória (MP).

A carência de estoques não seria culpa apenas dos preços altos. Na avaliação da Presidência da República, registrada no Valor em 6/2, o Ministério da Agricultura não agiu no momento adequado em vários casos de aquisições como as do milho e feijão, e de vendas, no caso do arroz.

Além de criar o Ciep, o governo também quer mudar as regras de formação e atuação dos estoques reguladores. O governo avalia a volta do chamado preço de liberação de estoques, mecanismo de venda direta de alimentos acionado em casos de elevação súbita, instrumento usado de 1966 a 1996 e, desde então abandonado.

Outro mecanismo em estudo é a recriação de uma banda de preços para intervenção direta do governo no mercado. A banda variável teria como referência os preços mínimos de garantia fixados pelo governo. Se o preço de um produto passar do teto ou ficar abaixo da banda, a Conab compraria ou venderia automaticamente esses alimentos, sobretudo os da cesta básica. A banda tornaria mais flexível a ação do governo.

Essas ferramentas, abandonadas há décadas, vão dar muito mais poder de fogo para o governo interferir nos preços de mercado dos alimentos, mas devem ser manejadas com cuidado. No passado, essa interferência nem sempre trouxe resultados e mostrou não resolver todos os problemas. Não há como fazer estoque regulador de todo alimento, como o tomate, por exemplo, que vem disparando nos últimos meses.