Título: Escudeiro não ficará à sombra da estrela
Autor: Rothenburg,Denise
Fonte: Correio Braziliense, 20/12/2010, Politica, p. 4

Embora preze pela discrição, Michel Temer, próximo vice-presidente, pretende assumir papel de protagonismo na gestão de Dilma Rousseff, ao contrário dos antecessores recentes

Nem tão discreto quanto o ex-vice-presidente e hoje senador Marco Maciel (DEM-PE), nem tão avesso a pontos específicos da política econômica quanto o atual vice, José Alencar (PRB-MG). O estilo do deputado Michel Temer (PMDB-SP) no cargo que ocupará a partir de 1° de janeiro será muito diferente daquele que marcou seus antecessores recentes ¿ ambos sempre muito elogiados pelos titulares, Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. No projeto que vem montando com aliados mais próximos, Temer terá protagonismo político. Como dizem seus amigos, nem Maciel nem Alencar tinham planos presidenciais. Temer, se tiver sucesso, passa a ser uma opção do PMDB para a sucessão ao Palácio do Planalto.

Esses movimentos, entretanto, não ficarão visíveis a olho nu num primeiro momento. Temer, por temperamento, prima pela discrição. Não será ostensivo ao ponto de ofuscar a presidente eleita, Dilma Rousseff, e nem tão opaco ao ponto de seus gestos não serem reconhecidos. Ele, que na semana passada deixou a Presidência da Câmara, abrindo caminho para o vice, Marco Maia (PT-RS), já começou, por exemplo, a atuar para ajudar na reeleição do colega gaúcho, de forma a tentar cicatrizar algumas feridas abertas por conta da composição do governo. Tem cobrado paciência de seu partido, até porque, avalia, há muita água para rolar sob as pontes entre PT e PMDB.

Ao pedir calma ao PMDB, Temer exercita outro traço de sua personalidade: saber a hora de agir. Não é dado a embates, mas nunca perdeu uma briga quando chamado ao ringue. Que o diga o deputado Ciro Gomes (PSB-CE), que já está com os dois pés no Ministério da Integração Nacional. Ao longo do período de pré-campanha, Temer engoliu praticamente calado os desaforos do socialista. Agora, do alto da Vice-Presidência da República e com a certeza de que será um dos chefes de Ciro, o peemedebista enquadrou o parlamentar cearense ao lhe cobrar cautela verbal se quiser participar do governo Dilma.

Articulações Esse é o estilo Temer. Quando entra numa briga, geralmente, já combinou a vitória. A sua e a do PMDB. Um exemplo típico desse método se refere às medidas provisórias (MPs). Antes de Temer assumir a Presidência da Câmara, em fevereiro de 2009, as MPs trancavam toda a pauta da Casa. Ele, então, depois de ouvir seus amigos da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), onde tem fortes ligações, e os próprio ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), definiu que as MPs só trancariam projetos de lei, ou seja, Propostas de Emenda à Constituição (PECs) e outras matérias, como projetos de resolução, podem ter preferência de votação. ¿Dilma vai se surpreender com a capacidade de Michel¿, comenta sempre o líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), quando lembra esse episódio.

Desafetos A interpretação das medidas provisórias ajudou Michel Temer a ganhar a Casa. Os desafetos recolheram seus exércitos e ficaram no aguardo de oportunidades para tentar desestabilizá-lo. Essas oportunidades, entretanto, não vieram. A mais forte que seus desafetos do PMDB tiveram no passado para tentar derrubá-lo foi em 2007, na época da eleição para presidente do partido. Em abril daquele ano, cinco governadores se reuniram e pediram que ele desistisse de ser candidato a mais um mandato. Vinha então, do Palácio do Planalto, um movimento em favor de Nelson Jobim para suceder Temer. O deputado se manteve firme. Ciente do apoio da Executiva Nacional do PMDB, fincou o pé e quem terminou recolhendo os flaps foi Jobim. Foi nesse episódio que os senadores do PMDB se viram obrigados a depor as armas e buscar um acordo com a chamada ¿turma da Câmara¿.

Estrategista e meticuloso

Uma das características marcantes do próximo vice-presidente da República, Michel Temer, é a capacidade de recuar para não se deixar caracterizar derrotado. Em 2007, ao perceber que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não indicaria um nome ¿puro¿ do PMDB ¿ leia-se alguém impregnado com o DNA do partido ¿ para o Ministério da Saúde, ele e o colega de legenda e de Câmara dos Deputados Henrique Eduardo Alves (RN) simplesmente abandonaram a Saúde e fecharam fileiras para levar o correligionário Geddel Vieira Lima (BA) à Integração Nacional.

Assim, Geddel virou ministro e José Gomes Temporão, que embora fosse dos quadros do PMDB não tinha relações políticas com a sigla, acabou nomeado para a Saúde. No embalo da escolha de Lula, os peemedebistas ainda fizeram passar internamente a ideia de que Sérgio Cabral (PMDB), recém-reeleito governador do Rio de Janeiro, havia influenciado na escolha de Temporão. Quanto a Jobim, com quem disputou o posto de candidato do PMDB à Presidência da Câmara em 2007, os atritos ficaram no passado. Hoje, os dois dividem a mesa no restaurante Piantella, tradicional reduto de políticos em Brasília, na maior alegria.

Fogueiras Depois de pular as fogueiras de 2007 e conquistar a simpatia da Câmara em 2009, faltava apenas a simpatia de Lula para Temer ganhar a vice na chapa que disputaria o Palácio do Planalto. Lula tentou até o último minuto fazer do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, candidato a vice na chapa de Dilma Rousseff. Mas não conseguiu, porque o PMDB se fechou em torno de seu presidente. Da mesma forma que Lula construiu a candidatura de Dilma no PT, Temer montou seu espaço no PMDB. A diferença é que agora será cada um por si, dizem alguns. Outro ponto é que, pelo menos na seara política, Temer navega com conhecimento de rota.

Não foi à toa que o PT fez de tudo para não deixar sob o comando do PMDB ministérios como a Integração Nacional e as Comunicações. Afinal, dizem alguns petistas, se com Lula Michel Temer já tomou conta de parte do terreno, com Dilma há quem aposte que, mesmo discreto e leal, ele comandará muito mais. (DR)

PETISTAS DISCUTEM A CAMPANHA DE MAIA O deputado gaúcho Marco Maia (PT), que na semana passada assumiu a Presidência da Câmara no lugar de Michel Temer (PMDB-SP), tem uma reunião agendada para hoje, às 17h, com o atual líder do partido na Câmara, Fernando Ferro (PE); com Paulo Teixeira (SP), que assumirá o posto do colega em 2011; e com Cândido Vaccarezza (SP), líder do governo na Casa. No encontro, os petistas discutirão as estratégias de campanha de Maia, que tentará a reeleição para o biênio 2011-2012. A definição do nome do parlamentar gaúcho para o cargo foi uma tentativa de apaziguar os ânimos de petistas e aliados que reclamavam da predominância paulista na composição do novo governo. No entanto, a indicação de Maia não diluiu todas as insatisfações internas do PT.