Título: Despesa anual cairia R$ 400 milhões em SP
Autor: Watanabe, Marta
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2007, Brasil, p. A3

A proposta em discussão entre Estados e União para mudar o pagamento de precatórios traz vantagens para o Estado de São Paulo e para a capital paulista. O Estado reduziria em R$ 400 milhões sua despesa anual com precatórios e o município passaria a pagar seus credores em 45 anos, segundo cálculos solicitados pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Além da dilatação de prazo, a prefeitura ficaria livre dos pedidos de seqüestro de recursos de que vem sendo alvo cada vez mais freqüente. No ano passado, foram 290 pedidos de seqüestro, mais de um por dia útil. O seqüestro total somou R$ 160 milhões no ano, o que ultrapassa o dispêndio mensal dos juros que o município paga à União.

A proposta em discussão tem como base o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) nº 12/2006, do senador Renan Calheiros, e prevê, de forma opcional, a destinação de 3% da despesa primária do ano anterior para o pagamento dos precatórios. No caso dos municípios, a destinação mínima é de 1,5% da despesa primária. Parte dos créditos - 70% - seriam pagos por leilão. Uma regulamentação ainda deve definir os critérios, mas a expectativa geral dos procuradores de Estado e de municípios é que os lances sejam feitos pelo nível de deságio. O restante - 30% - seguiria o pagamento por ordem crescente de valor. Hoje não há valor mínimo a ser pago pelas administrações públicas.

Para o Estado de São Paulo, a PEC reduziria a despesa anual com precatórios de R$ 1,6 bilhão para R$ 1,2 bilhão, segundo informações da Secretaria da Fazenda. O Estado tem pago pontualmente os décimos dos precatórios não-alimentares, originados de discussões judiciais com fornecedores ou proprietários de imóveis desapropriados, por exemplo. O atraso no pagamento desses créditos permite o pedido judicial de seqüestro de recursos da administração pública, o que faz muitos Estados e prefeituras privilegiarem a quitação dos não-alimentares.

O caso do Estado de São Paulo é exatamente esse. Os precatórios que estão em atraso são os alimentares, originados de discussões relacionadas a salários, aposentadorias e pensões. Esses não dão direito a seqüestro e o Estado paga atualmente o que venceu em 1998, diz o procurador-geral do Estado, Marcelo de Aquino.

"A PEC em discussão permitirá que o Estado equilibre o pagamento de precatórios alimentares e não-alimentares", diz o procurador. Atualmente a discrepância é grande. Em 2006, o Estado destinou R$ 419,77 milhões para o pagamento dos créditos alimentares. Para os não-alimentares foram dispendidos R$ 1,16 bilhão.

Para o município de São Paulo, que na gestão Serra reduziu bastante o pagamento de precatórios, a vantagem é a garantia da regularidade jurídica. A prefeitura pagou em 2004 R$ 240 milhões em precatórios. Em 2005, os recursos para esses créditos caíram para R$ 57 milhões. No ano passado, foram R$ 163 milhões.

Para a capital paulista, a grande vantagem será estabelecer um valor fixo para o pagamento anual dos precatórios e passar para uma situação perfeitamente legal em relação à quitação dos créditos. Como o município está em atraso também em relação aos créditos não-alimentares, tem sido alvo de constantes pedidos de seqüestros judiciais de renda.

Pelo texto do projeto de Calheiros, o município pagaria 1,5% da despesa primária, o que equivaleria R$ 210 milhões anuais. No ano passado a prefeitura foi alvo de 290 seqüestros, que chegaram a um pico mensal de R$ 57 milhões, diz o secretário-adjunto de Finanças do município de São Paulo, Walter Aluísio Moraes Rodrigues. Segundo ele, o valor é representativo. "Nós pagamos R$ 140 milhões mensais em juros pela União e o seqüestro total no ano passado atingiu R$ 160 milhões", declara. "O pagamento de 1,5% da despesa primária é razoável e permite o planejamento, com a previsão em orçamento de uma despesa executável, além da possibilidade de reduzir a dívida em leilão."

Polêmico, o projeto promete ser questionado. O advogado Gustavo Viseu, do escritório Viseu Cunha Oricchio Advogados, diz que a proposta prejudica os credores porque reduz os chamados juros compensatórios, questão que ainda está controversa no Judiciário. "O projeto significa uma nova moratória e é inconstitucional porque versa sobre o direito do credor."

O comitê de precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), que defende os credores do Estado e da prefeitura, diz que a PEC é inconstitucional e será contestada no Supremo Tribunal Federal, se aprovada. "Essa proposta fere cláusulas pétreas da Constituição Federal, que não poderiam ser modificadas nem por emenda", argumenta o advogado Flávio Brando, presidente do comitê. Para ele, a proposta abre uma porta para o aumento de dívidas no futuro. "Trata-se de um cheque em branco para o calote do setor público. Isso fará com que as administrações públicas passem a não conceder ajustes de salário, a descumprir pagamento por desapropriações e também a fornecedores." Brando diz também que a emenda causará atraso ainda maior no pagamento de credores. "Os detentores de precatórios do município de São Paulo irão demorar 45 anos para receber seu crédito. Os do Espírito Santo irão esperar 140 anos", diz ele. Brando defende a participação dos credores na negociação.