Título: Encontro avança na busca do pacto federativo
Autor: Galvão, Arnaldo e Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 07/03/2007, Política, p. A9

Os Estados poderão quitar suas dívidas com a União refinanciando-as em condições melhores com bancos privados. Esse foi um dos principais avanços obtidos ontem pelos governadores em reunião de mais de seis horas com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O governo federal concordou, também, em distribuir mais recursos para educação nos Estados, com o Fundeb, apoiar a tramitação da proposta de emenda que muda radicalmente o pagamento de precatórios e, ainda, permitir que parte da dívida ativa seja vendida.

Segundo o Banco Central, a dívida renegociada dos Estados com a União está em R$ 300,89 bilhões. "A partir de hoje, vamos ficar liberados para discutir essa dívida com o mercado e, encontrando perfil mais alongado, com carência ou juros menores, podemos pagar a União fazendo empréstimos no mercado", explicou o governador do DF, José Roberto Arruda. "No caso da dívida ativa, dívidas que os Estados têm para receber dos seus contribuintes e estão empacadas no Judiciário, podemos, agora, agilizar essas cobranças, inclusive com leilões" .

Para a próxima reunião, marcada para daqui a três meses, ficaram outras pendências. O governo federal prometeu estudar a proposta de liberar as empresas estaduais de saneamento do pagamento das contribuições PIS e Cofins desde que esses valores sejam investidos no setor. O presidente Lula também comprometeu-se a buscar formas de poupar do contingenciamento os fundos ligados à segurança pública e apoiou a busca de uma fórmula que libere os Estados da caução prestada na dívida externa vinculada à renegociação dos débitos com a União. Com a educação como tema central, o próximo encontro tratará, ainda, da desvinculação das receitas dos Estados (DRE).

Arruda esclareceu ainda que os governadores não pediram mudança na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Mas, em alguns Estados, o Legislativo ou o Judiciário descumprem essas normas e eles querem evitar que o Executivo seja punido por erro dos outros poderes. "Não é uma flexibilização da lei, porque o Executivo continua obrigado a cumprir todos os seus deveres", explicou.

O clima do encontro de ontem foi de cordialidade e Mantega afirmou que esse tipo de reunião, que deverá ser periódica, permite a existência de uma agenda nacional de desenvolvimento que atenda às demandas de segurança, educação e crescimento. O ministro disse que o governo federal, nos termos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), concordou com parte dos 14 pedidos apresentados pelos governadores. Mas a repartição da arrecadação da CPMF e o aumento da fatia estadual da Cide não foram concedidos, por "impossibilidade de caixa".

O governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), considerou a reunião de ontem "extremamente positiva" com intervenções de "altíssimo nível" e disse ter "esperanças de reiniciar o pacto federativo". "Espero que (a reunião) não se perca; vim com dúvidas se ela seria apenas para tirar outra foto", reconheceu.

Para o governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), o presidente Lula conseguiu destravar o debate federativo com um encontro que ficou "acima das expectativas". Na sua opinião, agora há um calendário.

Segundo os governadores, Lula chegou a brincar com os que tinham assumido Estados mais endividados. "Fico me perguntando como vocês sobrevivem com essas dívidas", disse. "Vocês precisam saber que eu também tenho dificuldades; o PAC, por exemplo, só saiu com muito sacrifício", ponderou o presidente.

Apesar de rejeitar a repartição da arrecadação da CPMF e a ampliação dos repasses da Cide, reivindicações que dariam mais fôlego aos Estados, Mantega ressaltou que haverá outras medidas nessa direção. A possibilidade de negociação da dívida com a União em condições mais benéficas com instituições financeiras privadas seria um exemplo do tipo de medida em estudo. Segundo o ministro, já existe autorização do Senado para a medida, mas falta manifestação da Procuradoria Geral da Fazenda e do Judiciário. "O governo não cogita mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal", garantiu, porém.

A venda da dívida ativa é outro aceno do governo para engordar os caixas dos governadores. O ministro da Fazenda comentou que o governo federal desenvolve um modelo de cobrança de tributos que pretende reduzir drasticamente a duração dos processos. A idéia, segundo Mantega, é inspirada nas normas americanas que ampliam a fase administrativa. Essa providência depende de alteração da lei.

No caso dos precatórios, o ministro da Fazenda disse que o governo aceitou apoiar a proposta de emenda constitucional (PEC) nº 12 de 2006, apresentada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Ela muda o atual critério cronológico e acrescenta o parágrafo 7º ao artigo 100 e cria um regime especial de pagamentos.

A PEC estabelece que os precatórios somente serão pagos após prévia compensação de valores inscritos na dívida ativa. Também define que, no mínimo, União, Estados e Distrito Federal têm de aplicar 3% da despesa primária líquida do ano anterior nesses pagamentos. Desse volume, 70% vão para leilões de pagamento à vista. A ordem dos pagamentos respeitará a ordem crescente dos valores atualizados, com prioridade para os de menor valor. No caso de valores iguais, a preferência é do mais antigo. A matéria está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), distribuída ao relator Valdir Raupp (PMDB-RO).