Título: Nero traz produção ao Brasil para cortar preços pela metade
Autor: Rosa, João Luiz
Fonte: Valor Econômico, 07/03/2007, Empresas, p. B3

A alemã Stefanie Heinle é fã de guaraná e pão-de-queijo, coisas que ela aprendeu a apreciar frequentando o restaurante brasileiro que abriram bem na frente de seu escritório, na Califórnia. Mais recentemente, porém, seu interesse pelo país começou a ultrapassar em muito o âmbito da culinária. Os negócios na América Latina da Nero - uma referência em software para gerenciamento de mídia digital - sempre foram controlados diretamente da matriz, na Alemanha. Agora, passaram a ser responsabilidade do escritório nos Estados Unidos. Para Stefanie, isso significa uma nova missão: impulsionar as vendas na região, especialmente no Brasil. "O mercado brasileiro é o primeiro da América Latina e decidimos ampliar os negócios aqui", afirma.

Para começar, Stefanie decidiu atacar o que considera uma das principais restrições à disseminação do software da Nero no Brasil: o preço. A companhia alemã, criada em 1995, conseguiu estabelecer uma marca forte entre os consumidores brasileiros, graças às versões mais simples de seus programas para gravar CDs e DVDs, que vem embutidos em computadores de grandes marcas. Mas o pacote completo, que reúne a versão mais sofisticada das tecnologias, sai por R$ 400, um preço que a própria executiva reconhece ser alto para o consumidor brasileiro médio.

Agora, está em gestação uma versão do produto que custará a metade do preço: R$ 200. A mágica para cortar custos e obter essa redução é a "produção" local.

Praticamente tudo que a Nero vende no Brasil é importado - CDs, manuais e embalagens -, o que acarreta um pesado custo adicional, em decorrência de impostos e taxas. Com a mudança, a XpressSoft, companhia brasileira que distribui os produtos no país, passará a prensar os CDs e fazer as caixas e manuais no país. "A previsão é de que, em 15 dias, o produto estará pronto para a venda no varejo", diz Rafaela Pedrosa, executiva de marketing da XpressSoft.

A redução de preço não é o único alvo. Com a medida, a Nero também pretende eliminar outro entrave no país: o idioma. Em vez de "falar" inglês, como os produtos atuais, a nova versão virá em português - incluindo o software e o manual.

A idéia é tanto atrair o usuário que não fala inglês, como vencer a resistência de varejistas que fazem restrições a embalagens em idiomas estrangeiros. "Há grandes redes de livrarias que se recusam a vender produtos que venham em caixas em inglês", diz Rafaela. A saída, até agora, era colocar uma tarja na embalagem, com as informações principais em português.

A Nero é um dos nomes que estão no centro da revolução digital. Fundada pelo alemão Richard Lesser, há 12 anos, a companhia - que permanece de capital fechado, sob o controle do fundador - reúne atualmente uma base instalada de 250 milhões de usuários em todo o mundo. Anualmente, cerca de 50 milhões de pessoas baixam a versão de demonstração de seus programas da internet.

A gênese da companhia está expressa em seu nome. Nero é uma referência ao famoso imperador, aquele que incendiou Roma no ano 64 d.C. e, segundo alguns historiadores, tocava lira enquanto a cidade ardia. Stefanie explica a ligação: "Originalmente, o nome do produto era 'Nero burning Rome'". Para quem não sabe, o verbo queimar - "burn, "em inglês - tornou-se sinônimo de gravar um CD caseiro, seja de música, vídeo ou dados.

Mais recentemente, porém, com a competição crescente em sua área original de atuação, a empresa passou a desenvolver e vender produtos que vão bem além de simplesmente "queimar" CDs. A mais recente versão de seu produto principal - o Nero 7 -, permite, por exemplo, que os adeptos dos velhos LPs de vinil ou das fitas cassete convertam esse conteúdo em arquivos digitais, que podem ser gravados em CDs.

É com essa estratégia, de oferecer um pacote de produtos integrado para o consumidor fazer de tudo - de retocar uma foto ou gravar programas de TV a fazer uma ligação telefônica entre PCs usando a internet - que a Nero espera se diferenciar e manter seu espaço, mesmo com concorrentes gigantes em seu encalço.

Tome-se o caso da Microsoft. Recentemente, a empresa lançou o Windows Vista, a nova versão de seu sistema operacional que já vem com um software para "queimar" CDs. Se fosse há algum tempo, isso poderia representar a morte para a Nero. Com o conceito do tudo-em-um, porém, Stefanie acredita que o Vista representa uma oportunidade e não um adversário. Tanto é assim que o pacote Nero 7 chegou às lojas já compatível com o sistema da Microsoft.

A visão dos executivos da Nero é clara: fotos, vídeos e músicas vão trafegar pelas redes e poderão ser compartilhados em qualquer dispositivo, independentemente de ser um celular, um aparelho de TV, um videogame ou um PC. "Já estamos vendo isso acontecer", diz ela.

O problema, de acordo com a executiva, é que há uma profusão de formatos disponíveis, que freqüentemente não conversam entre si. Isso para não falar de formatos proprietários, de uso exclusivo de uma só empresa. É o caso da Apple e do software iTunes: as músicas baixadas da loja da empresa na web só tocam no aparelho iPod.

Tudo isso está relacionado ao entretenimento digital, mas a Nero vê uma chance de vender software a empresas, que estão adotando os programas para fazer cópias de segurança, entre outras aplicações. Nos EUA, são clientes grupos como Coca-Cola, Disney, Boeing, FedEx e até o FBI. No Brasil, a XpressSoft já tem uma equipe de vendas empresariais e também pretende atacar esse mercado. Se depender de Stefanie, muito guaraná e pão-de-queijo estão por vir.