Título: Na Colômbia, o 'seguro-guerrilha' ainda é rotina
Autor: Souza, Marcos de Moura e
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2007, Internacional, p. A14

Acordos financeiros em troca de proteção com grupos armados ainda fazem parte da rotina empresas locais e multinacionais que operam na Colômbia. Embora a sensação de segurança tenha aumentado muito nos últimos anos por conta das ações do governo linha-dura do presidente Álvaro Uribe, especialistas colombianos afirmam que empresas, principalmente aquelas localizadas longe dos centros urbanos, ainda são alvo de extorsão e pressão por parte de forças paramilitares de direita e de guerrilheiros de esquerda, que há décadas espalham terror no país.

Na quarta-feira, a empresa americana do setor de bananas Chiquita Brands International aceitou pagar uma multa de US$ 25 milhões por ter negociado proteção com grupos armados colombianos durante 1997 e 2004. Segundo promotores americanos, diversos funcionários de alto escalão da Chiquita pagaram cerca de US$ 1,7 milhão para as Auto Defesas da Colômbia (AUC), um grupo armado de direita responsável por alguns dos piores massacres do país e por parte do mercado de cocaína. Promotores também disseram que, em troca de proteção, a empresa fez pagamentos semelhantes às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), a mais antiga guerrilha de esquerda latino-americana, também acusada de envolvimento com o narcotráfico.

"Há empresas que ainda agregam aos seus custos fixos o valor que têm de pagar para as AUC e para as Farc para evitar inconvenientes nos negócios", disse ao Valor Felipe Quevedo, pesquisador do Centro de Pesquisas para o Desenvolvimento da Universidade Nacional da Colômbia.

O principal "inconveniente" é ameça de seqüestro de altos executivos. Segundo Quevedo, as empresas mais vulneráveis à ação dos grupos armados são as que operam negócios milionários como as plantações de cana-de-açúcar ou de palma, por exemplo. Cervejeiras, fabricantes de refrigerantes e petroleiras também costumam estar na mira. Os riscos aumentam quando se tratam de companhias com base no interior do país, onde o Estado colombiano tem mais dificuldade de rivalizar com a presença dos grupos armados.

Uma autoridade colombiana ouvida ontem por telefone sob a condição de não ter seu nome nome divulgado confirma o relato de Quevedo: "Existem várias empresas que pagam para as AUC e para as Farc para se proteger contra seqüestros e 'pedágios'. Essa é ainda uma dificuldade para os negócios no país".

No caso da Chiquita, Fernando Aguirre, executivo-chefe da empresa, disse em nota que "os pagamentos feitos pela companhia foram sempre motivados por nossa preocupação de boa fé com a segurança de nossos funcionários".

Pelo menos desde o fim dos anos 70 e início dos 80, empresas com negócios na Colômbia recorrem a negociações diretas com grupos armados. Um dos casos que ganharam destaque naquela época foi o da Indupalma, do setor de extração de óleo de palma, que decidiu se envolver em negociações com grupos armados colombianos depois de ter tido altos executivos tomados como reféns pelos rebeldes, conta Quevedo.

A Colômbia - maior produtor mundial de cocaína - tem conseguido avanços na economia a na segurança pública. Sob o governo de Álvaro Uribe, o número de homicídios e seqüestros nas cidades caiu - embora com excessos do Exército muitas vezes criticados (veja texto abaixo).

De acordo com o índice de Estados que Fracassaram na Paz de 2006, da entidade Fund for Peace, a Colômbia é o único país da América do Sul em situação de alerta, ao lado de países como Sudão, Iraque, Haiti e Coréia do Norte.