Título: Caderneta encolhe
Autor: Ribeiro, Alex e Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 07/03/2007, EU & Investimentos, p. D1

O Conselho Monetário Nacional (CMN) alterou o cálculo da Taxa Referencial (TR), reduzindo a rentabilidade de mais de R$ 361 bilhões investidos em cadernetas de poupança e no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). São R$ 191 bilhões em cadernetas, corrigidos pela TR mais juros de 6% ao ano, e R$ 170 bilhões no FGTS, que pagam TR mais 3% ao ano. Já quem fez financiamento corrigido pela TR será beneficiado.

Com a novidade, se o juro médio do mercado usado no cálculo da TR (a Taxa Básica Financeira, ou TBF) permanecer abaixo de 12% ao ano, a rentabilidade da poupança cairá 5,55% em relação ao rendimento atual, explica José Dutra Vieira Sobrinho, professor de matemática financeira. "E se a TBF recuar para menos de 11% ao ano, a redução da rentabilidade da poupança será de 10,52%."

A alteração visa a amenizar o problema do excesso de rentabilidade da caderneta em relação aos fundos de investimento. Já estão na agenda de discussões outras duas medidas para a caderneta de poupança: eliminar a isenção de imposto de renda (IR) e mexer no piso de juros, de 6% ao ano.

A rentabilidade da caderneta é dada diariamente pela aplicação de um redutor à TBF, que é o juro médio pago nos CDBs de uma amostra de 30 bancos. É esse redutor que foi alterado pelo governo. Caso a TBF, calculada diariamente, caia abaixo de 12% ao ano, como ocorreu nos últimos dias, será aplicado um redutor maior. José Dutra chegou a esses resultados ponderando que o ganho máximo da caderneta será de 68% da TBF. Antes da mudança, esse teto era de 76%.

O aumento do redutor da TR, atende a uma reivindicação de bancos. Instituições vinham argumentando há meses que, com as seguidas quedas na taxa básica de juros, a caderneta se tornou cada vez mais competitiva em relação a outras modalidades de investimento, como os fundos DI.

O receio era que, em breve, houvesse uma forte transferência de recursos para a caderneta. "Por enquanto, não estamos notando migração de recursos", disse Cleófas Salviano, consultor do Departamento de Normas do Banco Central. "Mas resolvemos fazer um ajuste técnico para evitar desequilíbrios." Muitos analistas do mercado, porém, já notam essa migração.

A reivindicação dos bancos é antiga - tem mais de seis meses -, mas o governo resolveu não atendê-la de pronto, como forma de incentivar os administradores de fundos a cortar as elevadas taxas de administração cobradas do varejo. Mas, com as seguidas quedas na taxa Selic, o governo passou a se mostrar mais sensível ao pleito dos bancos, embora o ganho da caderneta tenha permanecido competitivo frente aos fundo mais caros.

A avaliação de membros da equipe econômica é que a solução é apenas temporária - e que, na medida em que a Selic cair mais, será necessário tomar medidas adicionais. "Se os juros caírem até 11% ao ano, a solução atual resolve bem", disse o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Sérgio Gomes de Almeida. "Depois, se for necessário, faz-se outro ajustezinho."

Isso pode significar tanto uma nova revisão da fórmula da TR quanto alterações mais profundas. Setores do governo acham que, conforme os juros do mercado forem caindo - e a TBF acompanhar essa queda -, o setor imobiliário ficará menos dependente dos recursos da caderneta como fonte de financiamento - o que faria com que a isenção de IR perdesse sentido, assim como os juros de 6% ao ano, que originalmente foram criado para funcionar como um teto, não como um piso para a aplicação.

O problema é que essas medidas - que na visão de técnicos do governo se tornarão inevitáveis em algum momento - terão custo político elevado, pois representariam o desmonte de um instrumento popular de investimento como a caderneta. Por isso, a opção nesse momento foi por mexer apenas na TR, que tem menos visibilidade para o poupador e, por isso, representa um custo político menor.

"A poupança é o ativo que mais paga para o investidor", justificou ontem o ministro da Fazenda, Guido Mantega. "Todas as taxas de juros estão caindo, e a TR tem que acompanhar."

A medida era provável e necessária, diz Roberto Derziê, superintendente nacional de captação da Caixa Econômica Federal. "A isenção de imposto de renda na caderneta de poupança, com a queda dos juros, passou a torná-la praticamente imbatível em relação a fundos de altas taxas", diz ele.