Título: Brasil passou por situação parecida
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 28/02/2013, Internacional, p. A17

O Brasil também foi alvo da ação de um fundo credor especializado em judicializar ativos. Em 1994, a família Dart, de industriais, havia adquirido US$ 1,3 bilhão de dólares em títulos da dívida brasileira e se recusou a participar do acordo de reestruturação patrocinado pelo então presidente do Banco Central, Pedro Malan, em abril daquele ano.

Pelo acordo, o Brasil rolou por 30 anos uma dívida de US$ 52 bilhões com 750 credores, com descontos sobre o valor nominal e direito de usar os papéis em privatizações. Em 29 de junho daquele ano, véspera do lançamento do Plano Real, a família Dart entrou na Justiça de Nova York pedindo o pagamento do valor nominal.

Para se precaver contra pedidos de arresto, Malan decidiu manter as reservas internacionais sob custódia do Banco de Compensações Internacionais (BIS) em Basileia, Suíça, mesmo com remuneração menor, e orientou o Banco do Brasil a não entrar na reestruturação.

Pelas regras da dívida brasileira de então, um credor só podia pedir o pagamento do valor nominal se essa fosse a vontade dos credores da maioria da dívida não renegociada. Sem os títulos em poder do Banco do Brasil, a família Dart ficava em minoria. Ainda assim, a pendência deixou a reestruturação brasileira "sub judice". Da mesma forma como ocorre agora com a Argentina, o governo americano de então apresentou-se na corte como parte interessada para defender a posição brasileira.

Em março de 1996, o Banco Central fez um acordo com a família Dart, que concordou em receber até 2007, contra o pagamento dos juros atrasados. Sete meses depois, a família revendeu seus papéis no mercado secundário por US$ 1,288 bilhão.

A família Dart, que fez fortuna desenvolvendo embalagens de poliestireno para bebidas quentes, atuou em diversos outros processos de dívida soberana. O último aconteceu em maio de 2012. Em um de seus atos finais à frente do governo grego, o então primeiro-ministro Lucas Papademos pagou pelo valor nominal títulos da família que valiam € 436 milhões. Os Dart haviam comprado os títulos e ameaçavam inviabilizar judicialmente a reestruturação da dívida da Grécia.