Título: Cenário econômico desafia a destreza do Banco Central
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 07/03/2013, Opinião, p. A16

Manter os juros estáveis em 7,25% ao ano era considerado o resultado mais provável da reunião de ontem do Comitê de Política Monetária (Copom). Mas o comunicado emitido após a reunião deixou a porta aberta para uma futura elevação da taxa uma vez que eliminou a referência à manutenção da taxa Selic por "um período suficientemente prolongado", que vinha sendo repetida nos três encontros anteriores, desde outubro. Além disso, informou que o Copom vai acompanhar a evolução do cenário macroeconômico para definir os próximos passos da política monetária.

Havia quem apostasse em uma alta suave, apenas para indicar a preocupação do Banco Central com o "desconforto" com a inflação, como qualificou seu presidente, Alexandre Tombini; ou até em uma pancada mais forte, para matar o mal pela raiz. Afinal, prevaleceu a opção unânime por manter a Selic no mesmo patamar em que está há quase cinco meses.

Havia tempos que o cenário de uma reunião do Copom não era tão nebuloso pelas perspectivas para a inflação e nível de atividade. Já na ata da reunião anterior, em janeiro, o comitê notara a "piora" no "balanço de riscos para a inflação" e a frágil recuperação da economia. De lá para cá, as suspeitas foram se materializando.

Depois de ter fechado 2012 em 5,8%, abaixo dos 6,5% de 2011, a inflação voltou a acelerar e pode bater no teto da meta ao longo do primeiro semestre. Os alimentos e os serviços continuam pressionando o índice oficial de inflação, o IPCA, que atingiu 0,86% em janeiro. O IPCA de fevereiro somente será conhecido amanhã. Outros índices sinalizam recuo pequeno dos preços, insuficiente porém para melhorar as expectativas. O IPCA-15, por exemplo, que antecipa o índice do mês cheio, diminuiu 0,45 ponto percentual por causa da energia mais barata e dólar mais baixo, mas acumula 6,2% em 12 meses, aproximando-se do teto da meta. Já o IPC da Fipe mostrou desaceleração ao longo de fevereiro e já se fala até de deflação neste mês, se os preços dos alimentos ficarem mais comportados. E o IGP-DI de fevereiro, ontem divulgado, ficou abaixo do esperado, em 0,20%, atingindo, porém, nada menos que 8,24% em 12 meses.

O governo tem tentado conter os preços. De um lado, reduziu as tarifas de energia elétrica, segurou o câmbio e adiou o reajuste do transporte em algumas capitais. Mas o uso maior das térmicas neutralizou parte da economia proporcionada pelo barateamento da energia elétrica; e os combustíveis foram aumentados. A gasolina subiu 6,6% em janeiro; e o diesel, 5,4% em janeiro e mais 5% a partir de ontem.

Recorrendo a outro tipo de arma, o governo planeja também medidas de desoneração fiscal para baratear a cesta básica e combustíveis, como o diesel e o etanol. Analistas consultados pelo Valor avaliam que será reduzido o efeito dessas medidas sobre a inflação. Há ainda o plano do governo de reduzir a tarifa de importação de alguns produtos para reduzir a inflação. No ano passado, foram elevadas as tarifas de importação de mais de cem produtos de setores que estavam sofrendo com a concorrência de bens trazidos a preços baixos do exterior. Agora o governo concluiu que alguns produtores nacionais beneficiados aproveitaram a medida para elevar seus preços, e ameaça voltar atrás.

Se o comportamento da inflação exigiria uma postura mais firme do Banco Central, do lado do nível de atividades é o oposto. Os dados do Produto Interno Bruto (PIB) recentemente divulgados mostram que a economia está se recuperando depois de um 2012 desapontador, mas a um ritmo ainda lento.

O PIB do quarto trimestre cresceu 0,6%, acima do 0,4% do terceiro trimestre, do 0,3% do segundo e do 0,1% do primeiro. Em 2012, o PIB acumulou crescimento de 0,9%, abaixo dos 2,7% de 2011. No ano, o destaque positivo do lado da oferta foi o crescimento de 1,7% dos serviços; já a agropecuária recuou 2,3%, e a indústria caiu 0,8%. Do lado da demanda, a boa notícia foi o aumento de 0,5% do investimento no quarto trimestre, insuficiente porém para compensar cinco trimestres consecutivos de baixa, de modo que a queda foi de 4% no ano. O consumo continuou puxando o PIB, com crescimento de 3,1% nas famílias e 3,2% no governo. Os números sinalizam a tendência de recuperação moderada da economia, apoiada na retomada dos investimentos e na expectativa de safra recorde de grãos, que vai estimular o PIB da agropecuária.

Diante desse quadro, não se esperava muita surpresa do Copom. Interesse maior cerca a ata da reunião, a ser divulgada na próxima semana, que deve trazer novas pistas a respeito dos próximos passos do BC.