Título: Senado solidariza-se com versão de Collor para cassação
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2007, Política, p. A13

Em seu primeiro discurso da tribuna do Senado, exatos 17 anos depois de assumir a Presidência da República, o senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL), frustrou os que esperavam uma versão consistente sobre os fatos que resultaram em seu impeachment há 15 anos. Ele não abordou as denúncias de corrupção em seu governo. Limitou-se a acusar os políticos que o julgaram, a quem chamou de "conspiradores", e a criticar a tramitação do processo que o afastou do Palácio do Planalto, definido por ele como "farsa".

Os senadores não demonstraram sentir falta de explicações. Depois de falar por três horas e meia, Collor foi recompensado. Em apartes, ex-adversários afirmaram que, se errou, o ex-presidente pagou um preço alto e foi reabilitado pela população de Alagoas, que o elegeu senador. "Vossa excelência foi, talvez, o homem público da história recente que pagou o preço mais caro por eventuais erros, se é que os cometeu", disse o presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE).

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que o discurso "calou fundo" o plenário e elogiou a "grandeza, a altivez e a galhardia" do ex-presidente. "Vossa excelência é, hoje, maior do que foi um dia", disse Renan, sob aplausos.

O senador Aloizio Mercadante (PT-SP), deputado atuante na época do impeachment, admitiu ter havido "excessos" no processo contra Collor, mas disse ter "orgulho" de sua participação da CPI que apurou as denúncias contra o governo Collor.

No pronunciamento, Collor definiu o processo contra ele como "uma litania de abusos e preconceitos, uma sucessão de ultrajes e um acúmulo de violações das mais comezinhas normas legais, uma sucessão, enfim, de afrontas ao Estado de direito democrático". Criticou a pressa e desrespeitos às normais legais durante o processo na Câmara e o julgamento pelo Senado.

A acusação mais forte foi contra o então presidente da Câmara dos Deputados, Ibsen Pinheiro (PMDB) - hoje novamente deputado. "Sua atuação terminou por transformar o instituto do impeachment, que é um remédio jurídico e político contra graves crises institucionais, num instrumento de vingança política, de afirmação pessoal e de desforra particular", afirmou Collor.

O senador leu um discurso de 99 páginas. Começou às 16h51. Depois de receber a solidariedade de vários colegas, encerrou o pronunciamento às 20h30, dizendo que, agora, sentia-se "uma pessoa inteira". Teatral, pareceu chorar em alguns momentos. Em vários, demonstrava conter as lágrimas.

Collor atribuiu suas dificuldades políticas, primeiro, ao fato de ter sido eleito por um partido pequeno (PRN), não ter apoio no Congresso e ao seu comportamento em relação aos parlamentares. "Um dos grandes equívocos que cometi como presidente da República foi o de ter tido, com o Congresso Nacional, uma relação não adequada", disse, afirmando ter dedicado 80% do seu tempo à administração. Disse que, se o PSDB tivesse cumprido o acordo feito com ele - por intermédio do ex-governador Franco Montoro - para que tucanos participassem do seu governo, como o hoje prefeito José Serra e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, "talvez os rumos fossem outros".

Meticuloso em citar nomes, datas e horários, Collor citou "abusos" da CPI mista que apurou as denúncias feitas pelo irmão do então presidente, Pedro Collor de Mello, sobre a existência de uma rede de corrupção e tráfico de influência no governo, operada pelo ex-tesoureiro da campanha eleitoral presidencial, Paulo César Farias. Mas não entrou no mérito dos fatos. Nem citou o Fiat Elba usado na Casa da Dinda, sua então residência, que teria sido comprado em nome de um "fantasma" de PC Farias.

Para ele, a CPI violou a Constituição, porque um presidente não poderia ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções. Fernando Collor foi acusado de crime de responsabilidade.