Título: Inflação e PIB serão decisivos para Selic
Autor: Romero, Cristiano; Oliveira, João José
Fonte: Valor Econômico, 07/03/2013, Finanças, p. C14

Para Figueiredo, ex-diretor do BC, o Copom deixou claro que está preocupado com a inflação, mas não deu como certo um aumento do juro na sua próxima reunião, em abril

Primeiro economista a alertar para a possibilidade de o Banco Central (BC) mudar a política monetária e iniciar um novo ciclo de alta da taxa básica de juros (Selic), Luiz Fernando Figueiredo acredita que o Comitê de Política Monetária (Copom) não deu como certo um aumento do juro na sua próxima reunião, em abril.

Para Figueiredo, o Comitê, ao retirar do comunicado a expressão "por período suficientemente prolongado", com a qual vinha sinalizando a estabilidade da Selic, deixou claro que está preocupado com a inflação e reiterou o teor de declarações dadas pelo presidente do BC, Alexandre Tombini, quando o IPCA de janeiro foi divulgado - na ocasião, Tombini declarou que não estava confortável com a inflação (0,86% no primeiro mês do ano).

"Retirar o "suficientemente prolongado" já é um sinal. Significa que o BC não está entendendo a situação como estável, mas de preocupação. O comunicado é uma extensão do que ele [Tombini] já falou", disse Figueiredo, que foi diretor do BC na segunda metade dos anos 90 e hoje é sócio da Mauá Sekular Investimentos.

O gestor diz que o Copom vinculou suas próximas decisões ao desempenho da economia, principalmente da inflação e do PIB, até o encontro de abril. Ele acha, entretanto, que o mais provável é que o Comitê eleve a taxa de juros na próxima reunião. Se não fizer isso no próximo mês, com certeza, disse ele, o fará no encontro seguinte, marcado para os dias 28 e 29 de maio.

"[O Copom] não sinalizou quanto nem quando. De longe, o mais provável é que ele faça [uma elevação do juro] em abril. O Comitê está se dando um tempo", explicou Figueiredo. "Provavelmente, o mercado vai precificar amanhã [hoje], nos contratos futuros de juros, uma alta em abril um pouco abaixo de 25 pontos-base e, para maio, pelo menos 25 pontos [0,25 ponto percentual]."

Figueiredo, que com sua entrevista ao Valor há duas semanas mudou parte das expectativas do mercado em relação à estratégia do BC para os juros, revelou que, em março de 2010, o Copom usou a mesma frase do comunicado de ontem e, no encontro seguinte, iniciou o aperto monetário. Em 2008, a mesma frase foi mencionada, mas naquela oportunidade o juro não foi aumentado na reunião seguinte.

Alexandre Schwartsman, outro ex-diretor do Banco Central, também acredita que, após a reunião de ontem, a estratégia do Copom mudou. "Há uma nova estratégia, cuja definição é dependente da evolução do cenário macroeconômico até a próxima reunião, programada para 17 de abril, quando as chances são de que o BC reinicie um ciclo de aperto", disse ele em relatório divulgado na noite de ontem.

Também para o economista-chefe de pesquisa macroeconômica do Santander, Maurício Molan, a opção do Copom de manter a taxa básica de juros estável em 7,25% ao ano e de usar um comunicado mais genérico que os anteriores mostra que a autoridade monetária vai calibrar os juros de agora em diante conforme os dados de inflação e de atividade - com maior importância para os índices de preços.

Molan avalia que a decisão ficou bastante em linha com o que o mercado vinha precificando, especialmente depois que o presidente do BC adotou uma mudança do discurso referente à cautela com a inflação de curto prazo e ao emprego da Selic para ajustar a política monetária.

Para Molan, se os dados de inflação vierem com variações inferiores às atuais esperadas pelos agentes de mercado, o BC vai manter a Selic em 7,25% pelos próximos trimestres. "O BC fez questão de ressaltar que os próximos passos estão condicionados aos dados que vão sair. Ele não se compromete nem com alta nem com estabilidade", afirmou o economista-chefe do Santander.

Mas há entre profissionais de mercado uma leitura de que o grau de incerteza sobre a trajetória dos juros aumentou com a decisão unânime do Copom. O estrategista-chefe do Icap Brasil, Gabriel Gersztein, disse que o comunicado foi mais duro e genérico que o esperado, o que vai ampliar a incerteza dos agentes de mercado. "A partir de agora, tudo depende dos dados de curtíssimo prazo. O que vai trazer muita volatilidade a cada dado bom ou ruim que for saindo. Isso vai trazer incerteza e instabilidade", disse o estrategista da Icap.

Já a economista-chefe do BNY Mellon Arx Investimentos, Solange Srour, afirma que o comunicado veio em tom mais forte que o esperado e indica que o Banco Central não deve demorar a voltar a subir os juros no país. Para ela, o ciclo de aperto monetário deve começar em maio, mas a possibilidade de alta de juros já na reunião de abril cresceu após o comunicado de hoje. "Se o BC seguir seu normal, em abril muda o comunicado para dizer que "acompanha atentamente" a situação e em maio sobe os juros. Mas abril agora está bastante no jogo, pois uma piora na inflação de curto prazo pode levar o BC a pular um passo", disse Solange Srour. "A chance é de 40% de o juro subir em abril e 60% de subir em maio."

Ex-diretor do BC, o economista Mário Torós, sócio da gestora de recursos Ibiúna Investimentos, disse que o Copom terá que elevar juros, mesmo com o hiato do produto (a diferença entre produto potencial e produto efetivo) ainda aberto. Isso decorre, segundo ele, do fato de o Banco Central ter desdenhado as expectativas dos agentes econômicos ao longo dos últimos dois anos, fato que, somado a erros "consistentes e contínuos" de política econômica cometidos pelo governo, teriam levado à situação atual.

"A inflação é alta, as expectativas estão deterioradas, o PIB cresce muito pouco, abaixo do potencial, as contas fiscais perderam credibilidade. Tudo isso derrubou o investimento", observou Torós.

Para Fernando Rocha, economista-chefe da gestora de fundos JGP, o comunicado de ontem deixou em aberto os próximos passos do BC. "O Copom poderia ter sido mais enfático, dizendo que vai monitorar atentamente a evolução do cenário, mas não quis se comprometer." Rocha, no entanto, diz não acreditar que o BC vai recuar da decisão de elevar os juros, mesmo com as desonerações. Os dados de inflação de fevereiro e março ainda virão altos, batendo no topo da meta, argumenta.