Título: Governo usa concessões para criar 17,5 mil km de redes de fibra óptica
Autor: Borges, André; Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 13/03/2013, Brasil, p. A4

O governo vai aproveitar os pacotes de concessões de rodovias e ferrovias para ampliar a infraestrutura de outras áreas. Os leilões de 7,5 quilômetros de estradas e de 10 mil quilômetros de ferrovias que serão realizados neste ano preveem a construção obrigatória de redes de fibra óptica de telecomunicações. Com a medida, um total de 17,5 mil quilômetros de redes cortarão o interior do país, criando uma nova linha de longo alcance, também conhecida como "backbone".

Trata-se de um volume relevante de dutos de fibra: representa mais da metade de toda a estrutura prevista no Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), programa liderado pela estatal Telebras que prevê acionar cerca de 30 mil quilômetros de rede de fibra nos próximos anos, com apoio de Eletrobras e Petrobras.

A principal novidade na determinação que o governo fará às concessionárias de ferrovias e rodovias está no modelo de negócios que será utilizado, proposta que já incomoda empresas interessadas nesses leilões. Pelas regras incluídas nos editais divulgados até agora, a infraestrutura de novos dutos subterrâneos de fibra óptica deverá ser construída integralmente pelos concessionários que vencerem o leilão, ao longo das ferrovias e estradas.

Esses consórcios, no entanto, não serão os controladores da futura malha. A gestão da rede será repassada para a estatal Empresa de Planejamento e Logística (EPL). Caberá exclusivamente à EPL decidir onde e de que forma essa malha de telecomunicações será acessada. Ou seja, as concessionárias não poderão explorar comercialmente tais serviços.

Segundo Bernardo Figueiredo, presidente da EPL, a nova rede de fibra vai apoiar a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) em ações de fiscalização das concessões, permitindo montar centros avançados de monitoramento ao longo de todas as estradas e ferrovias. Figueiredo também vê espaço para parcerias a serem firmadas com a Telebras.

A ideia, no entanto, de serem obrigadas a construir, mas não poderem usufruir do bem, desagrada empresas interessadas nas concessões de rodovias e ferrovias. Essas companhias vão contestar a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) durante a fase de audiências públicas dos editais, com o propósito de convencer o governo a mudar a regra do jogo. Para elas, trata-se basicamente de um custo extra que irá onerar seus orçamentos, sem permitir que elas possam ser remuneradas pela oferta posterior do serviço. Atualmente, diversas concessionárias de rodovias em operação no país possuem estruturas de fibra óptica instalada ao longo de suas concessões e oferecem o serviço para as operadoras de telefonia.

Para o SindiTelebrasil, que representa as concessionárias de telecom, a nova estrutura pode ter papel importante para desafogar os dutos atuais de fibra óptica, além de gerar mais competição no setor. "Qualquer nova estrutura que venha a somar é interessante para o setor. O maior custo para se implantar uma rede de longa distância é justamente a construção civil. Portanto, é uma medida bem vinda", diz o diretor-executivo do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (SindiTelebrasil), Eduardo Levy. "A questão, porém, é saber de que forma isso será oferecido ao mercado. As concessionárias atuais têm cobrado muito alto por suas redes. Se não houver uma política de preços que seja minimamente razoável, não adianta nada", acrescenta Levy.

De acordo com Carlos Fernando do Nascimento, diretor da ANTT, a nova rede de fibra distribuída ao londo das ferrovias vai permitir, por exemplo, "o tráfego de um número maior de composições" de trens com mais segurança. "O acesso à internet por banda larga é apenas uma das possibilidades", diz Nascimento.

A exigência de instalar dutos e cabos de fibras ópticas não foi a única surpresa das empresas interessadas nos leilões. Para os consórcios que pretendem disputar as licitações de ferrovias, há dúvidas sobre a pretensão do governo de criar uma "reserva de mercado" para o fornecimento de trilhos pela indústria nacional. O Brasil não fabrica o produto.

Pela minuta do contrato de concessão do trecho entre Açailândia (MA) e Vila do Conde (PA), que deverá ser replicado nos demais editais, 75% dos trilhos usados pelas futuras concessionárias no período de obras precisam ser de fabricação nacional.

A obrigatoriedade só cai se o consórcio vencedor demonstrar que o trilho nacional é pelo menos 35% mais caro do que o importado. Com essa margem de preferência, o governo almeja ressuscitar uma indústria brasileira de trilhos, que não existe desde os anos 90. O presidente-executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, diz que as siderúrgicas instaladas no país estão avaliando a possibilidade de adaptar suas unidades produtivas para produzir trilhos.

Nos cálculos da EPL, a demanda gerada pelas concessões e pelas obras tocadas pela estatal Valec representa de 1,5 milhão a 2 milhões de toneladas de trilhos, o que pode fomentar a indústria.