Título: Onze setores operam com menor folga na capacidade instalada
Autor: Salgado, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 10/05/2007, Brasil, p. A4

O forte crescimento da produção industrial nesse começo de ano foi acompanhado também por uma maior utilização da capacidade instalada da indústria. E essa elevação foi generalizada. Onze entre quatorze segmentos industriais já operavam, em abril, com folga menor do que a que tiveram na média dos dois últimos anos. No entanto, na avaliação de economistas, a expansão dos investimentos no setor produtivo e o aumento das importações afastam o risco de redução da oferta doméstica.

Entre janeiro e março deste ano, a produção industrial avançou 3,8% em relação a igual período do ano passado. Ao mesmo tempo, pelos dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), a utilização da capacidade instalada subiu 1,8 ponto percentual e passou de 79,9% para 81,7%. Já os números da Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostram que o nível de utilização chegou a 85,3% em abril, segundo maior valor da série da entidade. Só perdeu para abril de 1995, quando chegou a 85,4%.

Ao mesmo tempo, a Rosenberg & Associados, projeta que o investimento no país, medido pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), cresceu 7,4% nesse primeiro trimestre. Esse indicador é composto pelo consumo aparente de máquinas e equipamentos (produção interna, mais importações e menos exportações) e pelos investimentos em construção civil. Thaís Marzola Zara, economista da consultoria, diz que essa expansão do investimento foi impulsionada principalmente pelo setor de máquinas. Pelos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção desses bens aumentou 14,8% neste ano.

A abertura dos dados por segmentos mostra que os setores com maior utilização da capacidade são aqueles que, tradicionalmente, já operam a pleno vapor. É o caso da metalúrgica (94,4%) e da celulose, papel e papelão (93,5%). Esses valores estão acima da média de 2005-2006 quando ficaram, respectivamente, em 91,9% e 92,5%. São setores que trabalham com um processo contínuo de produção.

"O crescimento da indústria pressionou o nível de utilização da capacidade", afirma Fernando Montero, economista-chefe da Corretora Convenção. Ele diz que existia ociosidade na indústria e ela está sendo ocupada. Embora os investimentos estejam em alta, Montero acredita que é preciso relativizar essa situação. "Existe sim um aumento de investimentos, mas ele é fruto também da maior pressão sobre a capacidade das empresas", explica.

Outros setores como produtos alimentares, vestuário e calçados, material para construção e química ainda estão com uma utilização mais baixa, entre 85% e 90%, mas os percentuais deste ano estão acima dos do ano passado. Na indústria de alimentos e na da construção essa elevação acompanhou um ritmo mais forte da produção industrial .

Na produção de calçados, porém, a utilização passou de 84,5% na média de 2005-2006 para 86,3% em abril, de acordo com a sondagem da FGV. Para Thaís, como a produção caiu 4,3% nos doze meses até março, esse cenário pode indicar que os empresários perderam o interesse em investir, já que têm dificuldades de exportar e sofrem com a concorrência chinesa e indiana no mercado interno.

O que está fazendo a diferença é o forte incremento das importações. Elas estão suprindo uma boa parte da demanda doméstica e, como aumentam a concorrência, ajudam a inibir eventuais aumentos de preço aos consumidores. Para Caio Prates, economista do grupo de conjuntura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o indicador mais relevante para ver se há descompasso entre a oferta e a demanda é a inflação. "E não temos indicação de descontrole nessa área. O câmbio está ajudando muito, mas se houvesse um descompasso forte, nem ele seria capaz de barrar pressões por reajustes", explica o professor.

Prates, assim como Thaís, ressalta a importância da expansão do investimento. A UFRJ projeta um crescimento entre 9% e 9,5% da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) em 2007, acima dos 8,7% do ano passado.

A confiança dos empresários também é um item a ser considerado. Pela sondagem da FGV, o Índice de Confiança do Consumidor (ICI) atual da indústria está em 123,3 pontos. Acima de 100, esse indicador já sinaliza que os executivos estão otimistas. O índice das expectativas para o futuro também é positivo: 110,3. O setor dos calçados e vestuário, no entanto, acende um alerta. As expectativas dos empresários estão baixas: 96,1 pontos.

Para Thaís, esse é o tipo de caso que preocupa, pois indica uma desindustrialização do setor e possíveis pressões inflacionárias caso as importações deixem de suprir o mercado interno. O que poderia acontecer caso o dólar se valorize em relação ao real ou então caso o aumento das tarifas de importação reduza a compra de produtos estrangeiros. Mas, por enquanto, esse é um problema isolado. A julgar pelos dados de inflação e investimentos, a perspectiva da economista é que o nível de utilização da capacidade instalada se reduza ao longo dos próximos trimestres.