Título: Desempenho na bolsa piora após 2004
Autor: Torres, Fernando; Góes, Francisco
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2013, Brasil, p. A4

O desempenho na bolsa das empresas em que a BNDESPar - braço de participações do BNDES - investiu após 2004 foi inferior ao da carteira anterior àquele ano. É o que mostra um estudo recentemente concluído pelos pesquisadores Sérgio Lazzarini, do Insper; Claudia Bruschi, da EESP/FGV; e Aldo Musacchio, da Harvard Business School. Eles levaram em conta dados do balanço do 3º trimestre de 2012 e analisaram o desempenho da parcela da carteira que possui ações listadas em bolsa.

A conclusão é que, dos investimentos feitos antes de 2004, 45% perdem para o Ibovespa enquanto que 73% dos investimentos realizados após aquele ano ficam aquém do referencial. Se analisadas as companhias nas quais o banco não apenas apostou, mas fez também reinvestimentos após 2004, a performance é ainda pior e não supera o Ibovespa em 79% dos casos.

Segundo Lazzarini, do Insper, o ano de 2004 foi usado como divisor, porque houve uma dificuldade de encontrar dados detalhados anteriores à data. Além disso, foi um ano bastante significativo para o mercado de capitais local, a partir do qual as ofertas iniciais de ações foram retomadas, com diversas novas listagens no Novo Mercado, segmento da bolsa que admite apenas uma classe de ações e faz uma série de exigências de governança corporativa.

A análise incluiu a variação dos papéis em bolsa desde a data em que a BNDESPar iniciou o investimento até o fim de 2012. No caso das companhias em que ele já investia antes de 2004, o trabalho considerou a data inicial como 30 de dezembro daquele ano, devido à dificuldade de encontrar dados que precisassem o momento da entrada do banco de fomento.

Entre os papéis que já compunham a carteira antes de 2004, estão Banco do Brasil, Braskem, Cemig, CPFL Energia, Copel, CSN, Eletrobras, Embraer, Gerdau, Klabin, Iochpe Maxion, Petrobras, Suzano, Tractebel, Tupy e Vale. Os novos investimentos, feitos após aquele ano, foram ALL, BRF (Brasil Foods, nascida da união entre Sadia e Perdigão), Copasa, EcoRodovias, Fibria, JBS, MPX, Marfrig, Oi e PDG Realty.

Os pesquisadores não incluíram a empresa de software e tecnologia Totvs na pesquisa - reconhecida como um "caso de sucesso" pelo próprio Lazzarini -, pois ela já constava da carteira antes de ser listada na bolsa. Já Oi e BRF foram incluídas como investimento posterior a 2004, pois, embora o banco já investisse nas ações das empresas que se fundiram, o estudo considerou que uma nova empresa foi criada após as fusões.

Em um estudo anterior, Lazzarini investigou se a participação da BNDESPar foi relevante para as companhias escolhidas, e concluiu que até 2002 a vantagem de ter o BNDES como sócio foi percebida, porém esse benefício não se sustentou quando foi analisado o período de 2003 a 2009. "Neste novo estudo, fomos numa outra linha, de perguntar: será que o BNDESPar apostou nas empresas corretas?", diz Lazzarini.

Claudia Bruschi, que também assina o trabalho, afirma que o mercado acionário consegue refletir muito bem se a empresa conseguiu crescer ou não. "A gente acredita que o BNDESPar tem um foco nos setores que quer ajudar. A questão é que não dá para ser totalmente discricionário na escolha das empresas", diz.

Lazzarini observa a mudança de perfil ao olhar os investimentos feitos nos dois períodos. "Antes, o BNDES estava com empresas grandes e relativamente estabelecidas. Quando começa a apostar em empresas estreantes, ou empresas que foram criadas com o foco em ser um campeão nacional, você observa resultados mais negativos. E os reinvestimentos feitos também foram negativos", diz.

A carteira focada em companhias mais consolidadas teve melhor desempenho, mesmo com muita concentração de elétricas e da Petrobras, que tiveram desempenho muito ruim no ano passado, em razão de uma percepção de maior ingerência governamental. "Se observa também que essas medidas do governo afetam a própria carteira do BNDES", observa Lazzarini.

O pesquisador afirma que os resultados do estudo mostram que, aparentemente, investiu-se em empresas que ficaram abaixo do Ibovespa e, como se trata de dinheiro público, é preciso que haja uma explicação sobre os resultados, e discutir se esses recursos não deveriam ser melhor direcionados. "Por que se alocou tantos recursos em frigoríficos e alimentos? Eu não tenho uma resposta muito clara", diz Lazzarini. "É capital público, que tem um custo de oportunidade social. Se está abaixo do Ibovespa, tudo bem, mas é preciso explicar que outros tipos de benefícios sociais você está tendo com isso", afirma o professor do Insper.

Lazzarini avalia que, em termos de política industrial, a prática seria beneficiar setores novos, emergentes e com potencial, mas que ainda não dispõem de capital suficiente para deslanchar. Ele admite que o banco já faz isso, mas sem foco. "A própria Totvs é um caso de sucesso em um setor novo, dinâmico. Mas o banco precisaria se especializar nisso, o que significaria reduzir a carteira e fazer uma gestão mais estratégica".

Consultado, o BNDES enviou alguns comentários sobre o trabalho por meio de sua assessoria. O banco enfatizou que os investimentos da BNDESPar geralmente ocorrem no mercado primário, buscam a indução de melhores práticas de governança e têm um horizonte de longo prazo incomum no Brasil, "mesmo que isso implique mantê-los em carteira durante períodos de turbulências". Segundo a nota, essa estratégia tem gerado resultados bem-sucedidos no longo prazo. "Para a BNDESPar, a bolsa de valores é basicamente um instrumento de liquidez, e não um local para realizar ganhos de curto prazo", afirma a nota, na qual o banco avalia ainda que o Ibovespa não é um bom parâmetro para avaliar a carteira.

A instituição afirma ainda que, mesmo não sendo o principal objetivo, historicamente a carteira da BNDESPar tem apresentado desempenho em linha com o Ibovespa, apesar das características distintas. "A gestão é baseada no portfólio como um todo e uma avaliação parcial desse portfólio, como a realizada pelo estudo, limita suas conclusões", diz a nota.