Título: Petrobras admite frear investimento em gás na Bolívia
Autor: Schüffner, Cláudia e Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 09/05/2007, Brasil, p. A4

O ministro de Hidrocarbonetos e Energia da Bolívia, Carlos Villegas, reúne-se hoje em La Paz com o presidente da Petrobras Bolívia, José Fernando de Freitas. Até ontem à noite não havia indicação sobre a possibilidade de o governo da Bolívia já ter resposta para a proposta de venda das duas refinarias que tiveram suas receitas de exportação seqüestradas por um decreto na segunda-feira. No Brasil continua firme na intenção de jogar duro.

Se a Bolívia não concordar com a proposta da estatal, a reação deve ser uma reclamação contra o país no Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos, órgão para resolução de controvérsias do Banco Mundial, do qual a Bolívia ainda é signatária.

A Bolívia se retirou em abril da Corte Internacional de Arbitragem, que Evo Morales acusou de tomar partido das transnacionais mas a Petrobras está protegida por um acordo firmado com a Holanda, sede da Petrobras Nedherlands , que controla a Petrobras Bolívia (PEB). E entende que a decisão de Morales, se confirmada, não tem efeito retroativo.

De qualquer modo, a resposta da estatal brasileira ao governo boliviano pode não se limitar à sua saída da atividade de refino. Ontem, o diretor da área de Abastecimento e Refino da Petrobras, Paulo Roberto Costa, disse que todos os investimentos naquele país estão "sub-judice", inclusive aqueles os que possam ser feitos com o objetivo de aumentar a produção de gás.

Apesar do executivo não detalhar, um dos investimentos que podem ser cancelados é o que previa o aumento da produção de gás no campo San Antonio em 3,6 milhões de metros cúbicos de gás por dia. A companhia estima em US$ 200 milhões os gastos nesse projeto, que teriam início em 2009 para começar a produzir esse gás em 2011. Agora, isso pode ser cancelado.

"Eu diria que todos os investimentos vão ser reavaliados", disse. E reafirmou que se em 48 horas (que vencem hoje à noite) a empresa não chegar a um acordo sobre o preço das duas refinarias, a Petrobras vai à arbitragem internacional.

Costa ressalvou não estar dizendo que a Petrobras deixará de investir na Bolívia, mas disse que a empresa não pode fazer investimentos "sem saber o que vai acontecer" nas suas relações com o país vizinho. Enquanto a reação no Brasil foi mais dura, na Bolívia, Evo Morales adotou um tom conciliador. Para Morales, esta "decisão soberana do Estado e do povo boliviano não acarretará problemas entre La Paz e Brasília". E completou: " Vamos apostar no diálogo", afirmou Morales, em entrevista à imprensa na residência presidencial, frisando que não vai negociar pela imprensa.

O diretor da Petrobras disse também que ela fará, paralelamente, todos os esforços possíveis para manter o fluxo de gás natural para o Brasil e os contratos com as empresas distribuidoras do Estados. "Temos que entender que temos hoje um contrato de 30 milhões de metros cúbicos por dia (com a Bolívia), são escoados 25 milhões e esses 25 milhões são importantes em termos de fornecimento de gás para o país", disse.

A Petrobras não informa qual o valor pedido pelas duas plantas. Até semana passada, esse valor seria próximo a US$ 200 milhões, mas agora a imprensa boliviana já menciona a cifra de US$ 136 milhões. Para o economista Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura, depois do novo decreto que tira da Petrobras receitas excedentes de US$ 70 milhões, segundo cálculos do ministro boliviano Carlos Villegas, o presidente Evo Morales conseguiu o que queria, ou seja, comprar as duas plantas bem barato.

"Com esse decreto o Evo Morales reduziu o valor de mercado das refinarias para zero. E agora ele pode pagar o valor patrimonial e contábil. Antes, se falava em US$ 200 milhões com base no fluxo de caixa da companhia, que agora é negativo. O Morales conseguiu baixar o preço para o valor que ele queria. Esse foi o nó que ele deu na Petrobras", avalia.

Uma fonte da estatal ouvida pelo Valor discorda dessa avaliação. Lembra que o decreto que reverte para a estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) as receitas de exportação - única fonte de lucro dessas refinarias - é "um ato arbitrário" e que por isso não pode ser levado em conta na definição do preço.