Título: Brasil ainda não tem plano para gás em caso de escassez
Autor: Schüffner, Cláudia
Fonte: Valor Econômico, 10/05/2007, Brasil, p. A3

O Brasil ainda não tem um plano de contingenciamento do gás natural que possa ser utilizado em caso de escassez, seja por problemas de suprimento ou por acidente. Um dos pontos de maior divergência é a priorização do gás para termelétricas, do qual o governo não abre mão, mas que os grandes consumidores não admitem.

Um grupo de trabalho composto por órgãos do governo, entidades de classe e grandes consumidores se reúne hoje e amanhã em Brasília para mais uma rodada de discussões. Quem representa o Ministério de Minas e Energia nas reuniões é Marco Antonio Almeida, diretor da secretaria de petróleo e gás. No Rio, a Associação Brasileiras das Distribuidoras de Gás também se reúne hoje e amanhã.

Ontem o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, mencionou a intenção de anexar o plano de contingenciamento que ainda não foi concluído à Lei do Gás, sem explicar se isso será feito no projeto do governo ou do senador Rodolpho Tourinho. Até o momento, nenhuma das várias versões do documento que vêm sendo aprimoradas, menciona volumes de gás a serem contingenciados. Também não definem que consumidores serão preservados. Isso vai depender, segundo uma fonte, do tamanho do corte necessário e do local onde ele vai se dar: na Bolívia ou no Brasil, e se aqui, em qual região.

O objetivo da reunião em Brasília é chegar a um acordo sobre o texto final de um projeto de ato normativo disciplinando o tema. As discussões já duram um ano. Ao contrário do racionamento de energia em 2001, quando o governo federal tinha plenos poderes para disciplinar um corte da ordem de 20% no consumo, no gás será preciso negociar com o Estados, que têm o monopólio natural para regular a distribuição de gás garantido pela Constituição.

Fonte do setor explicou que São Paulo, maior consumidor do país e maior usuário do gás da Bolívia, está mais adiantado em seu plano de contingenciamento que o Rio, segundo maior consumidor.

Um dos pontos já acordados pela Comissão de Serviços Públicos de São Paulo é o corte da oferta de gás natural veicular (GNV). São Paulo também já tem cerca de uma dezenas de empresas que aceitaram abrir mão dos seus contratos, em troca de uma indenização.

Já no Rio, a posição que vinha sendo mantida pelo governo anterior - que pode mudar com o novo secretário de Energia, Júlio Bueno - é que o GNV é intocável. O gás veicular é apenas uma das divergências no setor. Os grandes consumidores de gás, representados pela Abrace ainda reclamam da Petrobras, que já anunciou a intenção de indexar os contratos de gás ao óleo combustível do tipo 1A cotado no mercado internacional a US$ 7,98. O gás custa US$ 5,43 em São Paulo. Essa medida resultará em aumento de 46%.

O suprimento para térmicas é o maior problema. Luiz Pedro Biazotto, que representa a Abrace no grupo de trabalho oficial, é explícito ao mostrar a posição dos consumidores: "Não vamos aceitar parar a indústria para resolver problemas do setor elétrico", disse. "Até o momento o texto do plano não prevê como contingência a falta de energia elétrica, exceto as preferenciais que forem consideradas imprescindíveis pelo ONS".

Outra controvérsia listada pelo executivo é a definição de quais consumidores serão afetados por um corte. Um dos poucos consensos é que os consumidores residenciais e comerciais devem ser poupados. "Também já se definiu que o gás para refinarias não é prioritário, já que podem operar com outros combustíveis. Solicitamos, e o governo não aceita, que os consumidores industriais que usam gás como matéria-prima e sem substituto energético sejam poupados. Mas o Ministério não concorda", disse Biazotto