Título: Falhas no cuidado contínuo
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 17/12/2010, Brasil, p. 12

TERCEIRA IDADE

Muito se festeja o aumento da expectativa de vida do brasileiro, que já chegou a 73,1 anos no último levantamento oficial, mas pouco se fala dos desafios trazidos com a idade. Um exemplo está no contingente de 3,3 milhões de idosos ¿ ou 15% do total de quase 20 milhões de pessoas com mais de 60 anos no país ¿ que hoje apresentam alguma incapacidade para realizar atividades diárias. Em 2020, eles poderão chegar a 5 milhões, o equivalente ao dobro da população do Distrito Federal. Caso os serviços de saúde melhorem no período, a quantidade de brasileiros que precisarão de cuidados contínuos será de 3,8 milhões. Ou seja, na hipótese mais otimista, 500 mil pessoas a mais que o montante atual se tornarão dependentes num prazo de 10 anos.

As projeções foram lançadas ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). De acordo com Ana Amélia Camarano, pesquisadora do Ipea e uma das autoras da publicação, o principal objetivo do estudo é levantar a discussão sobre um desequilíbrio futuro grave. ¿Haverá um crescimento, maior ou menor, da demanda por cuidados contínuos vinda da população que perde a capacidade de gerir sua rotina e, ao mesmo tempo, a diminuição da capacidade da família de cuidar desses idosos. O que propomos é que o Estado e a iniciativa privada se antecipem a esse problema¿, afirma Ana Amélia.

Uma alternativa, segundo a pesquisadora, é o investimento em instituições de longa permanência, também chamadas de asilos. Hoje, apenas 6,6% das 3.548 existentes são públicas. A maior parte, 65%, mantém-se por meio da filantropia. E quase 30% fazem parte da rede privada. ¿Isso significa que os idosos que não têm condições de arcar com os custos, se não conseguem vaga em um local sem fins lucrativos, ficam sem opção¿, critica Ana Amélia. Para piorar a situação, o levantamento constatou que a taxa de ocupação dos leitos fica em 90%. E 11,9% dos quase 100 mil residentes tinham menos de 60 anos, marco a partir do qual a pessoa é considerada idosa.

Exaustão Se a idade não é fator determinante para se estar num asilo, as condições funcionais são. De acordo com o geriatra e professor da Universidade de Brasília Renato Maia, 60% dos residentes de instituições de longa permanência, hoje, apresentam necessidade de cuidados contínuos. ¿A família chega à exaustão e as instituições acabam virando grandes hospitais públicos, isso porque, no Brasil, não há uma política para o grande incapacitado, seja idoso ou não¿, afirma o médico. Maia ressalta como causas de dificuldades funcionais as doenças musculares, as sequelas de problemas neurológicos e a depressão. ¿Não no sentido de membros prejudicados, mas de motivação, no caso de quadros depressivos¿, explica o geriatra. Um terço dos idosos que procuram qualquer serviço médico apresenta depressão. Na população geral acima de 60 anos, a estimativa da doença é de 10% a 15%.

DESAFIOS DO ENVELHECIMENTO

Dos quase 20 milhões de idosos no país, 15% apresentam dificuldades em atividades diárias. O número vai aumentar, segundo o Ipea, enquanto as famílias são cada vez menos capazes de cuidar deles. Confira os dados:

Incapacidade para atividades de rotina

Cenário otimista (caso os serviços de saúde melhorarem)

2010 - 3,3 milhões

2020 - 3,8 milhões

Cenário pessimista (se os serviços de saúde não melhorarem)

2010 - 3,3 milhões

2020 - 5 milhões

Instituições de longa permanência

Mais conhecidas como asilos, essas instituições, 3.548 no total, passam a ser a saída para os idosos que precisam de cuidados contínuos. As vagas são escassas e só para quem pode pagar

Modalidade jurídica

Filantrópicas (religiosas ou leigas) - 65,2% Privadas - 28,2% Públicas ou mistas - 6,6%

30,4 Número médio de residentes em cada instituição

90% taxa de ocupação dos leitos

100 mil Quantidade aproximada de idosos hoje em asilos no país.