Título: PMDB governista culpa Lula por renúncia de Jobim à candidatura
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Fonte: Valor Econômico, 07/03/2007, Política, p. A8

Ao dar início às negociações com o PMDB para a reforma ministerial a poucos dias da convenção nacional que elegerá o novo comando da legenda, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu argumentos para a renúncia da candidatura de Nelson Jobim, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), e provocou um princípio de rebelião entre seus maiores aliados no partido. "Nós consideramos interferência indevida do governo na eleição do partido e nos consideramos liberados", disse a Lula, por telefone, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), numa sinalização de que o governo pode enfrentar problemas na Casa a partir de agora.

A bancada do PMDB no Senado se reuniu ontem à noite e os 20 senadores decidiram não participar da convenção do partido, no domingo. A ausência na convenção será a forma de os senadores mostrarem insatisfação com a chapa encabeçada pelo atual presidente do partido, Michel Temer (SP), que, segundo eles, representa apenas uma ala do partido. Os pemedebistas que apoiaram Jobim acham que, com esse posicionamento político, podem forçar uma negociação para evitar a vitória total do grupo de Temer no domingo.

Na reunião, Renan disse que o grupo se sente liberado do compromisso de apoiar incondicionalmente o governo. A avaliação feita era que Lula teria acabado com a eventual chance de vitória de Jobim. Aliados de Temer reagem dizendo que o gaúcho não tinha chance e que Lula deu a ele uma saída honrosa para a desistência.

Apesar da aparente revolta com o governo, a bancada não cogitou a possibilidade de os senadores Romero Jucá (RR) e Roseana Sarney (MA) recusarem os cargos de líderes do governo no Senado e no Congresso, respectivamente, para os quais foram confirmados ontem por Lula.

A forte reação do grupo aliado a Jobim levou a novo adiamento do anúncio dos ministérios do partido. A decisão foi tomada em audiência de Lula com Temer, candidato à reeleição. "Viemos falar ao presidente que, depois dos acontecimentos de hoje, não é hora de falar de ministério", disse, ao deixar o Planalto.

Jobim, que disputaria contra Temer, formalizou o pedido de retirada da chapa por se sentir "traído" por Lula, segundo interlocutores. Era Temer quem defendia que Lula decidisse a reforma ministerial antes da convenção. Mas Jobim, que havia enfrentado problemas para formar a chapa, teria que fazer muitas correções para legalizá-la e estava em desvantagem entre os convencionais, segundo analistas do partido.

Jobim divulgou nota curta: "Os acontecimentos das últimas horas enunciam opção objetiva do governo quanto à disputa no PMDB. Diante disso, resta-me afastar-me em definitivo da contenda".

À tarde, em entrevista, sem o habitual tom conciliador, Renan mostrou sua irritação com o Palácio do Planalto. "Sou 100% solidário ao Jobim. Não tem absolutamente nenhum sentido, na semana da eleição do PMDB, alguém enunciar uma interferência dessa, com resultados óbvios", disse. E repetiu o que disse a Lula: "Como presidente do Senado, vou garantir o equilíbrio federativo e trabalhar pela governabilidade, mas totalmente liberado".

No domingo, em longa conversa no Alvorada, Renan e os senadores José Sarney (AP) e Roseana pediram a Lula que não fizesse nenhum movimento definitivo pela participação do PMDB no ministério antes da convenção. Argumentaram que a confirmação do deputado Geddel Vieira Lima (BA), indicado para o ministério pela bancada da Câmara, fortaleceria o grupo de Temer. Saíram certos do compromisso de Lula. A ponto de Jobim, no dia seguinte, deflagrar ofensiva no Congresso, fazendo corpo-e-corpo e negando renúncia.

Para surpresa de Jobim e seus apoiadores, Lula chamou Geddel para uma conversa na própria segunda-feira e ainda marcou audiência com Temer para ontem à tarde. Marcada para 15h, a conversa foi remarcada para 18h30 e teve início por volta de 19h.

Jobim, que já enfrentara dificuldades na composição da chapa - nomes repetidos e falta de autorização -, e estava em desvantagem na contagem de votos, apresentou o gesto de Lula como argumento para a renúncia. Ex-deputado pelo PMDB, o gaúcho abandonou a carreira no Supremo para retornar à política. Amigo de Lula, foi estimulado por ele a disputar a presidência do PMDB. Recebeu apoio da maioria dos senadores do partido, como Renan, Sarney e Roseana, e do deputado Jader Barbalho (PA).

Num partido historicamente dividido como o PMDB, essa ala sempre foi aliada estratégica de Lula. É o grupo que detém os principais cargos no governo federal. Temer sempre representou a ala "independente", que só decidiu apoiar o governo petista no segundo mandato. Agora, o gesto de Lula está sendo usado como motivo para reforçar o racha partidário.

Temer, ontem, fez gestões para atrair o grupo de Jobim para a sua chapa. Reuniu-se com os governadores Luiz Henrique (SC), André Puccinelli (MS), Sérgio Cabral (RJ), Eduardo Braga (AM) e Marcelo Miranda (TO). Propôs a formação de uma "chapa de composição". A mesma proposta foi encaminhada aos senadores Jarbas Vasconcelos (PE) e Pedro Simon (RS), também aliados de Jobim.

O governador do Rio, que levou a Renan e seu grupo a proposta de Temer, não conseguiu convencer os senadores. Saiu do gabinete do presidente do Senado, com a certeza de que o grupo não participaria da convenção. Pessoalmente, Cabral disse que continuará aliado e amigo de Lula: "Não dá para confundir a questão do PMDB com o presidente Lula. Não ir à convenção é um gesto de lealdade e gentileza com Jobim".

Jader não poupou críticas a Lula por ter antecipado a discussão da reforma com Geddel e Temer. "Foi uma atitude de interferência no processo eleitoral".(Colaborou Thiago Vitale Jayme)