Título: Com Francisco, Igreja vira o foco para o Novo Mundo
Autor: Meichtry, Stacy; Luhnow, David; Parks, Ken
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2013, Internacional, p. A15

Assumindo o nome de papa Francisco, o cardeal Jorge Mario Bergoglio, da Argentina, foi eleito chefe da Igreja Católica Romana ontem, colocando 1,2 bilhão de católicos sob a chefia de um papa do Novo Mundo, pela primeira vez nos 2.000 anos de história do cristianismo.

O novo papa era arcebispo da diocese de Buenos Aires, na região com a maior concentração de católicos no mundo. Isso também reflete uma mudança demográfica no Catolicismo Romano: a América Latina agora é a casa de mais de um terço de todos os católicos do mundo.

O pontífice, de 76 anos, saiu na varanda da basílica de São Pedro para receber os aplausos da multidão, que gritava "Viva il papa".

Pedindo orações para si e para o papa Bento XVI, agora aposentado, ele também disse uma frase espirituosa: "Como vocês sabem, o dever do conclave é dar um bispo a Roma", disse ele à multidão. "Parece que os meus irmãos cardeais foram quase até o fim do mundo para encontrar um papa."

A escolha do primeiro papa não europeu em vários séculos, bem como o primeiro oriundo das Américas, marca um divisor de águas no papado num momento em que a Igreja vem perdendo seguidores devido ao aumento do secularismo e do protestantismo evangélico, assim como a uma série de escândalos de abuso sexual e divisões na hierarquia do Vaticano. Essa escolha inovadora se segue a uma eleição realizada por um motivo incomum: a decisão de Bento XVI de ser o primeiro papa a renunciar em cerca de seis séculos.

O novo papa apareceu na varanda pouco mais de uma hora depois que a fumaça branca saiu da chaminé da capela Sistina, ontem à tarde, sinalizando que os cardeais reunidos haviam chegado a um acordo sobre um novo chefe para a Igreja Católica Romana em apenas cinco rodadas de votação.

A rapidez da decisão provavelmente indica que o consenso entre os 115 cardeais que se reuniram terça-feira na capela para a votação foi alcançado, em grande parte, nas discussões anteriores ao conclave, realizadas nas duas semanas desde que Bento XVI renunciou, em 28 de fevereiro.

Minutos após a fumaça branca aparecer, a praça de São Pedro já estava lotada com uma multidão jubilante. "Eu estou muito empolgada. Estou esperando este momento há quatro horas", disse Lucia Carbona, 45, uma professora de Florença, na Itália.

O novo papa argentino é conhecido por se esquivar das honras e pompas devidas a um cardeal e prefere ser chamado simplesmente de "padre Jorge", e não por títulos mais formais como "cardeal" ou "sua eminência".

É conhecido por visitar paróquias e igrejas viajando de ônibus ou metrô, vestido como um padre comum. Na linguagem da Igreja na Argentina, ele é "um pastor, não um príncipe".

Francisco, primeiro papa jesuíta, enfrenta a difícil tarefa de sanar as divisões na hierarquia da Igreja e conter a perda de fiéis.

O novo papa traz para o cargo uma ampla experiência pastoral na Argentina, mas não é claro quanta influência ele exerce na Cúria Romana, o órgão administrativo do Vaticano. Francisco nunca teve um cargo na alta hierarquia da Cúria.

Nascido em Buenos Aires, o papa Francisco foi ordenado padre jesuíta em 1969. Foi nomeado bispo em 1992 e, seis anos depois, arcebispo de Buenos Aires. Foi elevado a cardeal por João Paulo II em 2001. Sua opção sempre foi por uma Igreja voltada para o exterior, não uma Igreja fechada em seus locais de culto. Ele tem dado grande apoio aos padres que trabalham nas favelas de Buenos Aires.

Ele adota os pontos de vista tradicionais da Igreja em relação a questões sociais como o casamento gay, o aborto e a eutanásia. Bergoglio se opôs fortemente ao casamento gay, aprovado por lei na Argentina em 2010.

A renúncia do papa Bento XVI, o primeiro a renunciar em cerca de 600 anos, provocou uma onda de discussões sobre uma série de questões, incluindo a gestão do banco do Vaticano e a lentidão das reformas na Cúria Romana.

Os cardeais também já deliberaram sobre a necessidade de reavivar o catolicismo na Europa, local de origem dessa religião, e sobre a mudança demográfica do catolicismo em direção aos países em desenvolvimento da América Latina e da África.