Título: Tarifa e estoque estão fora da agenda dos EUA
Autor: Bautzer, Tatiana
Fonte: Valor Econômico, 07/03/2007, Brasil, p. A4

Os Estados Unidos querem incentivar e ajudar a financiar novas usinas de álcool na América Central, mas a intenção é que elas supram os mercados locais e não sejam usadas como plataforma de exportação, afirma o assessor especial do Departamento de Estado para energia, Gregory Manuel. "Queremos o desenvolvimento de terceiros mercados para criar um consumo local de biocombustíveis. Os estudos de viabilidade econômica das usinas estão sendo feitos para suprir o mercado local e não como plataforma de exportação", afirmou Manuel em entrevista por telefone ao Valor.

Os EUA estão analisando financiamento para a construção, incluindo parcerias com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Banco Mundial (Bird). Manuel diz que a América Central será a primeira região a ter este incentivo, mas a iniciativa pode ser expandida mais tarde.

Uma usina montada pela Cargill para desidratação de álcool brasileiro com posterior exportação para os EUA provocou há dois anos forte reação do Congresso americano. Foram apresentados projetos de lei para barrar a importação dessa usina, que por estar instalada na América Central tem acesso ao mercado norte-americano sem tarifas.

Manuel acredita que o Congresso continuará refratário a iniciativas semelhantes e que a idéia não é estimular investimentos no Caribe para exportar aos EUA. "Acho que o clima político não mudou em relação àquela época. A tarifa de importação sobre etanol foi renovada até 2009, e temos que obedecer ao Congresso", disse.

Segundo o assessor da secretária Condolleeza Rice, a idéia é que os países da América Central e Caribe mais atingidos pela alta de preços do petróleo possam produzir biocombustíveis para substituir importações. A América Central é a primeira região do projeto, que depois poderá ser estendido.

Manuel disse não ter conversado com o presidente George Bush sobre o projeto de lei do senador republicano Richard Lugar, que eleva o uso obrigatório de álcool combustível no país, incluindo não apenas volumes consumidos, mas produção de carros e obrigatoriedade de venda por pelo menos 50% da rede de postos de gasolina. "Não sei a opinião dele sobre o projeto", disse. O assessor do Departamento de Estado diz que a disponibilidade do combustível no mercado americano "se desenvolverá com o tempo" e que a nova indústria em torno do álcool está crescendo rapidamente.

O assessor reiterou que "não estão na mesa" discussões sobre a tarifa de importação de álcool combustível nem outras questões comerciais, como já disse publicamente algumas vezes. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que irá mencionar a tarifa na conversa com Bush.

Também não há a intenção do lado americano, segundo Manuel, de criar um estoque regulador de álcool para facilitar sua transformação do produto em "commodity", ou de discutir formas de financiamento. O presidente Lula mencionou a possibilidade de criação de estoques pela Petrobras.

O memorando a ser divulgado pelos presidentes ainda está em negociação entre os dois governos, segundo o assessor. Deverá mencionar com certeza a cooperação para desenvolvimento de terceiros mercados, investimentos em pesquisa e desenvolvimento e criação de códigos e padrões de biodiesel e álcool (etanol) para negociação em mercados internacionais. Estados Unidos, União Européia, África do Sul, Brasil, China e Índia devem discutir os padrões no Fórum Internacional de Biocombustíveis, lançado na sexta-feira passada.

Embora afirme que a produção de álcool a partir do milho é viável a longo prazo, Manuel admite que haverá uma "grande mudança no jogo" com o desenvolvimento de novas tecnologias para produzir álcool com outras fontes de celulose.

"Há um grande volume de investimento privado nessa área, e o mercado acredita que essa produção será viável sem subsídios no futuro", diz Manuel. O assessor para energia do Departamento de Estado espera que o álcool "de segunda geração" esteja sendo produzido comercialmente nos EUA em três a cinco anos, mas que ainda é difícil estimar qual será seu custo. Um dos itens do projeto do senador Lugar é o financiamento de pesquisa para esse novo tipo de álcool, contando com a dificuldade de suprir o mercado só com etanol de milho.